O problema põe-se ao contrário: a maioria das senhoras (e dos
cavalheiros, calculo) é competente o bastante para evitar a política e deixá-la
ao cuidado dos que, independentemente do sexo, não são.
“Terão os partidos mulheres suficientes para as listas?”,
aflige-se o “Diário de Notícias”. É extraordinário. Por um lado, que, com cerca
de 72 leitores (contando comigo), o “Diário de Notícias” continue a existir.
Por outro, que a misoginia vigente insista em aumentar por decreto a
“participação” feminina na política, agora elevada a 40%.
Não é por acaso que a “participação” leva aspas. A relativa
escassez de senhoras nos partidos sempre foi um indício da higiene daquelas e
da sujidade destes. Desde tempos imemoriais, é sabido que, com excepções tão
raras quanto dignas de estudos científicos, apenas chafurdam nesse meio
criaturas rotundamente incapazes de prestar qualquer tarefa válida à humanidade
ou sequer ao condomínio lá do prédio. Se alguém demonstra uma absoluta
inaptidão para o trabalho e a vergonha na cara, candidata-se a uma repartição
das Finanças. Se nem para isso prestar, alista-se num partido, onde poderá
exibir a presunção dos simples, traficar “ajudas de custo” e tratar juízes por
“pá”. Salvo por um pequeno número de casos perdidos, boa parte das mulheres tem
mais o que fazer – sobretudo não fazer figuras tristes. E é triste que, por
obra e graça de políticos, uma quantidade crescente de fêmeas da espécie se
vejam arrastadas pela e para a lama. Dada a ética do sector, e a necessidade de
“preencher” as “quotas”, imagino algumas convertidas sob sequestro e ameaça de
navalha.
Não vou questionar o direito de o Estado intervir nestas
matérias: a pergunta seria absurda e, em Portugal, a resposta seria ainda pior.
O que é interessante – e notável, na perspectiva do marketing – é que tamanho
enxovalho seja vendido a título de “promoção” ou, na versão épica, de avanço
civilizacional. Os factos mostram exactamente o oposto. Se o verdadeiro
objectivo do exercício é a “emancipação” das mulheres, porque é que esta não se
aplica a profissões honradas? Porque é que não se impõem “quotas” nos ofícios
de carpinteiro (de limpos e de sujos), camionista (longo e médio curso),
trolha, canalizador, futebolista, guarda-nocturno, mineiro, pedreiro,
sapateiro, palhaço, etc.? Porque é que o reconhecimento da igualdade se
restringe a cargos que diminuem os titulares? Porque é a humilhação que se
pretende. Chegar a autarca, administradora pública ou ministra é das menores proezas
ao alcance do ser humano: com as “ligações” adequadas, uma grafonola
desempenharia funções idênticas com mestria e honestidade superiores.
Aliás, a confirmação de que a “lei da paridade” visa achincalhar
especificamente as mulheres está na circunstância de não abarcar critérios
“identitários” cujo achincalho é desaconselhado pela moral vigente. Só no que
respeita ao “género”, a coisa fica-se pelo tradicional binário e esquece-se
deliberada e cautelosamente do próspero sector “trans”. Ninguém propõe a
reserva de pedacinhos do Parlamento para os/as indivíduos/as agénero (1,5%,
digo eu), bigénero (1,2%), intergénero (0,8%, obviamente), pangénero (idem),
nanogénero (aqui hesito), demigénero (já me perdi) e travesti não-binária
(chiça). A razão? Ninguém ousa ofendê-los/las/lis/los/lus.
O receio de ofensa também explica a ausência de propostas
paritárias para os restantes factores de identidade. Para não insultar os gays,
o “sistema” não arrisca bulir na representatividade segundo a orientação
sexual. Para não caluniar as religiões, não se sugerem proporções de budistas,
muçulmanos, animistas ou presbiterianos. Para não difamar as etnias, não se
enfiam à força asiáticos, negros, ciganos, ameríndios ou esquimós nas listas
das “legislativas”. Ou uma determinada porção de boavisteiros, ceguinhos,
circuncisados, flautistas, vegetarianos ou o que quer que seja que torna a
pessoa aquilo que é. Não, senhor: o único “grupo” empurrado à força para a
política é o das mulheres, um acto machista, ressentido e quase perverso.
Para cúmulo, os adversários das “quotas” reagem a tamanha
infâmia com a lengalenga de que a maioria das mulheres é competente o bastante
para entrar na política sem ajudas ou favores estatísticos. O problema, meus
caros, põe-se ao contrário: a maioria das senhoras (e dos cavalheiros, calculo)
é competente o bastante para evitar a política e deixá-la ao cuidado dos que,
independentemente do sexo, não são. Antes e depois do reforço percentual, a
“lei da paridade” rebaixa as mulheres e exalta os políticos – adivinhem quem a
aprovou.
Nota de rodapé:
A tese dominante assegura que os vídeos dos interrogatórios ao
“eng.” Sócrates foram divulgados pelo advogado do próprio. Talvez a tese esteja
correcta. Mas se a ideia é a de que aquele repositório de prepotência, ridículo
e até alguma maluquice redime o sujeito aos olhos dos portugueses, aconselho o
“eng.” Sócrates a trocar de advogado. Ou o advogado a trocar de “eng.”
Sócrates. Ou Portugal a trocar de portugueses.
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