quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

SERRAR A VELHA POR DETRÁS DOS MONTES

 Por BARROSO  da  FONTE


Caro Poeta Transmontano, Flávio Vara.

venho acusar a receção deste seu terceiro livro de poemas a que chamou «serrar a velha-por detrás dos Montes».

É um título sugestivo que se coaduna com o seu estilo mordaz e assertivo, como tenho vindo a ler no blogue tempo caminhado, do nosso conterrâneo Armando Palavras. Logo no 1º poema, 5ª estrofe, define o azedume que o «serrar da velha» denuncia no contexto popular em que vogamos. Essa oitava poética, transporta-me ao tempo dos duelos, em que os contendores, como aqueles que «éramos vários amigos, / sentados à mesma mesa, / num café da capital»...

«porque é que são dessa terra/ os maiores intrujões, / vigaristas e falsários/ que enchem os noticiários/ de jornais, televisões»?

Em certa altura da minha vida, para a obtenção de um grau académico, estudei Alfredo Pimenta (1882-1950) que foi diretor da Torre do Tombo. Foi membro da Academia de História e concluiu que essa instituição - afinal - «era uma caverna de bandoleiros ! /». Foi o número 9 entre os académicos de número. A dada altura, ele próprio estava de relações cortadas com 10. Escreveu ele: «os académicos de número são trinta. Dez não podem ter assistido às sessões. Com 10 estava eu de relações cortadas. Com 4 estava em boas relações. Com 5 não tinha eu relações, nem boas nem más».

Na sua vida profissional travou três duelos, em polémicas ideológicas e literárias. Este Vimaranense que faria 140 anos de vida, dia 3 de Dezembro último, se fosse vivo, consta nos 2 volumes das maiores polémicas Portuguesas, como o mais agressivo, numa vida de 68 anos. Ideologicamente começou na extrema esquerda para terminar como conselheiro de Salazar. Legou 190 obras da mais variada temática: poesia e prosa. Sobre Direito, História, Política e Filosofia. Polemizou, zurziu, opinou e, de tudo, deixou rasto de, a nada se furtar. Flávio Vara, pseudónimo de Amílcar Manuel Morais, já deveria ter sido convidado para comentador poético de um qualquer canal televisivo, a exemplo do que acontece no futebol. É repentista no verso, um rimador sarcástico, no diálogo de rua e um animador perfeito na argúcia popular.

Do que precisamos é de clareza no pensamento, de senso na sociedade, de verdade na justiça e de paz na forma como se distribui o que é de todos. O poeta Flávio Vara é um Poeta Transmontano que desceu à cidade, em busca daquilo que a «província» não lhe podia dar. Parou em Coimbra em busca de formação, sem «vender a alma ao diabo». O correr dos anos não o fez perder o inconformismo juvenil, como diz na 2ª aba deste punhado de versos que podemos trocar por verdades como punhos que muitos reconhecem, mas que poucos têm a coragem de proferir.


Engenheiro civil de formação, depois de frequentar a Faculdade de Letras, no ramo da Filologia Clássica, «abominou as liturgias demenciais e despóticas da chamada praxe, de que resultou o livro: o Espantalho da Praxe Coimbrã. Tão arrojada ousadia em meio académico tão snob, levou-o a prosseguir os estudos na Universidade de Lisboa, onde se licenciou, com a defesa de uma tese que lhe garantiu o «Prémio Professor Simões Neves».

Perante situações anómalas que denunciou no Diário de Lisboa, e que tinham a ver com o «copianço generalizado nas provas de exames» a Faculdade colocou-lhe o dilema: «ou pedia a demissão do corpo docente, ou era posto na rua». Essas e outras carrapatas que continuou a encontrar na sociedade, levaram-no a publicar três livros: A Bem Soada Gente (2007), A nata do Povo (2018) e, agora, o Serrar a Velha. (2022).

Quando a justiça humana não consegue repor os atropelos, em ordem, chega a desordem que só pode travar-se com a frontalidade da palavra. Mais este livro e outros poemas que já têm sido publicados na imprensa, continuarão a chegar ao mercado. São necessários, para apontar a dedo aos prevaricadores, corruptos dos pés à cabeça, indignos do pão que comem, à custa do povo.

Barroso da Fonte

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