Barroso da Fonte |
Sabemos todos que essa viragem
política teria que dar-se. E todos lhe batemos palmas no dia 25. Mas no dia 26,
quando as verdadeiras vítimas do regime: os soldados em geral e os milicianos
que haviam sido os burros de carga dos oficiais, souberam dessa traição,
obviamente as coisas mudaram de tom. O monumento aos Combatentes do Ultramar,
junto ao Forte do Bom Sucesso, no Restelo, é a prova dessa discordância.
Existem pelo país fora dezenas de associações de Combatentes. Lá estarão essas
associações e os poucos que restam dessas dezenas de milhares, em cada novo 25
de Abril. Uma grande parte já partiu, muitos em condições miseráveis. Mas
nenhum, ou muito poucos capitães de Abril irão lá, porque não houve
solidariedade entre os que mandavam e os que obedeciam, entre os profissionais
das armas e os que com elas se combatiam, entre os comandos e os comandados.
Falo deste tema que é delicado, é
melindroso e suscetível de criar amuos, mesmo entre amigos.
Mas é imperioso falar dele,
porque continua como tabu. E quem foi vítima e conheceu tão monstruoso drama
humanitário, não deve levar para a cova o relato de factos, desde há 41 anos,
deturpados.
Estive, com muito orgulho e desde a
conceção do projeto até à inauguração, ligado à construção do Monumento aos
Combatentes do Ultramar. A ideia partiu da Associação Nacional dos
Combatentes do Ultramar que, atualmente, tem a sede em Tondela. Já nessa altura
se publicava o jornal A Voz do Combatente que dirigi entre 1982 e 2002,
onde tudo isto se conta e se reconta. Ainda se publica, sob a direção do
Presidente da ANCU que me substituiu o ilustre jurista António Ferraz. Nele
saúdo essa e todas as Associações que existem e que, anualmente, marcam
presença nessa homenagem aos militares que tombaram em combate. Estive,
igualmente, na origem, como outorgante número 2, na Escritura, celebrada no cartório de
Guimarães do Movimento 10 de Junho.
Com idêntico orgulho sou o nº 15 da
Associação de Operações Especiais (Ranger), com sede em Lamego. E também da
Liga dos Combatentes. Não escolhi a
carreira das armas, nem me ofereci voluntário para nada. Nunca foi admoestado e
também nunca dei um tiro, com a arma apontada para um alvo humano. Trouxe
comigo, no regresso, os mesmos 35 militares que comandei desde que parti do RI
de Abrantes. Ainda hoje, volvidos precisamente 50 anos, costumo conviver com a
maior parte desses e mais cerca de trezentos do mesmo Batalhão. Lá estaremos,
em Abrantes, no dia 6 de Junho. Com esta confissão pretendo dizer aos meus
leitores que perdoo mas não esqueço. Vivo as causas do meu País com a nobreza
da Bandeira que nos irmana, como suporto, com resignação, as injustiças
sociais. Olho à minha volta e reparo que quase todos os vizinhos vivem melhor
do que eu. Não tenho inveja, se esse estatuto lhes é devido. Mas discordo de
muitos que nunca merecem o pão que comem e que barafustam por tudo e por nada,
como se vivessem noutro planeta. Sem complexos, 41 anos depois, já era tempo de
dizer a verdade àqueles que apenas conhecem a classe dos capitães de Abril,
desconhecendo as verdadeiras causas dessa golpada contra os milicianos.
Barroso da Fonte
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