sábado, 6 de agosto de 2016

Sem desculpa

Alberto Gonçalves
Revista Sábado
A actual frequência de atentados cometidos por islâmicos em nome do islão é desagradável. Não, claro, por causa das vítimas envolvidas, que quase ninguém evoca. Mas por causa da dificuldade em arranjar desculpas para tamanha quantidade de perpetradores.
O atentado de Munique, na sexta -feira, ainda alegrou provisoriamente autoridades, comentadores especializados e as tropas da correcção política em geral: durante horas, acreditou-se que o assassino era alemão, logo branco, logo de extrema-direita, logo neonazi, logo pertencente a uma cáfila odiosa que urge exterminar sem demora. Na televisão e nas redes sociais, as tropas babavam satisfação: isto sim, é um atentado como deve ser, com um autor que se pode condenar sem reservas, uma "razão" que se pode generalizar sem receios e baixas que se podem lamentar sem rodriguinhos. A alegria durou pouco, dado que o afinal autor possuía ascendência iraniana e o fatal (nos dois sentidos) fervor pelo Profeta. A fim de emendar a mão, tratou de se lhe arranjar um problema psiquiátrico qualquer, para o distinguir dos muçulmanos moderados e dos sujeitos mentalmente sãos que chacinam terceiros apenas por pirraça.
Desde aquele dia, não é fácil inventariar os atentados similares e as vezes em que se recorreu a diagnósticos de distúrbios mentais para os justificar, perdão, explicar. Aliás, julgo que à força de querer evitar a islamofobia, começa a cair-se no erro de chamar malucos a uma data impressionante de islâmicos. O que, em si, é um bocadinho islamofóbico. E, no mínimo, bastante irritante.
Dizer à rapaziada que berra "Allahu Akbar" enquanto agita o machado que o seu gesto nada tem a ver com Allah é o mesmo que informar um benfiquista aos saltos no Marquês que, no fundo, ele simpatiza com o Sporting. É do senso comum que, se um tipo aprecia as vitórias do Benfica, usa um cachecol do Benfica e cola a buzina do carro a cada golo do Benfica, esse tipo é adepto do Benfica. Curiosamente, semelhante evidência não se aplica a 97% das análises e notícias acerca do terrorismo islâmico, para as quais este raramente é terrorismo e nunca é islâmico.
Porém, não há necessidade de atribuir as acções dos "mártires" exclusivamente à loucura. Só nos comentários online a um artigo do Expresso alusivo a Munique, estipulou-se que a responsabilidade cabe: à polícia; aos traficantes de armas; aos médicos que prescrevem calmantes; ao imperialismo americano; aos bairros sociais; ao grupo Bilderberg; ao nacionalismo; às experiências da CIA em "controlo da mente"; ao sr. Breivik da Noruega; às alterações climáticas; etc. À hora a que escrevo, a tendência fresquinha é responsabilizar as notícias sobre as matanças pelas matanças.
Careço da sofisticação intelectual que fundamenta essas teses. Por comodismo e ingenuidade, continuarei a acreditar que o islão é uma ameaça que, cedo ou tarde, a Europa, esta Europa de cócoras, terá de reconhecer e enfrentar. E que, com crescente frequência, o negacionismo (o termo não é familiar?) participa no derrame de sangue em curso, hoje próximo de uma guerra. Só não digo que os negacionistas também são culpados porque já há desculpas em demasia. E demasiada gente, "deles" e "nossa", que não merece nenhuma.

O BOM
estamos nas mãos de chalupas
No Twitter, crianças entretêm o ócio a discutir a utilização do frisbee pelos meninos (nave espacial) e pelas meninas (prato). De repente, um contributo: "A minha faria dele o escudo do Cap. América e certamente o faria voar para a tola de q [sic] lhe dizia que era um prato." Isto apareceu, e de seguida desapareceu, na conta oficial do governo (@govpt). Tanta imbecilidade e indigência não são fortuitas. Cada vez mais me convenço de que Portugal se tornou uma experiência para averiguar o tempo que uma sociedade sobrevive à demência absoluta. Um palpite: pouco.

O MAU
isto vai lindo vai
Por dificuldades de dicção e carências na gramática, metade do que o dr. Costa diz não se entende. Mas pior é a metade restante, como quando promete reagir a sanções processando as "inchtções" europeias – e acrescenta que Portugal merece apenas "uma palavra de carinho". Será que na cabeça dele isto faz sentido? Ou será que ele atribui aos seus eleitores o QI de Forrest Gump? Em qualquer dos casos, um portento destes não poderia rodar uma tômbola de feira. Tê-lo a liderar um Governo já roçaria a anedota forçada, exactamente o que o País é hoje.

O VILÃO
costa em grande

"Mais uma vez, a violência e o terror surgem do nada", declarou o dr. Costa acerca do atentado de Munique. Do nada surgiu obviamente o dr. Costa. A violência e o terror em causa têm, se não me engano, uma origem comum, por acaso aquela que meia Europa recusa nomear por má-fé, cobardia ou apenas estupidez natural. Juro que não consigo perceber a que categoria pertence o dr. Costa. E mesmo que, por milagre ou descuido, um jornalista lhe pedisse explicações, sei que ficaríamos a perceber ainda menos. E a recear o futuro ainda mais.

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