quinta-feira, 10 de maio de 2012

Pires Brás - “Os Segadores” – Concelho de Macedo de Cavaleiros














Tempo das ceifas, ou das cegadas, tradição num concelho cerealífero por excelência. O CONCELHO DE MACEDO DE CAVALEIROS.
A nossa crónica contempla os Macedenses que festejam as festas de São Pedro. O São Pedro em Macedo de Cavaleiros, cuja tradição deixou de ser o que era, pelo menos neste campo das ceifas, em que o ruralismo se confundia com e identidade cultural da época. A tradição sofreu a transformação natural do tempo e adaptou-se às novas realidades da vida dos Macedenses. 
Fonte dos Cavaleiros
O São Pedro de Macedo, nos nossos dias, já tem outro tipo de música pelas ruas, diferente das cantigas dos anos 30 aos anos 70, onde os segadores cantavam pelas ruas quando regressavam a casa, de ceitoura e dedais pendurados no cinto e, às vezes, com os dedos golpeados pelas foices, quase sempre de punhos picados com os restolhos do centeio e trigo, depois de atar em molhos estes cereais. A tarefa de “ atar” sempre foi difícil e dolorosa, ainda mais dolorosa que cegar... Na maioria das “ camaradas de segadores” poucos se distinguiam na habilidade de “atar”. Pois era preciso que alguém fizesse este trabalho com responsabilidade e, ao mesmo tempo, que os “ molhos” fossem todos mais ou menos iguais entre si.
Em outro local falamos da Feira de São Pedro que se realizou pela vigésima sexta vez (XXVI) mas como um certame económico da Região, em boa verdade o melhor certame económico do Norte.
Dizíamos que “ a Feira de S. Pedro é uma referência que se consolidou ao longo destes anos, tendo resistido a todas as mudanças económicas e sociais do tempo”... Aqui, nesta feira até parece que nem há CRISE, porque a Associação Comercial e Industrial de Macedo tem feito um óptimo trabalho, pois enquanto algumas feiras da Região vão perdendo valências e vão ficando pelo caminho, a FEIRA DE SÃO PEDRO SOMA E SEGUE!...
Portanto hoje não vamos falar dos duzentos expositores que estiveram uma semana no certame, mas vamos recuar no tempo meio século, para contar que nas ruas de Macedo, pelo São Pedro se passeavam centenas de “ camaradas de segadores”, tocando e dançando, canções populares, ora tocadas nas concertinas, ora de cavaquinhos, guitarras e violas.

A ceifa - Peter Bruegel, o Velho, c. 1565
Estas “ camaradas” de segadores vinham com destino à PRAÇA DOS SEGADORES, para ali fazerem o “ajuste de cavalheiros” entre o lavrador que requisitava. Na “camarada” era o capataz que mandava. Os dois homens (lavrador e capataz), quando apertavam as mãos, os segadores diziam uns para os outros: “Já temos o negócio fechado”... Era sinal que tinham trabalho, que tinham jeira garantida para uma semana ou mais. Depois disso o capataz tinha que arranjar patrões para a sua “camarada”. Se esta tarefa fosse impossível a “camarada” regressava à Praça dos Segadores para ser contratada de novo, pois era onde apareciam os lavradores para as contratarem.
Os segadores vinham de todas as terras, nomeadamente de Valpaços e Mirandela que não eram concelhos tão cerealíferos como Macedo. E também porque traziam as ferramentas designadas foices ou ceitouras, MACEDO DE CAVALEIROS FOI DESIGNADO O CONCELHO DA FOICE por alguns autores que, erradamente, chamam “à camarada de segadores, bandos de segadores “. Embora “ bando” também signifique grupo de segadores, no concelho sempre se falou de “camarada de segadores”. Então é preciso respeitar as tradições: “ em cada terra seu uso e cada roca seu fuso”.
Isto faz-me lembrar o mesmo baptismo do concelho de Valpaços que por diferentes razões lhe colocaram o mesmo Chavão: VALPAÇOS CONCELHO DA FOICE” e que esses autores nunca compararam, nunca contestaram, nem evidenciaram!..
Com ideias e pensamentos diferenciados também penso, se calhar todos pensamos que todos os segadores têm a mesma identidade e existiam com os mesmos objectivos e para os mesmos fins!.. Esses autores dizem que os Macedenses não se envergonhavam do “chamadouro!” Tanto não se envergonhavam que até levantaram uma praça com o nome “PRAÇA DOS SEGADORES” onde estão representados em bronze os lavradores e os segadores, ainda a dita rancheira que levava o almoço e mata bicho à “camarada”, de cesto à cabeça até chegar ao campo onde os segadores andavam a cegar...
Verão - Peter Bruegel, o Velho, c. 1568
Mas antes das ceifas se tornarem mecanizadas, aconteceu por volta de 1970, os segadores acudiam muito à vila de Macedo nesta época sazonal para ganhar umas jeiras que lhe dessem o sustento para suas famílias... Vinham de todas as terras, muitos de terras longínquas, da Região do Minho e Beira Litoral, mas todos tinham comportamento idêntico, traziam consigo a alegria, vinham em numerosas “camaradas”, de 20, 30, ou mais segadores, não gostando nada de dividir a sua “camarada” por dois lavradores. Isto porque só havia um chefe, o capataz. Se a dividissem, uma das partes ficava sem comandante ou capataz.
Também sabemos que no dia 29 de Junho, os segadores gostavam de ir à Feira de São Pedro a Macedo, para fazerem as serenatas “ por entre cantigas e o pezinho de chula” nomeadamente se eram Minhotos; ou entre o Fado à desgarrada, ou o fado em disputa, se eram Nordestinos, Valpacenses, ou Mirandelenses, etc…
Esta Praça dos Segadores, em Macedo de Cavaleiros, é também para homenagear a memória destes homens que por aqui passaram, trazendo consigo o desesperado princípio de viver, ganhar o pão de cada dia para matar a fome aos filhos, coisas que esta juventude, estas gerações não entendem. Às vezes até pensam que é filme... Mas foram tempos passados e vividos... Por isso não deixaremos esquecer as nossas tradições, para mantermos vivas a nossa identidade e as nossas raízes...

in: Trás-os-Montes e Alto Douro, Mosaico de Ciência e Cultura (2011)

O Autor


Manuel António Pires Brás, Nasceu em Murçós, em 5 de Janeiro de 1948. Cumpriu serviço militar no Porto, Lisboa e em Bragança e foi neste período obrigatório do serviço militar (cerca de 4 anos) que realizou os seus estudos, tendo concluído o 7º Ano dos Liceus. Em 1974 foi trabalhar e estudar para o colégio Nossa Senhora da Saúde em Chaves. Em 1975 ingressou no quadro da PSP (Policia de Segurança Pública) em Lisboa, e no mesmo ano, interrompeu o curso de Sargentos para ingressar no curso do Magistério Primário em Bragança, concluindo o curso de Professor Primário, na Escola do Magistério Primário de Chaves, no ano de 1976. Colaborou com vários jornais: Força do Povo, O Retornado, Jornal da Madeira, Jornal Alto Tâmega, Noticias de Chaves e Mensageiro de Bragança. Actualmente é proprietário e Director do jornal Negócios de Valpaços. Em 2002/2003 adquire a Licenciatura em “Animação Sócio — Cultural”  na Escola Superior de Educação, Instituto Jean Piaget. Em 2004 publicou a sua primeira obra : “Santuário do Castanheiro”. Foi editor de mais duas obras e co-autor do livro “ O Menino e o Rio” por o seu autor, Júlio Maltez, ter falecido e lhe ter deixado “ O Menino nos braços”. Tem, neste momento, dois livros para publicação. Um deles de crítica social ao Burgo Transmontano” Chama-se “Crónicas Nordestinas”, o outro para brevemente, é um romance intitulado “ O Sonho De Laura”. Continua a dedicar-se à Agricultura

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