BARROSO da FONTE |
Os almocreves
foram, até aos inícios do século vinte, agentes de comunicação
intercomunitária. Os cavalos substituíram os barcos e os aviões. E a própria
cultura e informação mais rápida era veiculado por essa via, enquanto não se
institucionalizou a telegrafia.
Alguns dos nossos
mais fecundos poetas populares, como António Aleixo, Fernando Pessoa, Florbela
Esperança, etc. foram verdadeiros almocreves da palavra poética. Aleixo, menos
propenso para a escrita, de cada quadra popular fez um silogismo perfeito.
Recebi de mão
amiga, como prenda de Natal, «O Vale», de Abílio Bastos. Um livro
simples, outonal, como árvore sem folha, num chão limpo com cheiro a queimado.
Abre-se e a
maciez da capa tem a magia do chocolate
da época. Tudo discreto a condizer com a aba da capa, onde aparece o rosto que
abaliza os 75 anos do seu autor: Abílio Bastos. Leio essa badana e recordo que
se trata da mesma cara que, numa semana atrás, lera no blog tempo caminhado, numa
primeira aparição pública, assinada pelo recensor Transmontano Jorge Lage. Quem
havia de ser! Este Homem grande num corpo médio que deu para oficial miliciano
na guerra do Ultramar e que, regressado a Mirandela, mas fixado em Braga, como
professor, ascendeu, como investigador da castanha e do castanheiro, ao
qualificado especialista dessa casta arbórea. Foi este solidário cidadão do
mundo que convenceu Abílio Bastos a passar a livro a sua produção escrita e
organizada. Esse livro surpreende por diversas valências. Uma delas é o
conhecimento real do autor: nascido em 13/2/1944, em Abadim, concelho de
Cabeceiras de Basto. Por aí fez a instrução primária e cursou a aprendizagem de
marceneiro, ferramenta de que mais tarde, precisou para garantir emprego em França
e a seguir, nos Estados Unidos da América. Em Janeiro de 2009 aposentou-se e,
desde essa altura até ao presente vive no Minho, ora em Abadim ora em Braga.
Por onde passou,
deixou vincado o nobre papel de almocreve nesta volta ao mundo entre o Oriente
e Ocidente. ( Portugal, Timor, França e USA.) As suas capacidades artísticas
centraram-se na marcenaria. O tempo universitário que essa aprendizagem lhe
exigiu, acumulou-o, online, como hoje se dirá. Essa produção marceneira
que orna santuários, palácios e galerias
reais, enobreceu a tendência poética, não menos exigente, bela e sedutora.
Estoutro pendor
poético revelou-se desde o berço campesino do Minho planáltico aos cumes da
Cabreira, do Bagulhão, Salto, Magusteiro, Ludeiro de Arque, Reboreda e Salto. Percorreu
os caminhos de Leonor de Alvim e de Nuno Álvares, entre Pedraça e Reboreda. Por
ali andara Santa Senhorinha e S.
Rosendo, certamente em Romagem ao Mosteiro de Refojos. Por ali nasceu a ideia
da poderosa Casa de Bragança. E preparou para as grandes batalhas que D. João I
empreendeu, sempre ao lado desse grande general que, em 2009, foi elevado aos
altares como Santo.
Da esquerda para a direita: Jorge Lage, Barroso da Fonte e Abílio Bastos, na feira do livro em Braga |
Nas pp 30/31
surgem dois poemas, um em prosa poética e outro em verso corrido, em
sextilhas, cantantes por harmoniosas e metricamente perfeitas.
Um padrinho e uma
madrinha de qualidade, abonam este jovem poeta de 75 anos: Jorge Lage e Júlia Serra.
Esta admirável recensora, com um prefácio onde invoca Alberto Caeiro,
quando diz que «há poetas que são artistas/ e trabalham nos seus versos/
como um carpinteiro nas tábuas!»
Aquele nega no
posfácio o que Autor afirma no poema «susto» da página 111, quando pergunta:
«o que é a poesia?
- para
quem nasceu arbusto, essa palavra/ é susto».
Resta-me dizer que
o I volume da Antologia, editado pela Casa de Trás-os-Montes de Lisboa já
insere a biografia de Abílio Pereira Bastos, como Poeta Barrosão. E, de facto,
toda a sua vivência, toda a sua argamassa linguística e todo o seu caráter
telúrico, comportamental e sensitivo se insere no Vale de Abadim que sobe,
envolto no micro-clima de Magusteiro e se espalha pelos dezanove lugares da freguesia
de Salto.
Barroso da Fonte
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