Luís
Gomes (ECO)
8 Janeiro 2020
Para alguém que procura a verdade, se há algo que o Estado Novo não promoveu foi a
pobreza, nem tão pouco a ignorância dos portugueses.
No próximo dia 25 de
Abril de 2020, a Revolução dos Cravos irá completar 46 anos, quase tantos como
o Estado Novo, que durou 48 anos. Seguramente, como acontece todos os anos, a
casa da nossa actual democracia irá realizar discursos encomiásticos ao regime
que nasceu com o 25 de Abril de 1974, por contrapartida ao Estado Novo que
apenas trouxe miséria e ignorância à população portuguesa.
Esta propaganda
estendeu-se ao ensino, em que é recorrente escutar-se por parte dos
professores: “Salazar empobreceu os portugueses”; “O Estado Novo consistia em
três Fs: Fado, Futebol e Fátima”; “Salazar tinha os cofres cheios de ouro e a
população na miséria”.
Efectivamente, tratou-se de um regime que objurgava o pensamento
livre da população, promovendo a existência de uma rede de “bufos” que visava
identificar, denunciar, torturar e encarcerar aqueles que se lhe opunham. A
liberdade política era algo que o Estado Novo não apreciava, pois promovia
exercícios democráticos que eram autênticas farsas, sendo a mais conhecida a
eleição presidencial de 1958, em que Humberto Delgado, o candidato da oposição,
foi derrotado de “forma esmagadora” pelo então candidato da União Nacional,
Américo Thomaz.
Mas, para alguém que
procura a verdade, se há algo que o Estado Novo não
promoveu foi a pobreza, nem tão pouco a ignorância dos portugueses.
Este anátema, permanentemente lançado sobre o anterior regime, pode ser
facilmente desmontado através da simples análise dos factos.
Se analisarmos, para os
últimos 170 anos, a evolução do PIB per capita português em relação a
uma média simples de 12 países desenvolvidos, podemos constatar que o Estado Novo foi o período de
maior enriquecimento dos portugueses, tal como podemos constatar na
Figura 1.
Importa recordar que no final da 1ª República, o PIB per capita português era de
apenas 26,9% da média do PIB per capita de 12 países desenvolvidos.
A 1ª República deu
continuidade à divergência económica que ocorreu durante todo o século XIX, em
que Portugal ficou completamente relegado à irrelevância. Em 1974, no final do Estado Novo, o PIB per capita português era
de 57,5% da média aritmética do PIB per capita de 12 países
desenvolvidos, uma subida de mais de 30
pontos percentuais.
O que logrou a
democracia? Apenas uma subida de 4,4 pontos percentuais; no entanto, com uma agravante: a dívida pública
está em máximos históricos.
Nunca na história de
Portugal tivemos uma dívida de tal dimensão, como
podemos observar na Figura 2. No final de 1974, a
dívida pública em percentagem do PIB [mesmo
com a guerra colonial em curso!!] era de apenas 13,9%; actualmente,
situa-se acima dos 120%. Pior? Apenas o Japão,
Grécia e Itália.
Ou seja, aquela pequena
convergência do PIB foi alcançada com uma dívida pública astronómica, agravando-se substancialmente a partir de
2000, com a adesão à moeda única europeia, o Euro. Em resumo, o Estado Novo reduziu a dívida pública em 60 pontos percentuais,
enquanto a democracia a subiu em 108 pontos percentuais.
Outro dos mitos do actual regime é que Portugal sempre foi um país de “Coitadinhos”: fomos, somos e seremos pobres, pelo que o nível de exigência deverá ser
sempre diminuto.
Por isso, interiorizámos este papel há
muitos séculos, em particular a partir do século XIX. No entanto, isso
nem sempre foi assim, a população portuguesa sempre
teve níveis de rendimento próximos dos demais países europeus, tal como podemos observar na Figura 3.
A comparação do
rendimento per capita de Portugal com as demais potências europeias, entre o século XVII e XIX, permite aferir que nunca nos afastámos demasiado do topo. Em plena guerra da
aclamação [nome antigo da que hoje se costuma chamar
Guerra da Restauração], estávamos em 3º lugar, tal como se pode constatar na Figura 3.
Talvez por isso Filipe III (Filipe IV de Espanha) tenha falecido poucos meses
depois da sua estrondosa derrota em Montes Claros.
Estes dados são
comprovados por vários eventos e factos da nossa história. A tomada de Ceuta,
em 1415, envolveu uma frota 212 navios, constituindo a maior operação anfíbia
desde o fim do Império Romano. No início do século XVIII, Lisboa era a quarta cidade com mais
população na Europa, depois de Londres, Paris e Nápoles. O historiador
Bairoch, em 1976, considerava Portugal como um dos cinco
países mais ricos da Europa até ao princípio do século XIX. [v. gráfico de 1800: éramos o 4º mais rico!!]
No início do século
XVIII, em 1717, na batalha naval de Matapão, a nossa esquadra enfrentou a frota do Império Otomano, algo
impensável para um país pobre.
O grande declínio ocorre
a partir das reformas desse grande iluminado em países protestantes, que tem
uma estátua no final da Avenida da Liberdade. A expulsão dos jesuítas, por si
decidida, representou um
desastre sem igual na educação em Portugal. Os jesuítas proporcionavam
educação gratuita a perto de 20 mil alunos, tendo praticamente o monopólio da
educação não superior. Portugal só volta a ter este número de alunos no início
do século XX, quando a população era o dobro da daquela época. Além disso,
encerrou a então melhor universidade do país: a Universidade de Évora, por onde
passaram professores como Luís Molina ou Pedro de Fonseca, mas que tinha a
infelicidade de ser controlada pela Companhia de Jesus.
Em 1850, em resultado do atraso causado pelo maior facínora da história
de Portugal, 85% da população portuguesa era analfabeta
(Fonte: Alfabetização e escola em Portugal no século XX). Para o mesmo ano,
apenas 5% da população dos Países Nórdicos, da Alemanha, da Escócia, da Holanda
e da Suíça era analfabeta! Algo que
apenas lográmos em 2018 (ver Figura 4)! 170 anos
depois!
Esta situação calamitosa
era algo que vinha de trás e herdado pelo Estado Novo. No final da 1ª República, cerca de 60% da população
portuguesa era analfabeta. O Estado Novo [em 48 anos] reduziu
esta percentagem para 25%, ou seja, um decréscimo de 35 pontos percentuais. O actual regime ainda não
conseguiu eliminar esta vergonha nacional, pois no final de 2018 ainda existiam 500 mil
portugueses analfabetos. [Só se reduziu de 25%
para 5%, ou seja, em 46 anos só caiu 20 pontos percentuais, pouco mais de
metade do que se fez no Estado Novo]
Agora, importa analisar
indicadores de saúde, em particular a mortalidade infantil e a esperança média
de vida. Na Figura 5, podemos constatar que a actual taxa de 3
óbitos por mil nascimentos resulta da tendência descendente ao longo de todo o século XX.
Na Figura 6, podemos
concluir que a esperança média de vida em Portugal é um indicador que sofreu
substanciais melhorias desde o início do século XX. O Estado Novo
conseguiu subi-la em 22 anos, aproximadamente, e a Democracia cerca de 13 anos.
Face a estas evidências, continuar a propagar o mito do empobrecimento levado a cabo pelo Estado
Novo não parece ser a melhor forma de lavar os pecados do actual regime,
atendendo que, ao fim de 46 anos, já vai
sendo hora de realizar um balanço crítico. Face ao exposto, os resultados e o caminho não parecem ser positivos e promissores.
Em 1965, em plena guerra
colonial, o estado português tributava cerca de 15% do nosso rendimento.
Actualmente, confisca 35%, um máximo histórico, com
uma agravante: não parece que a coisa fique
por aqui, dada a voracidade
por mais receita fiscal e a
necessidade de alimentar as clientelas que se alimentam do orçamento de estado.
O princípio da presunção da inocência, plasmado no artigo 32º da Constituição da República Portuguesa,
não se aplica ao fisco português. Se um contribuinte decidir reclamar uma determinada nota de cobrança, a
mesma segue para execução e não é suspensa. Primeiro paga e depois reclama!
A PIDE utilizava uma rede de delatores para identificar
opositores ao Estado Novo. Agora, para o fisco, cada português é um potencial
bufo: “Peça o número de
contribuinte e habilite-se a um prémio”. Se denunciar o próximo pode ganhar um
automóvel de luxo, mas não se esqueça de registar as facturas no Portal das
Finanças!
Nos termos do artº 204º do CPP, a
prisão preventiva pode ser decretada se houver perigo de perturbação do
inquérito! Por outra palavras, o arguido pode ser posto na gaiola, a fim de que
os acusadores, isto é, os magistrados do Ministério Público, possam trabalhar à
vontade e o arguido não possa destruir ou alterar provas. Ou seja, o arguido
não pode defender-se, vai dentro. Desta forma, não incomoda os acusadores, para
que estes possam formular com total tranquilidade uma acusação.
Para ajudar igualmente um
arguido do processo penal, nos termos do artigo 10, da Lei nº 5/2002, alínea 2, a todo o tempo, o Ministério Público requer o
arresto de bens do arguido no valor correspondente ao apurado como constituindo
vantagem de actividade criminosa. Por outras palavras, sem haver julgamento, o
Ministério Público, com base em indícios e na sua interpretação dos factos,
estima a vantagem patrimonial obtida do arguido e arresta-lhe o património.
Assim, retira-lhe
qualquer capacidade económica para defender-se; claro está, que os
verdadeiramente ricos têm o património dissimulado no exterior e não estão
sujeitos a estes aborrecimentos, enquanto o “mexilhão” fica privado de
contratar um bom advogado.
Forte com os Fracos, Fraco com
os Fortes: é assim o regime das liberdades e
garantias que nasceu com a Revolução dos Cravos. A nenhuma alma ocorreu que esta lei é inconstitucional.
Como é do conhecimento
público, a grande maioria das acusações
do Ministério Público resultam em nada, ou seja, a vida de muitos inocentes é completamente arruinada; no entanto,
esta gente do Ministério Público é inimputável: podem ser
incompetentes toda a vida que nada lhes acontece. No fundo, são os herdeiros da Santa Inquisição, que continua a existir em pleno
regime democrático!
Nos termos do artigo 105.º da Constituição da RP, alínea 4, o orçamento prevê as receitas necessárias para
cobrir as despesas. Desde 1974 [até 2019, parece!], não existiu um orçamento que não fosse deficitário, a causa da
gigantesca dívida pública que temos, significando que todos os orçamentos do actual regime foram inconstitucionais. Em relação a isto, o insigne Tribunal
Constitucional nunca se pronunciou!
Nos últimos anos, em termos
de rendimento per capita, fomos ultrapassados por países da ex-união soviética,
ou da sua órbita, tais como: Polónia, Lituânia, Estónia e Hungria. Entretanto, a
nossa classe política desfila em programas de
entretenimento, em que a estrela é uma senhora aos guinchos!
A casta que domina o
regime ainda não se deu conta de que somos dos
poucos países do mundo em que a Constituição da República menciona no seu
preâmbulo como desígnio nacional ser uma Sociedade Socialista. Desde o fim do Estado Novo, esta mentalidade socialista que
perpassa toda a sociedade tem sido a nossa ruína.
No final de 1974, a
capitalização bolsista das empresas cotadas em bolsas nacionais era 2,5 vezes a
actual (ver Figura 7), ou seja, o nosso
mercado de capitais definhou substancialmente desde então, apesar de agora
possuirmos um verdadeiro exército de reguladores: 241 na CMVM e 1.755 no Banco
de Portugal (2018) [reguladores que NUNCA VIRAM
NEM VÊEM NADA!!]. Digo exército pelo
seguinte: se realizarmos uma simples
comparação com a nossa vizinha Espanha temos ali 446 na Comisión Nacional
del Mercado de Valores (CNMV) e 3022 no Banco de Espanha, o que significa que se
multiplicássemos os nossos com base na população teríamos de ter em Espanha
1092 na CNMV e 7958 no Banco de Espanha; caso utilizássemos como multiplicador a
relação dos valores do PIB, teríamos de ter em Espanha 1452 na CNMV e 10.574 no
Banco de Espanha! Isto
quase parece aquela embarcação de 20 pessoas, em que dezanove delas marcam o
ritmo e apenas um rema!
Hoje em dia, o nosso
parlamento nada decide. A grande maioria da nossa legislação é emanada de
Bruxelas, não havendo qualquer controlo democrático da mesma. Desta forma, as leis são produzidas tendo
em conta a realidade das economias protestantes do norte da Europa, resultando na imposição de uma carga burocrática sem
precedentes nas nossas pequenas empresas; ao
mesmo tempo, a legislação europeia
multiplica o número de supervisores, reguladores e burocratas e impõe a
harmonização fiscal por cima, garantindo que todos
confiscam sobejamente os seus cidadãos.
Ao contrário de 1974, em
que o país era soberano, agora estamos de joelhos,
esperando que o Banco Central Europeu (BCE) compre a nossa dívida,
caso contrário, nenhum privado, no seu
perfeito juízo, compraria dívida a um estado absolutamente falido.
Como o BCE continua a alimentar o nosso comportamento de mendigo,
assistimos impávidos e serenos à partida do Reino Unido da União Europeia, o
nosso mais antigo aliado. Ao mesmo tempo, continuamos numa união política e a
receber, com pompa e circunstância, o chefe de estado de um país que, no
passado, nos agrediu territorialmente, e com o qual temos uma disputa
territorial. O nosso regime em relação a
isto fecha aos olhos, enquanto que eles reclamam Gibraltar e nunca se esquecem
de o dizer em todas as ocasiões.
Em conclusão, a utilização de lugares-comuns para aquilatar o desempenho do Estado
Novo parece-me errada para quem busca a verdade. Dizer que o Estado
Novo empobreceu e incentivou a ignorância da população, não passa de um monte
de falácias sem sentido. Na verdade, tem servido
para ocultar os fracassos do actual regime, em particular os económicos, mas que partilha duas
coisas com Salazar:
(i) o absoluto desprezo pelas liberdades do povo português;
(ii) a homenagem ao tirano que se
encontra ao cimo da Avenida de Liberdade.
Nota: O autor escreve ao
abrigo do antigo acordo ortográfico.
Fonte: https://eco.sapo.pt/opiniao/a-grande-mentira/?fbclid=IwAR0NfRYOER0dLxy6JMPWYf7PAJP1-duE5mZPJ3GSPh-z03OxjGWHBxHHEaY
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