Em 2010, Wang Bing, cineasta
chinês, apresentou em Veneza um filme que surpreendeu o Ocidente: The Ditch.
Trata-se de uma narrativa de
ficção sobre episódios reais do gulag chinês aquando da Revolução Cultural de
Mao, nas décadas de 50/60 do século passado; capítulos sinistros da revolução
socialista chinesa, de repressão em massa.
Centenas de milhares de
chineses foram deportados para campos de concentração. Foi montado assim um
gulag, semelhante aos da Rússia, no deserto de Gobi, onde os prisioneiros
morriam como moscas, de frio, esgotamento e maus tratos.
Ordenada pelo Partido
Comunista, a campanha foi o ponto de partida do “Grande Salto Adiante”
(1958-1960) ou industrialização, da marcha forçada e do confisco de terras,
culminando na grande fome (à semelhança da grande fome da Ucrânia, promovida por Estaline) que matou cerca de 30 milhões de chineses.
Ainda hoje é rigorosamente
proibido falar do “Movimento contra os direitistas” e do “Grande Salto
Adiante”, ligados à fome mais devastadora do século XX.
O “Grande Salto Adiante” foi
idilicamente (e falsamente) descrito pelas esquerdas progressistas ocidentais (intelectuais),
incluindo jornalistas como o americano Edgar Snow. Contudo, esses excessos foram
mais tarde condenados pelos sucessores de Mao.
“The Ditch” foi filmado à revelia das
autoridades chinesas no deserto de Gobi, com financiamentos maioritariamente
europeus, pois todos sabem a dificuldade que os filmes chineses “não autorizados”
têm para serem difundidos no seu país natal. E rompe esse silêncio criminoso,
inspirado no livro O Cântico dos mártires
nos campos da morte da China de Mao (Le chant des martyrs, 2010), de Yang Xian-hui, que recolhe 13
testemunhos de sobreviventes do campo de Jabiangou, província de Gansu, um dos
mais mortíferos. Um documento excepcional, coligido durante cinco anos pelo
autor, em cujo texto transborda a mesma força e o mesmo horror da descrição de
Solinietsyne no mítico Arquipélago de
Gulag.
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