Abel Coentrão
03/03/2013
Concelho
juntou-se à Universidade de Trás-os-Montes e a outros parceiros num projecto
que visa conservar e valorizar, social e economicamente, as suas riquezas
ambientais
É um concelho
que tem, muito provavelmente, o maior jardim botânico da Europa. Mas quase não
o deu a conhecer, até hoje. A invisibilidade deste tesouro criado em pleno
campus da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) na década de 80
diz bem da relação de Vila Real com o seu património biológico. Mas tudo isso
está a mudar, graças ao Programa de Preservação da Biodiversidade que, soube-se
anteontem, acaba de ser considerado um dos cinco melhores em curso em três centenas
de municípios de todo o mundo, pela Associação Internacional de Cidades
Educadoras.
A distinção por
esta rede de cidades foi anunciada em plena Bolsa de Turismo de Lisboa, onde o
concelho de Vila Real esteve a mostrar-se como um destino interessante para
quem gosta de associar férias e ecologia. Entre outras novidades, essas pessoas
vão ter, já a partir do Verão, dez biopercursos assinalados no terreno nos
quais, além de tratarem da saúde ao andar a pé, poderão descobrir alguma da
fauna, flora e ainda património geológico, com informações disponíveis, em cada
lugar, no seu smartphone, se este tiver um GPS.
Vila Real
activou o seu "GPS" há três anos, quando, após discussões em torno da
Agenda XXI local, muito virada para as questões da sustentabilidade, percebeu
que se quer posicionar entre os sítios do mundo conhecidos por uma relação
positiva com a natureza, explicou ao PÚBLICO Carlos Lima, do Departamento de
Planeamento e Desenvolvimento Sustentável da autarquia. Com metade do
território alvo de medidas de protecção, quer fazer disso um valor.
O termo
"uso condicionado", muitas vezes utilizado para falar de áreas onde
não se pode edificar, nem sequer foi pronunciado pelo vereador do Ambiente,
Miguel Esteves, muito satisfeito com esta parceria. E se, noutros municípios
com áreas em parques naturais, o discurso é habitualmente crítico, por causa de
oportunidades que tal classificação "impede", aqui, ter 40% da área
inserida no Parque Natural do Alvão e no sítio Alvão-Marão da Rede Natura 2000
é visto como uma vantagem.
E há muito para
proteger. Muito para conhecer e ver. Só entre as aves há 126 espécies em Vila
Real, território do lobo-ibérico e de outros mamíferos, como morcegos (21
espécies) a lontra ou o gato-bravo; habitat de uma vintena de répteis; e de 14
espécies de micromamíferos, como a vulnerável toupeira-de-água. Este é ainda
território de bivalves, como os mexilhões-de-rio, de anfíbios como a
rã-de-focinho-pontiagudo ou a Salamandra lusitanica, ambos em situação de
vulnerabilidade também, e de uma, entre várias borboletas, a Maculinea alcon,
muito famosa pelo risco de desaparecimento que enfrenta e por ter aqui o seu
poiso favorito no nosso país.
O
reaparecimento da borboleta-azul (ver caixa ao lado) simboliza uma espécie de
reconciliação do homem - a actividade mineira no Vale da Campeã foi abandonada
- com a Natureza, que voltou a criar condições para este leptidóptero. Outros
projectos, como o da renaturalização das margens do rio Corgo, visam proteger
as espécies de flora e fauna identificadas ao longo deste importante afluente
do Douro. Algo só possível depois de concluído um invísível trabalho de
monitorização, levado a cabo, ao longo dos anos, por investigadores da UTAD,
pelo Parque Natural do Alvão ou por associações que se tornaram parceiras do
programa.
Coordenador
pelo lado da autarquia, Carlos Lima assume que, no fundo, o munícipio tratou de
agarrar "várias pontas soltas", agregando num mesmo projecto dezenas
de pessoas que, sem o saberem, trabalhavam para um objectivo comum. Em
"tempo de vacas magras", o apoio de 1,7 milhões de euros de fundos
europeus, por via do Programa Operacional do Norte, foi essencial para levar a
cabo todo um conjunto de iniciativas que, além dos objectivos
conservacionistas, não esconde a intenção de transformar a sociedade local,
chamando-a a participar em acções como as "rogas dos rios" - raides
de limpeza de margens de cursos de água - para um maior conhecimento desta
riqueza.
Riqueza que,
pretendem os promotores, deverá também ter reflexos no plano económico. O
projecto contempla iniciativas de dinamização de algumas actividades,
agrícolas, comerciais e turísticas, de baixo impacto na natureza. E segundo o
coordenador científico, Mascarenhas Fernandes, há condições para, no futuro,
alargar ao resto da região transmontana, pontuada por vários parques e com
alguns projectos ligados à biodiversidade, o conceito que está a ser aplicado
em Vila Real. Uma cidade que até tem um jardim botânico de 130 hectares, maior
do que os famosos Royal Kew Gardens, de Londres, e que pretende dá-lo a
conhecer ao país. Os participantes no Fórum da Biodiversidade, que se realiza a
21 e 22 de Março na cidade, vão ter uma oportunidade para o apreciar.
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