segunda-feira, 3 de setembro de 2018

Facadas no turismo em Portugal




BARREIROS MARTINS – Diário do Minho
(Prof. Cat. Emérito, Jubilado da Universidade do Minho)

Fala-se de “Descentralização” dos poderes lisboetas e de “Simplex”, mas continuam a existir maus exemplos de centralização e o “Compliquex” ainda é grande em muitos casos. Hoje trazemos um à colação um Complexo Turístico do Centro do País.
É um projecto urbanístico cheio de ilegalidades que, em vez de atrair turistas estrangeiros e nacionais, acaba por os afastar. Dizem que o Empreendimento Turístico em causa foi licenciado pela entidade governamental respectiva, centrada em Lisboa e a Câmara Municipal local, em coordenação.
Dizem-me também que tal Complexo Turístico resultou da concessão por essas entidades de larga porção de terreno a uma importante Empresa Privada há muitos anos. Em Agosto de 2018 estivemos lá com familiares em 4 apartamentos de um ApartHotel de 4 (quatro) estrelas. Em nenhum desses 4 apartamentos existe uma linha telefónica para o hóspede comunicar com a GESTÃO a indicar qualquer anomalia, por ventura um início de incêndio ou uma inundação.
Trata-se de uma ilegalidade consentida pelas referidas entidades, pois, desde há mais de ½ século que em Portugal como na União Europeia antes do uso de qualquer apartamento, hoteleiro ou não, as entidades licenciadoras têm de mandar técnicos competentes verificar se estão cumpridas TODAS as exigências legais.
Só depois essas entidades podem passar a “Licença de Habitabilidade”. Mas havia várias outras deficiências graves: as mesas de cabeceira dos quartos eram partes de troncos de pinheiro polidas com base superior de 25x25cm !!! (sem gavetas !!!). Resultado: a Esposa colocou um copo de água sobre a pseudo-mesa de cabeceira para beber durante a noite.
Ao tentar apanhar o interruptor para acender a luz virou o copo que caiu e se partiu espalhando água e vidros na frente da cama. Lá teve o marido de arranjar maneira de apanhar todos os vidros, para ninguém se ferir com algum pedaço de vidro não removido. Também não havia no quarto uma só cadeira de qualquer espécie, nem uma secretária para se poder escrever qualquer carta ou tomar quaisquer notas! No quarto de banho não havia um banco, indispensável quando a pessoa sai do banho.
Ora tudo isto existe nos hotéis do Algarve e do Sul de Espanha onde estivemos noutros anos. Fora do Hotel as ilegalidades também são muitas. A localidade do Complexo Turístico, no verão, tem largos milhares de habitantes, mas não tem uma Farmácia!, o que é uma aberração turística. E a grande maioria dos restaurantes, que são muitos, não tem WC! o que é outra aberração turística. Por sorte existe uma, e uma só, máquina ATM para se poder levantar dinheiro.
A localidade só tem um local de venda de abastecimentos (um pequeno “hipermercado”) onde até a água em garrafões acabou! Por baixo existe um parque automóvel onde se paga 1,50€ por ¼ de hora de estacionamento. Mas, essa localidade tem “milhentas” lojas onde se vende toda a sorte de “bugigangas”…
Junto à Direcção do Hotel anunciavam-se visitas guiadas a umas “Ruínas Romanas”. Nós lá fomos nos nossos veículos. 5Km de estrada poeirenta tendo no final as tais Ruínas. Ao lado destas uma bela praia. Mas só havia um pequeno local de venda de sandwichs que não utilizámos, dados os níveis de poeira. Por tudo isso, além dos nossos carros só havia mais dois.
Ao lado da estrada poeirenta havia uma estrada asfaltada que dava para um acampamento militar (os militares não querem faltas), mas não para “Ruínas. Será que, nem entidade governamental centrada em Lisboa, nem a Câmara Municipal local conseguiam verbas para asfaltar aqueles 5Km de estrada ?!!! Isso aumentaria de forma hiperbólica as visitas às “Ruínas Romanas” e à praia local. Nesse caso, certamente que haveria restaurantes e outras formas de comércio de grande interesse para as populações.
Discutindo todas estas questões com um eng.º civil da região, disse-me ele que todas estas deficiências resultavam de que, nem a nem entidade governamental centrada em Lisboa, nem a Câmara Municipal local, tinham técnicos habilitados para fazerem as vistorias legais antes dos licenciamentos.
Por isso, todos os projectos e execução das Obras tinham ficado aos “cuidados” dos arquitectos e engenheiros da Empresa concessionária. Portanto, todas as culpas recaiam sobre o “mau da fita,” o dono da Empresa. Claro que se trata de “desculpas de más Entidades Públicas” que não souberam (ou não quiseram, sabe-se lá porquê) defender o Interesse Público.
Se, nem a nem entidade governamental centrada em Lisboa, nem a Câmara Municipal local, tinham técnicos habilitados a fiscalizar projectos e execução de Obras de Interesse Público, como tantas vezes acontece, porque é que não requereram, ou ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), ou ao IST (Instituto Superior Técnico) ou outro Laboratório de Engenharia Civil de uma universidade do País, para darem “pareceres” antes de se fazerem os licenciamentos ou mesmo antes dos projectos e execução das Obras?.
Note-se que, por minha experiência no Laboratório de Engenharia Civil da Universidade do Minho, a melhor solução será sempre haver “Juntas Técnicas” para cada caso, compostas por engenheiros (e arquitectos) do Laboratório da Universidade X e de engenheiros (e arquitectos) da Entidade Privada adjudicatária. Em geral, os técnicos não “brigam” uns com os outros.
Todos estão interessados em que as Obras sirvam os fins para os quais são destinadas. Em Portugal há especialistas, reconhecidos internacionalmente, para darem pareceres independentes, para garantia da qualidade de todas as Obras acima referidas.
Há que consultá-los. Infelizmente vê-se que a maior parte das entidades públicas estão longe deste “desiderato”. Metem-se constantemente “idealismos” e “politiquices” em casos de Obras de grande interesse para o desenvolvimento do País.
E, ironicamente, os meios de Comunicação Social andam todos atrás dos “politiqueiros”. Há mais exemplos eloquentes a este respeito: Todos os anos na Costa da Caparica o mar “come” a maior parte das areias e alguns restaurantes que estão por perto.
Depois de cada desastre a respectiva câmara municipal paga uns largos milhões de euros a uns “empreiteiros” que vão lá meter alguns milhões de m3 de areia para “refazer” a praia. Milhões de m3 de areia que são “comidos” pelo mar na invernia seguinte…
Ora, nós conhecemos um “Projecto de Obras Marítimas” elaborado por um engenheiro que veio de Moçambique para uma grande empresa especializada em” Projectos de Obras Marítimas”, à qual, por 1960, foi adjudicado um projecto para resolver esse grande problema. Só que o governante responsável pelas Obras Públicas nesse tempo, escreveu na 1ª página do tal projecto que lhe foi apresentado: “É muito caro, ARQUIVE-SE”. E continua arquivado, mais de ½ século depois…

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