quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

A Parábola: uma palavra…, dois conceitos… - Helena Sousa Melo


Por: Helena Sousa Melo
hmelo@uac.pt
Professora Auxiliar
CMATI / Departamento de Matemática
Universidade dos Açores
A parábola, em qualquer um dos seus dois conceitos, existe há centenas de anos. Têm pelo menos 2000 anos. A palavra “parábola” deriva da palavra grega parabole e pode ter como significado: “discurso figurativo, palavra, comparação, aproximação”.
Por isso, o termo parábola é tanto utilizado na literatura como na matemática.
Do ponto de vista literário, o termo parábola significa “narrativa curta”. Assim, a parábola é uma narrativa figurativa que utiliza situações e pessoas para comparar a ficção com a realidade, e através dessa comparação transmitir uma lição de moral. Desse modo a parábola transmite uma lição ética através de uma prosa figurada e de uma linguagem simbólica. É um tipo de escrita muito comum na Bíblia.
Por utilizar uma narrativa figurativa, a parábola é por vezes confundida com a fábula e o apólogo. Esses três tipos de figuras de estilo são frequentemente confundidos entre si devido às grandes semelhanças que possuem. Dois dos pontos em comum são a transmissão de uma lição de moral e o intento de promover um melhor a humano. A parábola diferencia-se da fábula e do apólogo por ser protagonizada por seres humanos.
A palavra “fábula” deriva do verbo latino fari, que significa “vozes do povo, boato, contar histórias, narrar”, assim, fabula significa literalmente “o que é dito”. A fábula é um texto muito comum na literatura infantil cujas personagens, geralmente animais, forças da natureza ou objetos, apresentam características humanas, tais como a fala, oscostume, entre outras, e a narrativa é algo de fantastático ou inusitado.
Por sua vez, a palavra “apólogo” tem sua origem na palavra grega apologos e significa “narrativa pormenorizada”. O apólogo pretende ilustrar um ensinamento de vida através de situações parecidas com as reais, envolvendo quer pessoas, quer objetos ou animais. Assim, o apólogo difere da fábula por se concentrar mais em situações reais, e não fantásticas, e pelo facto de utilizar os animais como personagens. O apólogo também difere da parábola porque trata de qualquer tipo de lição de vida, e não só de questões religiosas e/ou lições éticas como a parábola.
Apresentamos um texto do escritor e magistrado português José Francisco Trindade Coelho (18/6/1861 – 9/8/1908), que consta da sua obra “Os Meus Amores” publicada em 1891, como um exemplo de parábola.

“Parábola dos Sete Vimes

Era uma vez um pai que tinha sete filhos. Quando estava para morrer, chamou-os todos sete e disse-lhes assim:
- Filhos, já sei que não posso durar muito; mas antes de morrer, quero que cada um de vós me vá buscar um vime seco, e mo traga aqui.
- Eu também? - perguntou o mais pequeno, que tinha só 4
anos. O mais velho tinha 25, e era um rapaz muito reforçado e o mais valente da freguesia.
- Tu também - respondeu o pai ao mais pequeno.
Saíram os sete filhos; e daí a pouco tornaram a voltar, trazendo cada um seu vime seco.
O pai pegou no vime que trouxe o filho mais velho e entregou-o ao mais novinho, dizendo:
- Parte esse vime.
O pequeno partiu o vime, e não lhe custou nada a partir.
Depois o pai entregou ao mesmo filho mais novo, e disse-lhe:
- Agora parte também esse.
O pequeno partiu-o; e partiu, um a um, todos os outros, que opai lhe foi entregando, e não lhe custou nada parti-los todos.
Partido o último, o pai disse outra vez aos filhos:
- Agora ide por outro vime e trazei-mo.
Os filhos tornaram a sair, e daí a pouco estavam outra vez ao pé do pai, cada um com seu vime.
- Agora dai-mos cá - disse o pai.
E dos vimes todos fez um feixe, atando-os com um vincelho.
E voltando-se para o filho mais velho, disse-lhe assim:
- Toma este feixe! Parte-o!
O filho empregou quanta força tinha, mas não foi capaz departir o feixe.
- Não podes? - perguntou ele ao filho.
- Não, meu pai, não posso.
- E algum de vós é capaz de o partir? Experimentai.
- Não foi nenhum capaz de o partir?, nem dois juntos, nem três nem todos juntos.
O pai disse-lhes então:
- Meus filhos, o mais pequenino de vós partiu sem lhe custar nada os vimes, enquanto os partiu um por um; e o mais velho de vós não pôde parti-los todos juntos: nem vós, todos juntos, fostes capazes de partir o feixe. Pois bem, lembrai-vos disto e do que vos vou dizer: enquanto vós todos estiverdes unidos, como irmãos que sois, ninguém zombará de vós, nem vos fará mal, ou vencerá. Mas logo que vos separeis, ou reine entre vós a desunião, facilmente sereis vencidos.
Acabou de dizer isto e morreu - e os filhos foram muito felizes, porque viveram sempre em boa irmandade ajudando-se sempre uns aos outros; e como não houve forças que os desunissem, também nunca houve forças que os vencessem”.

Do ponto de vista da matemática referimos que Pitágoras de Samos (cerca de 540 a.C.) e os seus discípulos, os pitagóricos, utilizaram pela primeira vez o termo parábola, bem como os termos elipse e hipérbole, para descrever uma relação no método da aplicação das áreas em geometria, pois durante a resolução de um problema podia ocorrer que a base de uma figura construída fosse menor, igual, ou maior, que a de um segmento dado. Assim, usaramos termos elipse e hipérbole, para designar respectivamente, a falta, ou o excesso, em relação ao segmento, e o termo parábola, quando não havia falta ou excesso, indicando apenas uma comparação.
Observamos que os pitagóricos não utilizavam esses termos com referência às secções cónicas, que só ocorre tempos depois.
Na matemática, os conceitos são por vezes mais importantes que a terminologia. Durante certa de 150 anos as curvas, em geral, tinham descrições consoante o modo como foram descobertas. Segundo o historiador Carl Boyer, Arquimedes de Siracusa (287 a.C.– 212 a.C.) continuou usando as designações de elípse, hipérbole e parábola, mas foi o matemático grego Apolónio de Perga (262a.C. – 194 a.C.), talvez seguindo a sugestão de Arquimedes, quem introduziu esses termos para as secções cónicas. Como podemos notar, os termos não foram inventados, mas sim, adaptados.
Em geometria, a parábola é uma curva plana definida como o conjunto dos pontos que possuem a mesma distância a um ponto fixo dado, denominado de foco, e a uma reta dada, que não contém o foco, denominada de diretriz. A parábola possui um eixo de simetria e um vértice (figura 1). Ou, por outras palavras, uma parábola é uma secção cónica gerada pela interseção de um plano, estritamente paralelo à geratriz de um cone, com a superfície do cone (figura 2).
Considerando as coordenadas cartesianas em um plano cartesiano, a equação geral tem a forma “a.x^2 + b.x.y + c.y^2 + d.x +e.y + f = 0”, com determinadas condições para os valores reais a, b, c, d, e, f, ou simplesmente, escrevermos a equação da respetiva função na sua forma reduzida “f(x) = a.x^2 + b.x + c”, onde nessa forma o valor de a deve ser diferente de zero, pois, caso contrário, teríamos uma função associada a uma reta, e não uma função associada a uma parábola. De acordo com o valor de coeficiente a ser positivo, ou negativo, a parábola será, respetivamente, côncava ou convexa (figura 3).
Se consideramos uma parábola, com eixo de simetria no eixo dos yy e vértice na origem do referencial cartesiano, g(x) = a.x^2(figura 4) e uma parábola na forma f(x) = a.x^2 + b.x + c, podemos reescrever f(x) tendo em atenção g(x), ou seja, obter “f(x) = g(x +k)^2 + m”. Desse modo, podemos compará-las e saber quanto o gráfico relativo a f(x) se deslocou em relação ao gráfico relativo ag(x). De acordo com o valor de k, f(x) deslocar-se-á k unidades no
eixo dos xx (figura 5). Então, se k for positivo, a parábola deslocar-se-á em sentido oposto ao sentido positivo do eixo dos xx. E de acordo com o valor de m, f(x) deslocar-se-á m unidades no eixo dos yy (figura 6). Logo, se m for positivo, a parábola deslocar-se-á no mesmo sentido do sentido positivo do eixo dos yy.
Na parábola de equação f(x) = g(x + k)^2 + m, o seu eixo de simetria possui equação x = - k e o seu vértice está no ponto de coordenadas cartesianas V(-k, m) (figura 7).
Para as imagens nas figuras 5, 6 e 7 foi considerada a parábola de equação f(x) = x^2 + 2.x – 1. Se consideramos g(x) = x^2, então a parábola f(x) é reescrita como f(x) = (x + 1)^2 – 2, onde k admite o valor de 1 e m adquire o valor de -2.
Há muitas aplicações práticas da parábola e do parabolóide de revolução, decorrente, por exemplo, da rotação de uma parábola em torno do eixo de simetria. Essas aplicações são encontradas sem diversas áreas da física e da engenharia, como nas antenas parabólicas, em espelhos, nos faróis dos carros – devido a sua propriedade refletora, nos radares, entre outras. (figura 8).
Quem diria… algo tão antigo e tão útil nos nossos dias.

 in:  Correio dos Açores, 17 de Dezembro de 2015

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