sexta-feira, 17 de julho de 2015

A cultura Transmontana com candeia às avessas


Barroso da Fonte
Por troca com os jornais que desapareceram como as andorinhas em Setembro, os blogues vieram facilitar o acesso à informação comunitária que alimenta o espírito. É a cultura que faz bem e não ocupa lugar. Não terá sido em vão que Santana Lopes, quando foi Secretário de Estado dessa pasta, transferiu a Delegação do Norte, do Porto, para Vila Real, onde continua.
Quem está atento ao crepitar de ações que são do foro da cultura, conclui que não é por acaso que funciona em Vila Real o Grémio Literário; em Bragança a Academia de Letras; em Chaves, o Grupo Cultural Aquae Flaviae e o Fórum Galaico Transmontano; em S. Martinho de Anta, o Espaço Miguel Torga. Estes alguns exemplos vivos, para já nem se falar na oficialização da Língua Mirandesa, da UTAD; do Politécnico de Bragança e das Escolas de Ensino Superior: Jean Piaget de Mirandela e de Macedo de Cavaleiros. Fruto desse incremento cultural são as obras literárias e científicas que se vêm editando um pouco por toda a região Transmontana. Desde há anos, publica-se o NetBila, a partir de Vila Real que, diariamente, privilegia notícias da área dos autores, dos livros e das artes, em geral. Depois chegaram: o Tempo Caminhado, (bem ilustrado) aquimetem, farrapos de memória, diário atual, etc.
Aplaudem-se os jornais sobreviventes e os relevantes serviços que vêm prestando. E, do mesmo modo, se felicitam os responsáveis pelos muitos e ativos blogs que abrem esses privilegiados espaços para noticiar as muitas obras que vão aparecendo e que confirmam a boa forma dos criativos Transmontanos.
Esta dinâmica individual e coletiva contrasta com a incapacidade política que menospreza os criativos periféricos em benefício dos urbanos, de onde emergem os laureados de todos os prémios, medalhas e medalhões. Um exemplo recente deste imutável miserabilismo, leu-se no JN de 8 do corrente, pela mão do insuspeito doutor Alexandre Parafita, escritor de referência nacional. Ei-lo:
«Confrontada com a exclusão, reincidente, no apoio à sua atividade por parte da Secretaria de Estado da Cultura, a companhia transmontana de teatro Filandorra anunciou que vai chamar à "barra" dos tribunais aqueles que assumem, institucionalmente, tal decisão. A ideia é que justifiquem, sob tutela judicial, aquilo a que chama de "crime cultural", resultado de um concurso anacrónico, que mais parece um jogo de sorte ou azar, uma espécie de "raspadinha", em que os critérios são decididos unilateralmente, desvirtuando todo um trabalho resistente no interior do país. E, havendo crime, a reincidência torna-o mais grave. Há um ano, celebrando o Dia Mundial do Teatro, os atores da companhia, revoltados com idêntica exclusão dos apoios governamentais, e receando terem de fechar portas, saíram para a rua a vender bilhetes, a um euro para os seus espetáculos. Um gesto simbólico, denunciador dos olhares de indiferença com que o Estado olha para o interior cultural, que colheu grande solidariedade pública. Agora resolvem ir para tribunal. Certamente, no momento do arremesso de subterfúgios legais pelos putativos réus, há de perceber-se que um processo desta natureza está talhado para dar em nada. Contudo, alguma coisa de substancial já se fica a saber e aí o juízo público é infalível: 29 anos a formar públicos para o teatro no interior do país valem zero, ou quase zero, para a Secretaria de Estado da Cultura; levar o teatro a todos os públicos, em escolas, jardins de infância, universidades, lares de idosos, terreiros das aldeias, igrejas e mosteiros, cine-teatros... pouco mais que isso. E o que valem os reencontros dos escritores com os públicos, chamando as crianças e os jovens para o mundo mágico dos livros? E pôr as populações dos meios rurais a interagir com obras e autores emblemáticos como Raul Brandão, Tcheckov, Lorca, Molière, Torga, Garrett, Gil Vicente, Goldoni, Brecht, José Luís Peixoto, Saramago, Shakespeare... o que vale, afinal? Que o teatro vive de ficções, bem se sabe. Mas é perverso que tenha de sobreviver no seio de uma realidade cruel, a da indiferença de quem governa a cultura, onde, no lusco-fusco dos palcos vazios, agoniza uma mentalidade neoliberal dominada pela fealdade do seu próprio absurdo».
 Quarenta anos depois do propalado obscurantismo da «província» só mudaram as moscas. Em carta de Torga a Nemésio, após o II congresso Transmontano, em 1941, em  Vidago, o autor dos Bichos escreveu: aqui «onde a desgraça foi tanta que estive à beira de beijar a mão a não sei que viscondessa»...
Os sítios são os mesmos, as viscondessas já não se satisfazem com o beija-mão e a política tresanda...   António Costa, afirmou na TVI,  em 9 do corrente que mais importante que a auto-estrada de Vila Real ao Porto, é a estrada de Vila Real à Fronteira. Bonita imagem pré eleitoral que todos os políticos balbuciam mas nenhum degusta. Oxalá me engane! 
  Barroso da Fonte



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