sábado, 18 de abril de 2015

Arménia, 100 anos depois do genocídio


Vassili GrossmanEm 1921 o Alto Carabaque, povoado por uma maioria de Arménios, foi reanexado ao Azerbaijão por Estaline que queria enviar um sinal positivo à Turquia, próxima dos Azeris. Daí para diante, até aos dias de hoje, a história dessa região tem avançado e recuado nos conflitos entre Azeris e arménios. Cometeram-se massacres de ambos os lados. Em 1994, as forças armadas arménias assumem o controlo da região.
Contudo, interessa hoje, recuar a 1914. O povo arménio dispersava-se por três impérios: a Pérsia, a Rússia e o império Turco. Tendo como objectivo libertar a arménia turca, alguns Arménios faziam parte das fileiras do exército russo e outros das do turco. Criaram um Estado em Van. Em 1915, a 24 de Abril, o exército turco deportou em massa os Arménios, acusados de pactuar com o inimigo, para o deserto sírio. Nesta deportação morreram centenas de milhares de Arménios. De acordo com os dados turcos, cerca de 300 mil, segundo os Arménios, um milhão e meio. São os dados arménios que se aproximam da realidade.
Mas a raiz deste problema deve ser procurado entre os anos de 1840 e 1860, quando 70% dos 2 milhões de Arménios otomanos entraram numa grave situação de anarquia administrativa, questão que se não abordará neste escrito.
Os acontecimentos de 1915 são, porém, aquilo que interessa, pois foram perpetrados diante dos olhos de representantes da comunidade internacional, como observadores neutros (suíços, americanos, dinamarqueses e suecos) ou funcionários civis e militares alemães e austríacos no activo na Turquia. Foram estes múltiplos relatórios que deram a conhecer ao mundo as atrocidades cometidas contra os Arménios – um homicídio colectivo praticado à escala do país. E esses acontecimentos não podem ser desmentidos pela Turquia, pois estão reunidos, desde 1916, numa soberba antologia publicada sob a direcção de James Bryce, presidente da Associação Anglo-Arménia, com a colaboração de um jovem historiador de Oxford, Arnold Toynbee. Esse documento foi enviado para 250 publicações americanas e, no ano seguinte, foi traduzido para francês com o título Livre bleu du gouvernement britannique concernant le traitement dos Arméniens dans l’empire ottoman. A este soberbo documento vieram juntar-se o Relatório Secreto do pastor Johannes Lepsius (publicado em 1916), a dissertação do embaixador americano Morgenthau e o testemunho do jornalista alemão Harry Stuermer, Dois Anos de guerra em Constantinopla.
Esta gigantesca operação de extermínio dos Arménios, testemunhada nestes documentos, teve cobertura legal na “Lei provisória de deportação”, de 27 de Maio de 1915. E esta “lei” permitiu o aniquilamento de cerca de 1,5 milhões de Arménios, em duas fases. A primeira, a deportação propriamente dita com os massacres que a acompanham, ocorreu entre Maio e Setembro de 1915, seguida da do tratamento dos sobreviventes nos campos de concentração do Norte da Síria e da Mesopotâmia (Islahiyé, Ras ul-Ain, meskéné – uma rede). São autênticos campos de morte que anunciam os horrores nazis.
Foi um aniquilamento metódico e executado com rapidez. Foi impressionante! Atingiu a Cilícia em Maio, as seis províncias orientais da Turquia (Trebizonda, Erzurum, Van, Bitlis, Kharpout e Sivas), em Junho-Julho, as regiões ocidentais (Angora, Abadazar, Brousse) e as do Sudoeste (Djebel Moussa, Oufa, Aïntab), em Agosto-setembro. Finalmente a Andrinopla em Outubro. Tudo feito sem resistência, à excepção dos 4 mil homens de Mussa Dagh, na Cilícia, que repeliram todas as investidas até serem socorridos por uma esquadra da Marinha francesa. História relatada no célebre romance de Franz Werfel, Os 40 Dias de Musa Dagh.
O Papa Francisco identificou este extermínio arménio como um genocídio. Utilizou a palavra correcta porque se tratou de um genocídio. Reconhecido pelo Parlamento Francês, pelo Canadá, pelo Parlamento Europeu e por vários países ocidentais.
A Turquia, sem reticências, inaugurou o genocídio moderno.
Armando Palavras


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