Quando mais depressa se perceber a inutilidade do
Ministério da Cultura, mais depressa ele acabará.
Não gosto muito de João Soares, nem
como homem, nem como político. Mas, de qualquer maneira, reconheço que, já
perto da reforma, ele merecia uma recompensa pela sua constante fidelidade ao
PS e pelo recato em que viveu à sombra protectora do pai. Feito finalmente
ministro da Cultura, um cargo insignificante e sem futuro, os jornais
descobriram que ele era também um rival menor de Miguel Sousa Tavares e de José
Rodrigues dos Santos. Enquanto andava por aí a perorar na televisão e em S.
Bento, Soares aproveitava os tempos livres para escrever romances de que não
sei nada, excepto que são assinados por pseudónimos, Hans Nurlufts e John
Sowinds, duas cómicas traduções do seu próprio nome. Quem os leu, diz que
tratam do submundo da intriga internacional e que, de quando em quando, para
espevitar o leitor, têm algumas cenas que roçam o pornográfico.
O programa do Governo, num gesto de
loucura, promete: a) descentralizar as decisões sobre o património cultural, o
que é o melhor e o mais rápido caminho para o destruir; b) regular o “estatuto
do artista”, com que ficarão armados os vigaristas do costume e uns milhares de
novos vigaristas, que aparecem nas “revistas” de alguns jornais que se dedicam
a atrair a juventude; c) criar um “cartão + cultura”, para o patronato atribuir
aos trabalhadores e os trabalhadores poderem ir à ópera e lerem Proust com um
confortável desconto; e finalmente d), estabelecer a gratuidade universal para
o acesso aos museus (sejam eles quais foram) e aos monumentos nacionais. O
patronato pagará esta caridosa campanha, a título de mecenato.
No meio disto tudo, o dr. João
Soares declarou que o “seu objectivo”, muito pessoal, é “transformar a cultura
num factor de desenvolvimento”, embora por enquanto não se desse ao trabalho de
explicar a mecânica desse extraordinário e nunca visto milagre. Mas não se deve
esperar dele o que ninguém até hoje conseguiu: uma visão clara do papel do
Estado numa área que vai da gravação da música clássica portuguesa até à
reabilitação do centro histórico de algumas dezenas de cidades, a começar por
Lisboa. Apesar das generosas palavras do programa do Governo, João Soares não
irá com certeza contar com muito dinheiro. O que fatalmente o reduzirá a
distribuir subsídios para frivolidades sem sentido e a pagar um ou outro favor
eleitoral. Uma penúria que, no fundo, não prejudica o país. Quando mais
depressa se perceber a inutilidade do Ministério da Cultura, mais depressa ele
acabará.
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