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Este texto de
Jaime Nogueira Pinto vem lembrar aquilo que ficou conhecido por A fome- genocídio ucraniana de 1932-1933,
inserida nas Politicas genocidárias na
Rússia Soviética, fosse no tempo de Lenine, ou no tempo de Estaline, hoje
bem estudadas e aprofundadas.
Quando Boris
Pasternak foi convidado a instalar-se no campo (à semelhança de outros
escritores), a propósito de se documentar sobre a nova vida das aldeias
colectivizadas, ficou tão perturbado com o que os seus olhos observaram que,
durante um ano não conseguiu escrever. Fundamentalmente com aquilo que lhe era
dado a observar sobre a Ucrânia. Um espectáculo indizível.
Após o desastre
demográfico e social ocasionado por uma fome de características sem precedentes
que culminou na Primavera de 1933, o quadro apresentava-se como um “triste
deserto” nas palavras de Malcom Muggeridge, correspondente do Manchester Guardian. Dos campos baldios,
às aldeias abandonadas e à enormidade de mortos pelas ruas, a Ucrânia apresentava-se
como um local tenebroso.
A fome
genocidária da Ucrânia sustentada numa repressão de sessenta anos e de negação
é hoje, felizmente, tema de várias investigações históricas sistemáticas. Entre
os números apontados pelos historiadores russos e os historiadores americanos,
estima-se que cerca de seis milhões de ucranianos tenham padecido. 1/4 da
população. O que transforma a violência totalitária estalinista, em violência
genocidária. Em números mais elevados que o genocídio nazista.
A grande fome da
Ucrânia sucede-se à acção politica de deskulakização (cerca de 200 mil quintas
“deskulakizadas”, 250 mil pessoas executadas e um milhão de deportados). Os
camponeses deixaram de ser donos daquilo que cultivavam. Tudo era pertença do
Estado. E o estado estalinista exigia quotas elevadas. Esta mortandade foi
ideológica. Quem queria comer praticava um crime contra o Estado. O terror
reinou nos campos da Ucrânia.
Embora alertado
sobre a situação dramática dos camponeses ucranianos por Térékhov, o secretário
do comité central ucraniano, Estaline promulga a sete de Agosto de 1932 a fomosa “lei das
espigas”, que prevê a pena capital para todo e qualquer atentado contra a
“propriedade do Estado”. Ou seja, para qualquer camponês esfomeado que tivesse
o arrojo de colher algum trigo não ceifado, mesmo por ele cultivado. E no dia
22 de Agosto, um decreto proibia que os camponeses comprassem pão. Em Dezembro
é instituído o passaporte interno (apenas concedido aos cidadãos!) fazendo do
campesino ucraniano um bandido em potência. Postychev
é incumbido de impor as determinações terroristas de Estaline aos comunistas
locais, já horrorizados com a matança em massa dos seus compatriotas.
Os testemunhos
afloram agora à superfície, incluindo os casos de canibalismo. Em 1930, A Terra, o filme de Dovjenko, considerado
um dos filmes mais belos do mundo, trata do tema da colectivação e mecanização
dos campos.
O cônsul
italiano de Carcove deixou num relatório de Maio de 1933 uma descrição
arrepiante sobre as evacuações de crianças encerradas até à morte em vagões,
barracões ou recintos fechados. A vontade manifesta de destruir os ucranianos é
atestada por Robert Conquest, ao notar a intenção deliberada de privar as
pessoas de alimentos. A partir de 1933, a Federação
Europeia dos Ucranianos no Estrangeiro publicou em Bruxelas A Fome na Ucrânia – os seus horrores, as suas
causas e os seus efeitos. Dois anos mais tarde, Eward Ammende, publicou Vida humana na Rússia. Em 1934
W.H.Chamberlin publicou Rússia’s Iron Age
e em 1937 saiu a público Assignment in
Utopia, de Eugene Lyons.
Mas depressa
estas vozes foram abafadas pela propaganda soviética, à qual era dado crédito
por muitos intelectuais ocidentais.
Esta fome
genocidária continua a ser mal conhecida do público ocidental, embora o esforço
empreendido pela diáspora ucraniana não tenha mãos a medir na sua denúncia.
Se a leitura dos
livros de história ou os de testemunhos se tornam, muitas vezes, aborrecidos,
revirem-se as folhas de literatura. É pois, neste caso, aconselhável a leitura
do romance de Vassili Grossman, recentemente editado em Portugal: Tudo Passa. Através de uma das suas
personagens, um activista convicto, o romancista ucraniano evoca o processo de
colectivização na Ucrânia. Em determinada passagem do terrível romance de
Grossman, está bem patente a forma como o ódio foi alimentado nas fileiras dos
activistas, esses homens vulgares seguidores da tendência leninista/estalinista
para considerarem os seus irmão como “insectos nocivos” e “parasitas”.
Armando Palavras
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