Aos que sofreram nos GULAG soviéticos
as agruras sofridas pelos judeus nos
campos de extermínio nazis
e pelos chineses nos campos do deserto de
Góbi.
Enquanto no Ocidente, durante todo o
século XIX, autores como Baudelaire e Marx, entre outros, aproveitaram o
processo de modernização em desenvolvimento para o usarem como fonte de energia
e material criativo, nas áreas geográficas fora do Ocidente a modernização era
inexistente. Foi essa a situação da Rússia durante todo o século XIX. A sua
economia estagnava, e em alguns casos até regredia. Trotski reconhece-o na
sua História da Revolução Russa, no I Volume: “O traço
essencial e o mais constante da história da Rússia é a lentidão em que o país
se desenvolveu, apresentando como consequência uma economia atrasada, uma
estrutura social primitiva e baixo nível cultural."
Este atraso em relação ao Ocidente
desempenhou um papel central na política e na cultura russas, da década de 1820
ao período soviético. Cerca de cem anos. A Rússia, em relação ao Ocidente, no
século XIX, foi um arquétipo do Terceiro Mundo no século XX.
No início do século XX, o país com
maior dimensão populacional em quase todos os outros padrões surgia em último.
Em 1913 tinha o rendimento per capita mais
baixo da Europa (exceptuando o Império Otomano), e a esperança de vida (30
anos) colocava-o século e meio atrás da Grã-Bretanha e dos Estados Unidos da
América. Tchékhov di-lo sarcasticamente na sua peça O Cerejal.
Contudo, esta era do
subdesenvolvimento russo produziu, no espaço de duas gerações, uma das maiores
literaturas do mundo. E, curiosamente, foi São Petersburgo, a capital imperial,
a mais clara expressão de modernidade no solo russo do século XIX. Que iniciou
uma tradição literária brilhante com características próprias. Assumida com
Puchkine (no seu Cavaleiro de Bronze) e se estendeu
a Gogol, Chernyshevski, Dostoievski e Bieli. Nela surge como personagem
principal o “homem comum”, cujo destino é sempre o de vítima. Mas uma vítima
cada vez mais audaciosa no século XIX, fruto das várias revoluções. Uma vítima
que encarna a vida real de alguns dos autores. Dostoievswki, por exemplo, teve
a vida moldada por dois acontecimentos. O seu pai morreu quando ele era ainda
jovem, provavelmente assassinado por um dos seus servidores. Mais tarde, o
autor de Recordações da Casa dos Mortos esteve prestes a
ser executado por traição. Foi cruelmente conduzido ao cadafalso e deixado de
olhos vendados à beira da morte, antes de ser informado que a pena fora comutada.
E como Dostoievski nenhum poeta,
romancista ou dramaturgo russo terá trabalhado em condições normais de
liberdade intelectual. Muito menos em condições favoráveis a essa liberdade.
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