terça-feira, 30 de agosto de 2011

Safo, a Décima Musa de Platão (Mulheres com história - 2 )

Nasceu algures no século VII a.C., provavelmente entre 630 e 610, na ilha grega de Lesbos (cidade de Mitilene), no mar Egeu, junto do território turco, provavelmente oriunda de uma família aristocrata. Tinha, pelo menos, dois irmãos: Larico e Caraxo.
Charles-Auguste Mengin (n. 1853)
Diz-se que era baixa e morena. Alceu, um poeta seu amigo, descreveu-a de forma sublime: “ de cabelo violeta e sorriso puro de mel”. A tradição informa que se casou com um homem rico – Cercilas. De quem teve uma filha chamada Cleis.
Safo é uma mulher rodeada de lendas. Uma delas conta que pôs termo à vida atirando-se do Rochedo Leucádio, por amor a um jovem marinheiro chamado Faon.
O que se sabe é que tinha uma grande influência nas mulheres jovens que a rodeavam. Era líder de uma comunidade feminina, Thiasos, que tinha como objectivo último desenvolver o conhecimento religioso e competências sociais. O mistério das suas relações apaixonadas com mulheres jovens, está na origem de numerosas lendas que deram corpo a numerosas obras de arte. O que é certo é que, embora da sua obra tenham apenas sobrevivido fragmentos, Safo foi idolatrada pelos poetas gregos e romanos. Muitas vezes imitada nos séculos que se seguiram à sua morte.
Afrodite, a deusa grega do amor, foi a sua guia. A ela dedicou grande parte da sua poesia. O homoerotismo era, por isso, uma parte da iniciação e vinculação à Thiasos. Juntamente com a paixão que transborda na sua poesia, fez de Safo um símbolo da homossexualidade feminina[1] ao longo dos tempos.
Da sua obra enorme, pouco sobreviveu. Afastando-se da tradição épica masculina, desenvolveu um estilo lírico, intimo. Os seus poemas escritos em eólico[2], destinavam-se a ser cantados[3] e acompanhados por um instrumento. Escreveu poemas eróticos às suas amigas e acerca delas, mas explorou diversos aspectos do amor, tanto no feminino como no masculino, onde sentimentos de ódio, ciúme, paixão e até luxúria estão presentes:
Fragmentos de Safo descobertos em Oxirrinco

A minha carne arde de fogo suave,
Os meus olhos perdem a vista,
Os meus ouvidos apenas ouvem o rugir do vento.
Tudo está negro.

O suor corre dentro de mim,
Os tremores apoderam-se de mim,
A cor desaparece de mim como relva no Outono.
Quase morro.[4]

 A sua poesia foi organizada em nove volumes, no século III, a.C., muito depois da sua morte. Gozou de grande fama durante todo o período clássico. Diz-se que Platão a considerava a décima musa. Catulo, o poeta erótico romano, serviu-se do poema de Safo – “A mim parece-me um deus” – como modelo da sua própria obra[5].
Durante séculos, a sua reputação sofreu às mãos daqueles que achavam o seu conceito de feminilidade e erotismo expresso, perigoso. Contudo, o que sobreviveu da sua obra, apenas nos permite um mero vislumbre do seu génio.

Armando Palavras

[1] Amor sáfico ou lésbico. Aliás, o termo “lésbica” tem aqui a sua origem: da ilha de Lesbos associada à provável homossexualidade de Safo.
[2] Dialecto nativo.
[3] Normalmente por mais de uma voz.
[4] Transcritos de MONTEFIORE, Simon Sebag, 101 Heróis, Guerra e Paz, Lisboa, 2008.
[5] Catulo viveu cinco séculos depois da morte de Safo.

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