Já fez um mês que se deu
a tragedia de Pedrogão Grande e dos concelhos limítrofes, até aqui ainda não
faltaram palmadinhas nas costas e de promessas que se vai dar resposta rápida
ao drama de quem ficou sem familiares, haveres, emprego e empregadores. Mas finalmente
viu-se agora o Sr. PR passar das palmadinhas às palavra diretas que não tem
tido coragem dizer . Foi preciso ir ao México para de lá reconhecer que “Todos
nós, que assumimos poderes públicos, temos de reconhecer com humildade que
aquilo que é uma das funções [do Estado], que é a segurança das populações, não
foi possível garantir cabalmente”. Como também concordo com o seu apelo no
sentido de que nesta campanha eleitoral se fizesse “ um pacto eleitoral
naquelas áreas para que se esqueça a campanha ou para que não se use esta
tragédia até Outubro”. Pior é o reparo que fez Passos Coelho acusando o Governo
de impor a “lei da rolha” aos serviços de proteção civil, acerca dos fogos.
Citou: "Esse é o tempo que vivemos hoje, o tempo da demagogia política e é
o tempo em que a política primeira, preferida, da maioria e do Governo é a da
comunicação. Não vá a comunicação falhar, tivemos hoje notícia, provavelmente a
última, de que a lei da rolha se deverá observar em matéria de serviços de
protecção civil". Quem te avisa teu
amigo é.
Tudo isso de palmadinhas
nas costas estaria conforme se não fosse as famílias de 64 vitimas mortais, um
mês depois da tragédia continuarem à espera das ajudas do governo que temos. Se
não fosse a Cáritas e a solidariedade do povo português, estavam bem
aviados, à espera que o tempo salvase a
situação.
É verdade, não fora a
generosidade do povo já tinham todos morrido à fome. A carta que transcrevo é
bem elucidativa:
“Venho,
por este meio, na qualidade de irmã da Sara Elisa Dinis Costa (mãe do menor de
7 anos, X), falecida no incêndio de Pedrógão Grande, questionar onde é que
estão as ajudas tão apregoadas. Agradou-me o facto de ter recebido uma mensagem
do Excelentíssimo Presidente da República, o Professor Marcelo Rebelo de Sousa,
no funeral, mas por outro lado choca-me não ter sido contactada por ninguém com
responsabilidades mandatado para o auxílio das vítimas. Também gostaria de
saber qual o destino das doações recentemente efetuadas à ‘causa’ das vítimas
do Incêndio de Pedrógão Grande. Uma vida não tem preço e associado a esse facto
há imensos custos inerentes a uma vida que se perde, bem como às vidas que
ficam (não me estou somente a referir ao trauma com que o meu sobrinho, filho
da minha falecida irmã, ficou, desde o conhecimento da morte da sua mãe mas
também o trauma com que quer eu quer o meu marido ficámos).Fui eu que tive de
me mexer para que ele tivesse tido apoio — fui eu que fui ao meu médico nos
HUC, na cirurgia Cardiotorácica de Coimbra, pedir apoio psicológico, fui eu que
arranjei um psicólogo para o meu sobrinho, ligando para o 112, e sou eu que
estou ainda a gerir o seu trauma, uma vez que as consultas do psicólogo são
caras. Temos uma maneira de não pagar tanto, mas que nos sobrecarrega a nível
emocional... E entretanto, daqui a uns dias, faz precisamente um mês desde que
a tragédia aconteceu e temos de nos levantar todos os dias.Também não entendo
como ainda ninguém se propôs a pagar os funerais das vítimas, que foi o
primeiro custo directo que se teve desta fatídica tragédia, uma vez que as
doações em género efectuadas (graças à extrema solidariedade do povo português)
serviram (e acredito que continuam a servir) perfeitamente para cobrir os
custos mais urgentes.Vou contar um pouco acerca da situação da minha família:O
filho da minha irmã, está connosco há cerca de 2 anos e meio, uma vez que a
minha irmã não tinha condições psicológicas para tomar conta dele, tal como
acontece com o seu pai. A minha irmã era estudante e nunca trabalhou ‘en
continuum’ (sem descontos para a Segurança Social) e o seu pai, divorciado da
sua mãe, tem problemas de dependências e possui trabalhos ocasionais. Desde o
acordo de promoção e protecção que temos arcado com todas as custas da
subsistência, educação, saúde e lazer, e aquando da solicitação do
apadrinhamento civil do menor por mim e pelo meu marido estava, nesse contrato,
o acordo de ambos os pais procederem ao pagamento de 75€/mês, para despesas
dele. O apadrinhamento civil ainda não se encontra homologado pelo tribunal. Já
nos foi apresentada a conta do funeral e, sendo um gasto extraordinário e não
expectável, não temos como o pagar e a única ajuda seriam os 200 e poucos euros
da Segurança Social.Não sou uma pessoa rica, apesar de os meus pais nos terem
deixado bens, bens esses que não conseguimos vender ou tirar rendimento deles
(alguns destruídos e danificados pelo fogo) e que são dispendiosos de manter.
Encontro-me actualmente desempregada, sendo que os únicos rendimentos da minha
família são os do trabalho do meu marido e do meu subsídio de desemprego desde
Junho do presente ano (embora ainda não tenha recebido qualquer prestação de
desemprego). Possuo uma incapacidade devido a problemas cardíacos e de AVC (de
61%), que não comprometem um normal ritmo de trabalho, desde que não haja
trabalhos extraordinários ou em que se necessite de fazer deslocamentos que
acresçam ao horário de trabalho (o que não acontece nas obras, trabalho que
efectuei durante cerca de 10 anos).Todos os que nos conhecem (nomeadamente
todos os da aldeia de Vila Facaia, da Vila de Castanheira de Pera e bancos)
sabem que gostamos de cumprir com as nossas obrigações e felizmente conseguimos
pagar praticamente todas as dívidas que o meu pai deixou aquando da sua morte
(em 2013), e pretendemos também fazê-lo com as dívidas da minha irmã, pelo que
não gostamos de ficar a dever nada a ninguém — estamos a dever o nosso
apartamento ao banco, sendo essa a nossa única dívida. Possuímos somente uma
pequena poupança, fruto do nosso árduo trabalho, e que já está destinada.Felizmente
o meu marido aufere mais que 1,5xIAS, mas, devido a tal facto, o X não irá ter
direito ao subsídio de orfandade e muito menos ao subsídio de morte (uma vez
que a mãe não fez descontos).Por fim, pretendo dizer que as dívidas que as
Santas Casas da Misericórdia espalhadas pelo país têm é real e o seu
conhecimento é de âmbito nacional, pelo que solicito uma descrição
pormenorizada da canalização dos fundos que está a ser executada, bem como de
todos os orçamentos escolhidos, face aos solicitados.Como cidadã inconformada
por esta morte, e como vítima desta tragédia, tenho direito em saber pormenores
da canalização destas verbas, uma vez que tenho a cargo um menor que sofre
todos os dias a perda da sua mãe.
E
que estuda (e gasta inúmeros bens escolares); E que lê imenso (porque já sabe
ler desde os seus 4 anos);E toma banho todos os dias;E que pertence a um clube
de xadrez (do qual é campeão do 1º e 2º anos do ensino básico), pago (e cujo
valor não entra no IRS);E que gasta luz e aquecimento, quando necessário, e
cuja roupa é lavada todos os dias;E que tem AECS (pagas, e cujo valor não entra
no IRS);E que come (ainda que gostássemos que comesse mais);E que vai à piscina
2 vezes por semana, porque é importante para o seu desenvolvimento global e harmonioso,
bem como para a sua destreza física; E que usa roupas (muitas, porque os seus 7
anos não são estáticos e, como se trata de uma criança extremamente saudável,
rasga umas calças a cada 15 dias);E que rompe em média umas sapatilhas por mês
(em meses bons, pois ainda prefere a trotinete — em que pode travar com os pés
- à bicicleta de rodinhas);E que vai a festas de anos (por ser um miúdo
popular, vai ‘a todas’ e deve contribuir com um presente);E que precisa de ter
actividades lúdicas e educacionais — muitas, porque se trata de uma criança
deveras inteligente que necessita de resposta às suas perguntas e precisa que a
sua inteligência seja estimulada; E que usa óculos (possui 8 graus de
hipermetropia num olho e 7 graus da mesma incapacidade no outro, o que
constitui óculos muito grossos - tentamos diminuir ao máximo o seu peso,
tornando-se extremamente caros) que têm de ser mudados uma vez por ano (e tem
de ter dois, porque dada a sua actividade e extrema ‘reguilice’ tem uns para
brincar e outros para estudar);E que precisa ser deslocado, de carro, de
autocarro, de comboio; E que rasga os joelhos (quando as calças estão rasgadas
ou se usa calções) ou parte a cabeça ou apanha gastroenterites (e espero que se
fique por aqui...).Agradeço uma resposta célere a este e-mail, pois possuo uma
dívida de mais de €1300 para pagar, pelo funeral, fora gastos com psicólogos,
transportes e burocracia para tratar de diversos assuntos que este fatídico
incêndio provocou. Agradeço igualmente que me seja informado quem irá pagar a
mensalidade que a minha irmã, mãe do X, iria ficar responsável de fazer, após a
homologação do apadrinhamento civil, pois a lei não prevê tal pagamento.Não
pretendo que o X sofra mais ou que seja estigmatizado pela morte da mãe. Ele
está ainda a processar esta morte terrível, ainda dorme comigo e com o meu
marido e chora todas as manhãs e todas as noites, quer antes de dormir, quer
com pesadelos. Mais informo que criámos uma conta para o meu sobrinho, para que
nós tenhamos possibilidade de o dotar de todas as ferramentas para que ele
possa crescer. Almejamos que tenha, no futuro, a possibilidade de desenvolver a
sua inteligência num curso superior, ou algo mais, pois acreditamos que ele tem
todo o potencial para desenvolver a sua genialidade. Esta sua conta foi aberta
com 175,50€ que o X tinha num porquinho mealheiro, de algumas ofertas que lhe
foram dando entretanto (aniversários, ofertas de familiares e de um casal muito
sensato e com bastantes conhecimentos, que o X gosta muito, e a quem faz muitas
perguntas) e que, com esforço, conseguimos não mexer. A consulta dos movimentos
desta conta (com as devidas justificações de levantamentos ) estará à
disposição para os beneméritos que aqui depositem o seu contributo. Grata pela
atenção dispensada ao presente e-mail,
Atenciosamente,
Ana
Costa”
Sem comentários:
Enviar um comentário