Joaquim do Nascimento colaborou na Antologia de Autores
Transmontanos, Durienses e da Beira Transmontana, editada pela Casa de
Trás-os-Montes e Alto Douro, lançada a público no passado dia 25, por altura da
abertura do IV Congresso de Trás-os-Montes e Alto Douro, no Pavilhão do
Conhecimento, no Parque das Nações em Lisboa. Enviou-nos este belo texto onde
relembra a Páscoa da sua Aldeia (Pereiros - São João da Pesqueira). Aqui vai.
PÁSCOA – A CELEBRAÇÃO
JOAQUIM do NASCIMENTO |
Na Páscoa
cozíamos o pão e devia ser no sábado para ainda estar estaladiço, fazíamos
biscoitos que é um bolo doce que se amassa com ovos, azeite e leite, um cálice
de aguardente e dez tostões de bicarbonato que lhe serve de fermento, estava-me
a faltar a farinha, não é preciso esperar que a massa levede. Porque o bicarbonato
faz isso durante a cozedura e, quando saem do forno saem com a forma de um seio cheio, redondinho, alevantado,
aureolado que se deixa fechar inteiro numa única mão.
Estes eram os
mimos da nossa Páscoa que deviam ser compostos com uma perna de carneiro velho
ou de ovelha redundante, os nosso mimos eram poucos e sem grande imaginação,
mimos de forno, da panela e da certã, tira açúcar põe açúcar, mais canela,
menos canela, olha as filhós do Natal olha os bolos da Páscoa para o folar dos
afilhados olha os biscoitos amarelinhos da dúzia de ovos que levaram, tão
banais os nossos mimos sempre que queríamos celebrar, junta aí uma travessa de
arroz doce com corações desenhados a canela para enfeitar, uma almofia de creme
com açúcar queimado com a rapadoira de tender o pão, eram as guloseimas que
conhecíamos se lhe juntarmos, do soto, os rebuçados de alteia e mel uma dúzia
de confeitos coloridos, meia dúzia de bombons de chocolate, no sapatinho, mais
pela prata multicolor que os envolvia do que pelo gosto que se evaporava na
cova de um dente. E um pacote de bolachas Maria dos pequeninos, redondinhas,
torradinhas, de comer e sonhar por mais.
Por esta azáfama
já vês o jeito que nos dava que Cristo ressuscitasse ao meio dia de sábado
quando repicavam os sinos e tinha terminado a Quaresma com os santos tapados
por detrás de panejamentos roxos despidos de seus ouropéis.
Da festa fazia
parte uma roupa nova para a missa do Domingo que já não era do galo, nós que
desconhecíamos as tendência da moda éramos pouco exigentes, umas botas de
atanado natural e rasto de pneu, umas calças de cotim que ainda cheiravam a
goma, uma camisola de maralha que a mãe tinha feito ao serão, era quanto
podíamos ambicionar, Mas posso dizer-te que nunca houve mocidade mais elegante
do que a mocidade dos Pereiros, saia e blusa para as raparigas, são cravos e
flores criados na Primavera, no sonho de cada rapaz ficava por cumprir uma fato
de pana e uns sapatos de calfe num dos mercados em redor, não, ainda não tinham
sido inventados os kispos, nem os ténis de todas as cores.
Hoje fui comprar
uns ténis novos para estrear no dia de Páscoa, se ninguém ache inconveniente
que eu não calce, para ir à missa, os meus sapatos de polimento, os meus sapatinhos
de ver a Deus e à nossa avó.
Para as minhas
amigas e para os meus amigos que continuo a encontrar aqui, ainda muitos,
apesar das baixas e da desaceleração ainda somos muitos, só não faço uma lista
vossa para não correr o risco de me esquecer de alguém
Até depois da
Páscoa que, na minha terra, sempre foi à segunda-feira para desmentir o rifão
“temos a Páscoa ao domingo, como no ano passado”.
Salto por cima
da procissão e do folar que é por este nome que nós conhecemos o compasso.
29’03.2018
© Joaquim do
Nascimento
Obrigado, Professor Armando Palavras pela inserção, se lhe convier eu passo a mandar-lhe mais "croniquetas" e prometo que farei uma revisão mais cuidada delas.
ResponderEliminarObrigado também pelas fotos que leccionou, como se vê pelas paredes estamos na zona do xisto, mas o granito já nem ´é muito longe de nós.Houve um tempo em que os Pereiros teve um blog, chamava-se Pereiros e Douro, era da Catarina, Alves do ex-marido, Fernandes de nós, mas finou-se nem sei por quê, escrevi muito, se calhar demais, para o nosso blog, que foi um factor de afirmação da nossa identidade. Renovo o meu bem-haja!
É claro que essas "croniquetas" de Pereiros (terra por onde passei há mais de uma década em trabalho Doutoral) - ou melhor dizendo, do Douro - serão bem vindas.
ResponderEliminarAbraço fraterno.