Jorge Lage |
5- Danos
irreversíveis no Vale do Tua – A paisagem agreste e de fragaredos está-me
na retina da infância. Para quem, até aos 11 anos não tinha outro horizonte
além da aldeia e pouco mais, aquela paisagem selvagem e um rio entalado e
contorcido entre as fragas abria-me os olhos para outras realidades, quando
viajava na terceira-classe de bancos de madeira do comboio. Dos meus
condiscípulos só o António Serrano, filho de um escrivão judicial de Murça,
viajava em segunda-classe, em bancos de napa, mal cheirosa. Eu achava aquilo
uma estragação de dinheiro e a privação da companhia dos amigos. E recebia o
rótulo de «copinho de leite». Essa paisagem de saudade no «camboio do Tua»
acabou e com ela morre a obra-prima da engenharia ferroviária lusa
oitocentista. Sinto as palavras do «Pinóquio» a dizer ao Presidente da EDP que
o Tua precisava de betão. A luta tem sido desigual e de muitas falsas
promessas, mas desde filmes, concentrações, manifestações e participações, até
para a UNESCO, têm tentado travar o dinheiro viciado. Com o avanço da barragem
vamos ficar mais pobres no campo cultural e turístico e os ganhos energéticos
nunca cobrirão os da potencialidade turística da ferrovia. Estivesse o comboio
do Tua a deslizar pelos centenários carris e as revistas de turismo mundial já
o tinham badalado, como uma forte alavanca do Douro vinhateiro. Com este
embalse, o clima propício ao licoroso sol engarrafado duriense, vai perder
brilho, finura e espírito. Até o famoso surfista, Garrett McNamara, das ondas
gigantes da Nazaré aderiu à causa, liderada pela «Plataforma Salvar o Tua».
Artistas solidários lavraram documentários, vídeos e canções em letra e música
d’"Um dos sítios mais lindos que vi"... Mas, as rádios e os meios de
comunicação engajados ao capital desavergonhado e selvagem ignoram esta criação
musical e o grito das fragas e da memória de uma região abandonada.
Provérbios ou ditos:
Chuva de Agosto enche o tonel de mosto.
Névoas em Agosto, nem bom nabo, nem bom magosto.
Por causa de mulheres, de cães e de águas, não
faltam mágoas.
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