sábado, 11 de abril de 2020

Tempo de contradições



Júlia Serra
O tempo surge, muitas vezes, ligado a um movimento giratório de um círculo onde se inscreve o ser e a vida. No Dicionário dos Símbolos de Chevalier e Gheerbrant pode ler-se: “Tanto na linguagem como na percepção, o tempo simboliza um limite na duração e a duração mais sentida com o mundo do Além, que é o do eterno. Por definição, o tempo humano é finito e o tempo divino é infinito, ou antes, é a negação do tempo, o ilimitado” (p.640). Infere-se, pois, que a vida do ser humano é passageira – “um ai que mal soa”, nas palavras de João de Deus – e sujeita à inexorabilidade do tempo. É um círculo que vai rodando ….
No momento atual, em que um dia parece um mês e um mês um ano, saber gerir o tempo é essencial, pois, se para uns é um quebra-cabeças, para outros é tempo de trabalho e para outros de “endoidecer.” Se associarmos o tempo ao espaço, que indissoluvelmente aparecem ligados, então, a complexidade ainda é maior. Conviver num apartamento com crianças em idade escolar e com tarefas diferenciadas pode provocar o caos, pois é preciso ter meios humanos e recursos materiais, para que a casa não desabe. Para uma mãe que tente gerir tarefas dos filhos e, em simultâneo, esteja em teletrabalho, é praticamente impossível o resultado ser satisfatório, dando origem a angústia e a stress. Para outros, geralmente os mais velhos, que estão confinados e não podem ser úteis, o tempo nunca mais passa e ficam também eles ansiosos. Um tempo antitético e dilemático que chega a roçar o absurdo.
O Relógio de Vinicius de Moraes corre o risco de avariar, porque o tic-tac é desigual e, portanto, é necessário pensar nas marcas psicológicas que este tempo vai deixar nas pessoas, sobretudo, naquelas que padeceram mais neste período e que perderam a força para recomeçar. Há dias, um programa televisivo – Prós e Contras – alertava para isto, assim como para a violência doméstica que parecia estar estagnada, mas poderá estar num período de incubação e rebentar abruptamente. É um tempo que não passa depressa e os efeitos podem ser catastróficos. Neste sentido, é preciso acreditarmos numa força transcendente que vele por nós. Para mim, é Deus.
A parte moral é imprescindível para vencermos o combate.

Fiquemos com este excerto de Vinicius, mas com a certeza de nunca perder a alegria, perante o tic,tac

Passa o tempo tic, tac, tic, tac passa a hora
Chega logo tic, tac, tic, tac, vai-te embora,
Passa tempo bem depressa
Não atrasa nem demora,
Que já estou muito cansado,
Já perdi toda alegria
De fazer meu tic-tac, dia e noite, noite e dia,
             JS

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