O último debate da legislatura sobre
o estado da Nação, que hoje terá lugar, glosará certamente a questão: estamos
melhor ou pior do que estávamos em 2015? É facilmente percepcionável o que
resultou de Tancos, Pedrogão Grande, da degradação dos serviços públicos (Saúde
e transportes, particularmente), da austeridade embuçada ou do nepotismo do
Governo. Mas passarão anos até que se tornem evidentes os resultados dos erros
cometidos em matéria de Educação e a sociedade seja confrontada com os custos
de tanta ilusão e de tantos sofismas.
1. Quando esta legislatura começou,
ninguém ousaria dizer que ficaria caracterizada por um enorme aumento da
conflitualidade do Governo com os professores. Mas ficou.
A Fenprof reclamou agora do Ministério
da Educação a consideração de um prazo suplementar para os professores poderem
corrigir a opção que tiveram de tomar até ao fim do mês de Junho, sobre o modo
de recuperar o tempo de serviço contabilizado pelo Governo para efeitos de
carreira. Acompanho aquela estrutura sindical na convicção de que a trapalhada
que o ministério estendeu sobre as dúvidas que foram surgindo, provocada pelo
tempo exíguo para as esclarecer, só pode ter tido como consequência um
considerável número de escolhas precipitadas, incorrectamente ponderadas e por
isso prejudiciais aos interesses dos professores. De modo genérico, os docentes
que já estavam posicionados do 4º ao 6º escalão não terão ganhos com o tempo
recuperado, porque esse tempo não pode ser usado para progredir (por imposição
de quotas administrativas). E a aplicação das normas vigentes vai originar a
colocação nos 4º e 6º escalões (em situação idêntica para progressão futura aos
5º e 7º) de docentes com menos tempo de serviço do que os que já lá estão
“estacionados” há muito.
É difícil prever a extensão da
conflitualidade que vai ser gerada dentro da classe, quando se verificar que
professores com menos tempo de serviço acabam progredindo na carreira antes de
outros com maior antiguidade. Mas é fácil antecipar os impactos negativos nas
pensões de reforma, em termos remotos, e na já de si constantemente agredida
motivação profissional, em termos mais imediatos.
2. Apesar das proclamações em
sentido contrário, a legislatura que vai findar não deixa marca na afirmação das
diferentes expressões artísticas nas escolas, nem tão-pouco ficará notada por,
finalmente, termos integrado os professores das artes na carreira docente.
Com o contentamento irresponsável de
quem não conhece a realidade, o Governo puxou pela cabeça e lançou o Plano
Nacional das Artes para os próximos 5 anos, a cujos aspectos mais caricatos me
referi no último artigo. Como se não fossem velhas de há 30 anos, mas
sistematicamente esquecidas, as bases gerais da organização da educação
artística pré-escolar, escolar e extra-escolar (DL n.º 344/90).
Os planos nacionais sempre foram (e
assim continuaram nesta legislatura), expedientes a que se recorre quando as
primeiras instâncias falham e não se sabe corrigir o que está mal. Custam muito
dinheiro, jogado em cima do que já existe, e apenas servem para recuperar
ilusões esquecidas.
3. Sem reflectir nem ouvir, o
Governo decidiu-se pela medida mais populista de toda a legislatura: a
gratuidade e reutilização dos manuais escolares, para todo o sistema de ensino
público (ficando de fora, vá-se lá saber porquê, os alunos que frequentam
escolas privadas com contrato de associação e os que frequentam escolas
profissionais).
A legislatura termina com meio país
de borracha na mão, num esfrega-esfrega de terceiro mundo, e a costumada guerra
do alecrim e da manjerona: o Tribunal de Contas disse que só 4% dos manuais
distribuídos foram reutilizados, o patusco Tiago Brandão multiplicou há dias a
cifra por dez. De concreto, os que pagam impostos, ricos ou pobres, com filhos
e netos ou sem eles na escola, já têm a factura à frente: uns redondinhos 185
milhões de euros.
Os recursos de apoio não deixavam
para trás um só aluno por falta de dinheiro para comprar manuais. A cegueira
ideológica determinou que todos subsidiem os netos de Belmiro de Azevedo e Alexandre
Soares dos Santos e criou um grosso problema que transita para a próxima
legislatura.
*Professor do ensino superior


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