Alberto Manguel foi
leitor de Borges, o escritor argentino que deveria ter recebido o Nobel da
literatura, mas não recebeu. Em 2013 a “Tinta da China”, publicou um livro
curioso de Manguel e Guadalupi, que nos dá sempre um prazer enorme de consulta
quando necessário: “Dicionário de lugares imaginários”.
Manguel é um bibliófilo
do “catano”. A sua mítica biblioteca pessoal possui cerca de 40 mil volumes (ou
mais). E dessa biblioteca transporta-nos para o mundo dos livros, de sonhos remotos
ou actuais. Para o mundo enigmático e fascinante das bibliotecas na história do
mundo.
A sua actual biblioteca,
diz-nos logo nas primeiras páginas, foi um templo dedicado a Dionísio no tempo
dos Romanos, e no século XV foi um celeiro de uma pequena colina do sul do
Loire. E desse antigo pequeno celeiro, Manguel revisita Lucano no século I
descrevendo Júlio César caminhando pelas ruinas de Tróia. Á noite, folheando
esses livros, recordam-se fábulas remotas orientais como a de Zadig e cidades
míticas como Samarcanda. Mas também se folheiam obras mais recentes como as de
Voltaire.
E nas conversas com os
seus amigos, Manguel diz-nos que a biblioteca de Montaigne ficava no terceiro
andar da sua torre, num “antigo espaço de arrumos”. Ali havia passado a maior
parte dos dias da sua vida, mas nunca lá esteve de noite. Ao contrário de Manguel
que frequenta a sua de noite, na companhia de Keats, Virginia Woolf e tantos
outros, sem esquecer Hermann Hesse ou Walter
Benjamin. Ou Safo,
a poetisa grega de Lesbos, ou Chalamov
e os seus contos de Kolimá.
De lá avistamos a mítica
biblioteca de Alexandria, ouvimos as suas histórias (contadas por Estrabão) e observamos a sua
destruição. Ou a de Pérgamo que foi uma imitação da do antigo Egipto. Do nada
surge Calímaco que há mais de 22 séculos havia utilizado a primeira
classificação alfabética de uma biblioteca, um dos mais notáveis bibliotecários
de Alexandria, poeta admirado por Propércio e Ovídio e autor de mais de 800
livros e um catálogo de 120 livros de autores gregos mais importantes da
biblioteca, depois da referência à maior enciclopédia do mundo, a Yongle Dadian,
encomendada no século XV pelo imperador Chengzu.
Sabemos da história de
Melvil Dewey e da do antigo templo de Dionísio. Como são ordenados os livros ou
os autores. Juntam-se amigos de todos os tempos, como Borges e Bioy Casares, ou
Goethe e Schiller. Deles dependem a organização das várias bibliotecas como a
de Lionel Johnson que inventou prateleiras suspensas no tecto, ou a de Althorp
cujas estantes alcançavam alturas vertiginosas. Mas sabemos ainda das
irresponsabilidades praticadas em algumas, incluindo a biblioteca do Congresso
e a biblioteca Britânica, sujeitas aos “criminosos do microfilme”.
Mas as bibliotecas são
acumulação de conhecimento. No ano de 764, a imperatriz japonesa Shotoku,
mandou imprimir quatro dharani-sutra. E dez séculos depois, Diderot, em 1751,
retomou o projecto de Shotoku com a Encyclopédia.
O livro embarca numa
viagem de sonho pelas bibliotecas da Mesopotâmia do rei Assurbanípal, entre
668-633 a.C., pelas bibliotecas de Carnegie, pelas de Chinguetti em pleno
deserto, pelas das grutas em Mogao, a de Adolf Hitler, ou as mais recentes
burrobibliotecas das zonas rurais da Colômbia
Foi um dos melhores
livros, sobre o tema, que lemos em 2016.
Armando Palavras
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