Alberto
Gonçalves – revista Sábado
A
figura do ano é sem dúvida a que Marcelo Rebelo de Sousa andou a fazer desde
que tomou posse. Durante anos, o talento do prof. Marcelo consistiu em
convencer os portugueses de que era extremamente inteligente. Hoje, percebe-se
que a inteligência é só a bastante para sobreviver de acordo com os próprios
termos.
É
sabido que a natureza tem horror ao vazio. O prof. Marcelo tem horror à
impopularidade, por isso a natureza dele é o próprio vazio. Com apreciável
rapidez, pulverizou o discutível prestígio do cargo e transformou-o num meio de
promoção pessoal que intimidaria o sr. Trump. O homem posa para selfies. O
homem distribui beijinhos. O homem visita escolas, estádios, hospitais,
jornais, feiras, ditadores, rainhas e ginjinhas. O homem finge resgatar
teatros. O homem pronuncia-se acerca do falecimento de cada habitante da
Pátria. O homem condecora com fervor cada habitante ainda vivo. O homem está em
toda a parte, e parte nenhuma está a salvo do homem.
Removido
o frenesim, sobra nada, ou, para quem não tiver enlouquecido, a vontade de
escorregar no sofá. O prof. Marcelo é o almirante Américo Thomaz com
anfetaminas. Tem graça? Como o remoto antecessor, pouca – e sempre inadvertida.
Mas convém não esquecer que, como o remoto antecessor, o prof. Marcelo legitima
um poder no mínimo daninho. Os sucessivos elogios ao Governo são
particularmente aterradores se tivermos em conta que, em apenas um ano, o
governo limitou-se a sustentar clientelas, a obedecer (com curioso entusiasmo)
aos delírios da extrema-esquerda, a aumentar a dívida, a reduzir o crescimento
e a empurrar o que restava do País para a sombra do Estado.
O
prof. Marcelo sabe que sem aderir à avassaladora propaganda do dr. Costa, os
folclóricos embaraços que comete não passariam impunes nos media serviçais que,
com escassas excepções, temos. Cavaco era regularmente fulminado por muito
menos. No dia em que, por milagre ou descuido, o prof. Marcelo emitisse umas
verdades – ou uma verdade que fosse – sobre a desgraça para que nos encaminham,
o Presidente dos "afectos" que tantos comentadores exaltam morreria
subitamente. Entretanto, a afectuosa exaltação ajuda a esconder os derrotados
pela mentira, e a convocar o bom povo para a União Nacional.
Se
apreciarmos teorias da conspiração, não custa acreditar que Sampaio da Nóvoa
foi uma invenção socialista para assustar as pessoas com um PREC fora de horas
e convencê-las a votar no prof. Marcelo. Porém, mesmo os cépticos não podem
negar que, embora temperado pela "Europa" (enquanto houver) e pelo
vício da mendicância (enquanto der), está em vigor o PREC possível. E que o
prof. Marcelo, enfant terrible erguido a símbolo máximo do "sistema",
é o seu avalista formal.
Um
optimista consola-se com a ideia de que a História tratará de julgar tamanha farsa.
O pessimista suspeita que, até lá, a farsa já tratou de nós, adormecidos pelas
histórias que nos contam.
O
BOM
Só
ao fim de mais de um ano no poder é que o dr. Costa fez uma intervenção pública
não inteiramente subordinada ao culto da mentira. Aconteceu no Natal, quando
leu, com a dicção que Deus lhe deu, umas considerações sobre
"educação" à frente de um cenário concebido por crianças de 5 anos –
ou funcionários médios do PS. O dr. Costa admitiu que "o maior défice
nacional é o do conhecimento". E quem visse a criatura, ouvisse a
criatura, reparasse nos bonecos junto à criatura e soubesse o cargo da
criatura, não podia discordar.
O
MAU
Idiotas
A
AR atribuiu o prémio Direitos Humanos ao eng.º Guterres por proezas que ele não
cometeu (actividade em ONGs; trabalho científico ou literário). São 25 mil
euros e, para o presidente da comissão que teceu o arranjinho, as dúvidas em
volta deste são "questão de vírgulas". Acrescenta o requintado
indivíduo que, "se há qualquer idiota que não concorda com a atribuição do
prémio, que recorra". Recorra, vírgula, que o regulamento da coisa não
permite. Além de sermos duplamente insultados, ainda temos de pagar por isso.
Idiotas é o termo.
O
VILÃO
Santa
paciência
Já
temos por aí espécimes ofendidos com quem lhes deseja um "santo
Natal". O que significa isto? Nada, excepto que, como outras modas
rústicas, esta chegou cá com anos de atraso. De resto, a "ofensa",
evidentemente simulada, é uma maneira de cabeças ocas fingirem que há algo lá
dentro. Na sua brutal inocência, julgam que tomar partido sobre ninharias faz
as vezes de um pensamento elaborado, e que o fanatismo reforça a razão. Não faz
e não reforça. Mas explicar-lhes isso seria tão inútil quanto abrir o
Infantário Herodes e esperar clientes.
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