sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Os assessores recrutados na Câmara e os recrutados no partido - BARROSO da FONTE


   Por:      Barroso da Fonte

O director do Notícias de Vila Real, no seu periscópio semanal, de 1 de Outubro, sob o título  Bardam...! abordou um problema corrosivo, asqueroso e enfermiço. Foi implementado pelo processo democrático, resistiu a todas as temperaturas ideológicas, entrou no domínio da prescrição e está aí, espalhado por todo o país, como o «toyta que veio para ficar». Quando ganhou foros de cidadania nacional, foi criada uma instituição para acabar com essas excrescências democráticas. Chamou-se-lhe «alto comissariado contra a corrupção». Foi seu único titular, um distinto coronel do MFA que por ser sério e competente, não resistiu por muito tempo. Tomou posse em 26 de Outubro de 1988 e cessou funções em 17 de Maio de 1993, por extinção do organismo. Os usos e  abusos foram tais e tantos que, tal como a mentira que, de muitas vezes repetida, entra no léxico como verdade absoluta, assim a corrosão, o asco e o nojo que tresandam sem que os serviços sanitários o extingam.
  Aquilo que o ilustre jurista Caseiro Marques escreveu nesse periscópio subscrevo-o eu, integralmente. Os chamados assessores políticos são como o ébola, paludismo ou febre de Dengue: entram-no corpo como doença sorrateira. Acordamos e já temos de atalhar com aspirina, sais de frutos ou  xás de marmeleiro.
Tive um percurso de vida bastante diversificado. E também por isso, me baseei, ao longo dos meus 60 anos de jornalismo, por experiência própria. Em 1984 confrontei-me com um caso da mais perfeita corrupção, quando exercia as funções de director da comunicação social na zona norte. O meu chefe hierárquico viera de Lisboa ao Porto, em funções partidárias e outras que não refiro por serem do foro privado. Interrompi as férias ao único motorista para que fosse à Estação da Campanhã buscar esse meu superior hierárquico e que ficasse às suas ordens, até segunda-feira. Na quarta-feira seguinte recebi, na Delegação, uma factura de 108 mil escudos para liquidar, sabendo esse dirigente nacional que eu não tinha autonomia jurídica para pagar, fosse o que fosse.  Afinal não fora uma só pessoa, mas duas, a gerar aquele encargo em duas noites, no melhor hotel do Porto. Remeti para esses dois responsáveis a referida factura. Uma semana depois chegava-me um ofício a dar por finda a minha comissão de serviço de três anos. Os jornais da época deram notícia detalhada. Mesmo assim participei ao Alto Comissário contra a Corrupção que me consolou: «Os directores gerais estão na dependência de um órgão de soberania» e a nossa competência não pode interferir...»
 Regressado a Guimarães fui convidado a concorrer à Câmara, numa lista partidária. Pela primeira e única vez, o partido pelo qual eu concorrera ganhou, sozinho, as eleições e pela margem de 118 votos. Num concelho com 125 mil eleitores, com direito a 11 vereadores, percebe-se que o acto fora muito disputado. Nessa altura nenhum dos quatro membros da lista vencedora  recrutou no exterior qualquer assessor, chefe de gabinete ou mero estafeta, fosse para o que fosse. Como membro do executivo a tempo inteiro, tive, por delegação, todas as competências  inerentes: à cultura, desporto, turismo, tempos livres, serviços administrativos, imprensa e formação. A autarquia tinha um orçamento anual de catorze milhões de contos. Uma das três assinaturas obrigatórias era a minha. Pois não tive no meu gabinete, ou fora dele, entre 1 de Fevereiro de 1986 e 31 de Janeiro de 1990 qualquer elemento estranho ao serviço, nem qualquer viatura distribuída, com ou sem motorista. Apenas foi destacada pela chefe de secretaria, uma funcionária administrativa que  me apoiava. Nunca marquei audiências para os dias seguintes. Nunca usei as minhas mãos para conduzir uma viatura da Câmara. O próprio presidente da Câmara, sempre que acompanhava visitas oficiais, usava um Mercedes que fora herdado do Estado Novo. E, no último ano de mandato, para conseguir uma viatura nova, quase caiu o Carmo e a Trindade, porque, a oposição contava com  6 vereadores, contra quatro e 1 neutro. O representante da CDU ora votava a favor, ora contra.
O que se seguiu, desde 1 de Fevereiro de 1990, até Outubro de 2013 foi um fandango minhoto. O Presidente da Câmara recrutou catorze assessores. Cada vereador chamou, de dentro ou de fora, o número que entendeu. Cada vereador teve à sua mercê as viaturas que quis e os motoristas da sua simpatia. Candidatos desse partido que perderam em Câmaras vizinhas, fizeram ali estágios remunerados de quatro anos para as presidenciais seguintes. Se perdiam tinham a assessoria garantida. Cada chefe e cada assessor passou a ter carro às suas ordens. O número de funcionários duplicou. Guimarães tem hoje três tipos de policiamento. Cruzam-se diariamente nas mesmas ruas, estes três tipos de autoridade urbana: PSP, Polícia Municipal e Polícia da Vitrus que é uma das muitas cooperativas Municipais. Aí se aninham os familiares, os correlegionários e amigalhaços. Não estranhe, pois, Dr. Caseiro Marques. Se Vila Real só recrutou uma dúzia no exterior da Câmara, ainda vá que não vá. Na cidade onde vivo e onde fui autarca, o presidente que perdeu comigo, beneficiou da «entrega do ouro ao bandido» para ganhar em 1990. Apenas saiu por força da lei, em fins de 2013. E foi condecorado dia 10 de Junho pelo Chefe de Estado...
                                                                                                                        Barroso da Fonte


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