segunda-feira, 22 de março de 2021

Maiestas Domini no românico rural português


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I - Contextualização

Durante os períodos de perseguição aos Cristãos, no Império Romano, as igrejas e as salas de reunião eram pequenas, de aspecto insignificante. Contudo, quando a Igreja, a partir do ano 311 d.C. com Constantino passou a ser o poder supremo no império, todo o seu relacionamento com a arte teve que ser reexaminado. Ao não poder adoptar o modelo dos antigos templos pagãos porque as suas funções eram nitidamente diferentes[1], a Igreja optou pelo modelo dos salões amplos de reunião que nos tempos clássicos eram denominados de basílicas[2] (E.H. Gombrich).

A basílica foi assim adaptada pelos Cristãos, com a influência e a ajuda da mãe[3] do imperador, às necessidades do culto. O termo foi então instituído e oficializado para as igrejas desse tipo. A abside passou a ser usada como local do celebrante e do altar-mor, passando a ser conhecida como “o coro”. O corpo central onde a comunidade se reunia passou a ser chamada de “nave” [4], e os compartimentos laterais foram chamados de “alas”[5]. Em grande parte das basílicas, a espaçosa nave era coberta com um tecto de madeira com vigas expostas. E as alas tinham quase sempre um tecto plano. As colunas que separavam as alas da nave eram profusamente decoradas. Um dos grandes exemplos destas estruturas eclesiásticas é a antiga basílica de São Pedro cerca de 400, como nos é apresentada por H.W. Janson (FIG. 1). Nenhuma delas permaneceu inalterável nestes 1600 anos, mas podemos formar uma ideia do aspecto geral primitivo.

Este tipo de construções acarretaram enormes problemas ao imperador. Desde logo porque se colocava a questão de como as decorar, na medida em que fazia ressurgir o problema geral da imagem e do seu uso na religião, suscitando violentas disputas. Ao tempo todos os Cristãos concordavam num ponto: na Casa do Senhor não deveriam existir estátuas, na medida em que estas se aproximavam às antigas imagens esculpidas de ídolos pagãos que o Antigo Testamento condenava. Procurava-se, desta forma, não confundir os espíritos dos pagãos recentemente convertidos à nova fé. Contudo, divergiam em relação à pintura. Muitos destes cristãos consideravam-nas úteis porque ajudavam a comunidade a recordar os ensinamentos recebidos e mantinham viva a memória das cenas sagradas. Ponto de vista que logo foi adoptado, desde o início, na parte latina (Ocidental) do Império Romano. E foi essa prerrogativa a seguida pelo Papa Gregório Magno[6].

Para esta autoridade da Igreja as cenas sagradas reportadas na pintura eram vitais para os fiéis que não sabiam ler nem escrever. E essas imagens eram fundamentais para os ensinar. Dizia: “A pintura pode fazer pelos analfabetos o que a escrita faz pelos que sabem ler” (Alain Erlande- Brandenburg).

Esta sentença foi de uma importância vital para a História da Arte, porque era repetida sempre que alguns fiéis atacavam o uso de imagens nas igrejas.


[1] Os templos romanos eram de reduzidas dimensões. Muito pequenos. Apenas serviam para abrigar a estátua de um deus. As procissões e os desfiles eram no exterior. A igreja, pelo contrário, tinha que reservar espaço para toda a congregação que reunia para assistir ao serviço religioso quando o padre recitava a missa no altar-mor, ou proferia o seu sermão.

[2] Também denominados “salões reais”, eram edifícios de grande envergadura, onde funcionavam os mercados cobertos e recintos para audiências públicas dos tribunais. Vastos salões rectangulares longos (Leland M. Roth) com compartimentos mais estreitos e mais baixos ao longo das laterais mais espaçosas, separadas do corpo central por colunatas, com abside na extremidade oposta à entrada, onde o presidente da assembleia se sentava. No centro geométrico da abside ficava um altar que marcava a presença espiritual do imperador.

[3] Helena, mais tarde canonizada pela Igreja (Santa Helena), a quem também está ligada a tradição da descoberta da vera cruz.

[4] Que significava (e significa) “navio”.

[5] Sinónimo de “asas”

[6] Viveu em finais do século VI.

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