quarta-feira, 15 de abril de 2015

O meu testemunho sobre os 25 de Abril de 1974



Barroso da Fonte
No próximo dia 25 comemoram-se os 41 anos do golpe militar que originou a mudança de regime.  Quem era adulto nessa altura e acompanhou a evolução dos acontecimentos, basta abrir os olhos e comparar o antes e o depois. Nunca se fizeram sondagens credíveis para saber se valeu a pena. Até ao presente os mass media só deram ouvidos aos heróis. Nunca as vítimas, como os milicianos e os soldados em geral, foram ouvidos nem achados. As livrarias encheram-se de relatos de profissionais das armas que, sem terem que fazer, viraram autores, reclamando vitórias alheias. Os milicianos, ao invés, sendo a causa próxima de golpe militar, viram as suas carreiras atrofiadas, os cursos interrompidos, as famílias desfeitas. Ao falar dos milicianos pretendo englobar os soldados, em geral que emigraram e por lá suportam as consequências nefastas, ou se vêm arrastando, sem reforma e sem apoios sociais, com a agravante de que muitos, nem sequer têm direito à assistência médica, morrendo ao deus-dará. Acuso, aqui e agora, os jornalistas profissionais e os comentadores políticos que nunca falam desta temática; como acuso os comentadores televisivos que enchem e preenchem os melhores tempos de antena, com algazarras comicieiras, já que vão lá para justificarem as avenças que adicionam aos vencimentos profissionais, impingindo gato por lebre e silenciando os dramas dessa geração de portugueses que os profissionais da guerra usaram como bodes expiatórios, nas frentes de combate, para logo os atraiçoarem, quando uma lei lhes fazia justiça. Puro revivalismo de classe. Faziam os mais arriscados feitos, contra as mais ignóbeis recompensas. Nunca esta explicação foi dada aos jovens, nem as universidades alvitraram estes temas aos mestrandos ou doutorandos, para abordarem as verdadeiras causas do golpe militar que eclodiu em 25 de Abril de 1974.
  Sabemos todos que essa viragem política teria que dar-se. E todos lhe batemos palmas no dia 25. Mas no dia 26, quando as verdadeiras vítimas do regime: os soldados em geral e os milicianos que haviam sido os burros de carga dos oficiais, souberam dessa traição, obviamente as coisas mudaram de tom. O monumento aos Combatentes do Ultramar, junto ao Forte do Bom Sucesso, no Restelo, é a prova dessa discordância. Existem pelo país fora dezenas de associações de Combatentes. Lá estarão essas associações e os poucos que restam dessas dezenas de milhares, em cada novo 25 de Abril. Uma grande parte já partiu, muitos em condições miseráveis. Mas nenhum, ou muito poucos capitães de Abril irão lá, porque não houve solidariedade entre os que mandavam e os que obedeciam, entre os profissionais das armas e os que com elas se combatiam, entre os comandos e os comandados.
  Falo deste tema que é delicado, é melindroso e suscetível de criar amuos, mesmo entre amigos.
Mas é imperioso falar dele, porque continua como tabu. E quem foi vítima e conheceu tão monstruoso drama humanitário, não deve levar para a cova o relato de factos, desde há 41 anos, deturpados.
    Estive, com muito orgulho e desde a conceção do projeto até à inauguração, ligado à construção do Monumento aos Combatentes do Ultramar. A ideia partiu da Associação Nacional dos Combatentes do Ultramar que, atualmente, tem a sede em Tondela. Já nessa altura se publicava o jornal A Voz do Combatente que dirigi entre 1982 e 2002, onde tudo isto se conta e se reconta. Ainda se publica, sob a direção do Presidente da ANCU que me substituiu o ilustre jurista António Ferraz. Nele saúdo essa e todas as Associações que existem e que, anualmente, marcam presença nessa homenagem aos militares que tombaram em combate. Estive, igualmente, na origem, como outorgante número 2,  na Escritura, celebrada no cartório de Guimarães do Movimento 10 de Junho.
 Com idêntico orgulho sou o nº 15 da Associação de Operações Especiais (Ranger), com sede em Lamego. E também da Liga dos Combatentes.  Não escolhi a carreira das armas, nem me ofereci voluntário para nada. Nunca foi admoestado e também nunca dei um tiro, com a arma apontada para um alvo humano. Trouxe comigo, no regresso, os mesmos 35 militares que comandei desde que parti do RI de Abrantes. Ainda hoje, volvidos precisamente 50 anos, costumo conviver com a maior parte desses e mais cerca de trezentos do mesmo Batalhão. Lá estaremos, em Abrantes, no dia 6 de Junho. Com esta confissão pretendo dizer aos meus leitores que perdoo mas não esqueço. Vivo as causas do meu País com a nobreza da Bandeira que nos irmana, como suporto, com resignação, as injustiças sociais. Olho à minha volta e reparo que quase todos os vizinhos vivem melhor do que eu. Não tenho inveja, se esse estatuto lhes é devido. Mas discordo de muitos que nunca merecem o pão que comem e que barafustam por tudo e por nada, como se vivessem noutro planeta. Sem complexos, 41 anos depois, já era tempo de dizer a verdade àqueles que apenas conhecem a classe dos capitães de Abril, desconhecendo as verdadeiras causas dessa golpada contra os milicianos.
                                                                                                                                    Barroso da Fonte



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