segunda-feira, 2 de abril de 2012

As Vinhas da Ira


Embora o Mundo tenha sido governado de uma forma tão desastrosa entre 1919 (Tratado de Versalhes) e 1939 (a invasão da polónia por parte da Alemanha de Hitler), não deixou de se verificar um acentuado crescimento económico e industrial na década de 20. Mas ao não ser acompanhado pela restauração do sistema financeiro internacional, desencadeou a Grande Depressão, iniciada com o crash da bolsa de Nova Iorque em Outubro de 29, que rapidamente se propagou à economia dos EUA e, a seguir, ao resto do mundo industrializado. Em 1932, 12 milhões de americanos (22,5%) não tinham trabalho.
Nos Estados Unidos, a essa situação acrescentou-se uma outra que veio piorar as degradas condições de vida de milhares de pessoas que se viram obrigadas a abandonar os locais onde tinham nascido para rumarem em direcção da Califórnia: A Dust Bowl (tempestade de areia que assolou os EUA na década de 30).

John Steinbeck (Prémio Nobel da Literatura), descreve-nos este fenómeno de migração no seu extenso romance As Vinhas da Ira. Ao qual retornámos para melhor percebermos a situação actual. E cuja leitura recomendamos a quem nunca o leu.
É uma narrativa sobre a dignidade humana em condições desesperadas. Gira à volta de uma família de rendeiros no Oklahoma, os Joad. Quando perderam a quinta, juntaram-se a milhares de outros que se encontraram na estrada 66 rumo a Oeste, sonhando que aí poderiam encontrar uma terra que fosse sua. E, noites seguidas, juntamente com os seus companheiros de desdita, reinventavam toda uma sociedade (p. 440), escolhendo líderes, redefinindo normas de conduta, implícitas na generosidade. Mas também é uma narrativa onde irrompem acessos de violência, de desejo brutal e raiva assassina, como nos previne o narrador: “E a ira começou a fermentar” (p.375).
Os senhores chegavam às terras, ou mandavam alguém por eles, explicavam que tinham de se ir embora pois o monstro, o banco, tinha de recolher lucros. Os rendeiros envergonhados, “agachados, erguiam os olhos para compreender” (p.45) e, nas “portas abertas, as mulheres olhavam para fora e, por detrás delas, as crianças – crianças de cabelo cor de milho e de olhos muito abertos, com um pé descalço, remexendo os dedos” (p. 44).
Quando se iam embora, por serem honestos, eram vigarizados na compra de carro usado (cap.VII). Mas foram, numa viagem épica até à Califórnia, às vinhas da ira! A fome e a vergonha atira-os para um êxodo descomunal, vivendo em condições de total miséria (p.576), obrigando-os a roubar para alimentarem a família.
O narrador, nesta viagem, faz-nos o retrato do conflito entre os poderosos e os que nada têm, mostrando-nos a forma como um homem pode reagir à injustiça, intercalando esta narrativa brutal com episódios de verdadeira humanidade (como o encontro de Muley com Tom e o reverendo - Cap. VII), ou descrições normais do quotidiano que provocam o riso: a cena do cágado, dos cães, ou historietas sobre a família, contadas por Tom ao reverendo.
No meio disto destaca-se a força estóica e tranquila de uma mulher – a senhora Joad. Virando-se para os filhos diz-lhes: “Vocês não têm o direito de perder a coragem” (p.466). E, mais tranquila: “A gente tem de fazer seja o que for” (p. 465). Mas que pressente a tristeza humana que vai na alma da gente:” Hoje em dia, já ninguém brinca, ninguém diz coisas com graça” (p.526).

Em 1935, a pedido do presidente Roosevelt, a Food Security Administration (FSA) norte-americana solícita a 20 fotógrafos que documentem o que se está a passar no país, principalmente no Sul rural. As imagens que se seguem pertencem a esse impressionante trabalho documental. E são o retrato vivo da narrativa de Steinbeck.

Armando Palavras


Esta mãe com sete filhos já tinha vendido
os pneus do carro para os alimentar. Viviam do
que encontravam no campo e dos pássaros
que os filhos matavam
(Clique para aumentar as imagens)

Sem trabalho

Na estrada 66


Post-scriptum

Franklin Roosevelt
Perante a incapacidade de resposta à crise bolsista de 1929, que mergulhou os EUA e grande parte do mundo industrializado em profunda depressão, o presidente Franklin Roosevelt (recém-eleito) patrocinou o New Deal, um programa de reformas para relançar o crescimento económico.

Este plano social, posto em prática em 1933, lançou as bases do Estado-Providência, criando o salário mínimo e o subsídio de desemprego, erradicando o trabalho infantil. Melhorando a vida dos americanos, reforçando o poder de compra, Roosevelt lançou as bases do aumento da produção e da criação de emprego.

Não foi por acaso que, quando eclodiu a Segunda Guerra, a América era já a maior potência económica, política e militar do mundo.




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