TEMPOS SOMBRIOS |
O partido nazi nasceu pouco tempo
depois da guerra da Baviera. Pequeno no início dos anos 20, e enfraquecido
durante o período de prosperidade, conhece, a partir de 1929, o ano da Grande
Depressão, um extraordinário crescimento. Hitler aproveitou essa altura para,
legalmente, chegar ao poder[1].
A Alemanha estava economicamente
dependente do exterior, tendo sido brutalmente atingida pelos efeitos da crise
de 29. Seguiu-se a politica de deflação, conduzida pelos Chanceleres Brüning e
Von Papen que agravou a situação. Em Dezembro de 31 havia 6 Milhões de
desempregados (e 8 Milhões parcialmente desempregados) e o rendimento dos
agricultores desceram a pique.
Entre 33 e 38 o terceiro Reich
esteve longe de ser totalitário, embora o movimento nazi (nacional -
socialista), desde o início, tenha mostrado tendências totalitárias. Depois de
38 foi o que se viu, culminando na Grande Guerra iniciada em 41, apenas
terminada em 45. A Europa e o Mundo viveram tempos sombrios. A mortandade é
conhecida. Os métodos de morte execráveis também. Espíritos como Benjamin ou
Brecht compartilhara essa época com as suas catástrofes politicas, as suas
calamidades morais e o seu extraordinário desenvolvimento das artes e das
ciências.
Rob Riemen, Director fundador do Nexus Institute, na sua palestra A Cultura enquanto convite, lembra uma
conferência organizada pela revista European
Judaism (fundada em 1960), no ano de 1969, na cidade de Amesterdão. Nela
George Steiner leu uma comunicação inesquecível. Segundo a conclusão de
Steiner, a Europa suicidou-se, ao matar
os seus judeus[2].
Na verdade, diz-nos Riemen, a destruição de seis milhões de judeus
europeus, a destruição do mundo de Mahler, Alban Berg, Hofmannsthal, Broch,
Kafka, Celan, Karl Kraus, Walter Benjamin – a lista é infindável – foi também a
destruição de l’esprit européen, da ideia de Europa.
Gráfico 1 (Clique para aumentar) |
Hoje a Europa (periférica) vive,
de novo, esses tempos sombrios que Hannah Arendt descreveu em Homens em Tempos Sombrios ,
título rebuscado no famoso poema de Brecht, Aos
que virão a Nascer[3].
Vive-os sem bombas nem bazucas. Mas tempos mais sofredores porque causados por
aquilo que tornou possível o período mais longo de prosperidade que a Europa
conheceu, principalmente através dos sociais-democratas: o dinheiro,
redistribuído com justiça. E essa ditadura (a do dinheiro) vai, sem dúvida,
durar muito mais tempo se os dirigentes europeus não tomarem a postura dos
fundadores e dos construtores da União.
O pacote de medidas anunciadas
pelo Ministro das Finanças de Portugal, professor Victor Gaspar, antevê esses
tempos sombrios que se avizinham, e provocaram um clamor em todos os quadrantes
políticos e da sociedade civil, normalmente representados por uma figura
pública, na televisão, na rádio ou na imprensa escrita.
Carlos Carreiras[4]
esclarece-nos (tardiamente) sobre as verdadeiras causas das medidas agora
tomadas pelo Governo de Portugal que se sistematizam nos gráficos ao lado
(gráficos 1 e 2). O que deles se conclui? Que as governações socialistas foram
desastrosas e, de certa forma, pérfidas. O empréstimo astronómico a que foram
sujeitas para assim se poder pagar os vencimentos dos funcionários a partir do
mês de Junho de 2011, indica que o País estava na bancarrota[5]. Ao
assinarem com os credores tiraram-nos a liberdade, a soberania, como País e
como cidadãos, porque hoje não dependemos de nós, mas sim dos credores. Estes,
como é óbvio, exigiram condições. Mas, para piorar a situação, no momento da
assinatura do Memorando (sabe-se hoje), falsearam-se dados[6]. Como
por exemplo o défice. Os sete e tal por cento correspondiam verdadeiramente a
12%! Os buracos descobertos são de bradar aos céus! E os que estão por
descobrir não lhes ficarão atrás. As medidas que o actual Governo toma para nos
livrarmos da Troika o mais rápido possível, na verdade são o efeito, não a
causa. A emergência é aflitiva e o maior erro do Governo foi, no início, não
fazer uma auditoria às contas públicas dos dois governos antecessores. Talvez
por uma questão de honestidade (e educação). Fez mal.
Gráfico 2 (Clique para aumentar) |
Quem, no entanto, ouça essa gente[7], que
nos trouxe ao sarilho em que nos encontramos, seja na rádio, televisão ou na
imprensa escrita, parece que não teve nada a ver com isto! Além de grotesco é
perigoso. Ainda por cima quando temos comentadores que bem conhecem as causas que
aqui nos trouxeram e constantemente as omitem.
E aqueles que hoje discutem a
austeridade (que ninguém aceita de bom tom, como é normal), julgando que os
credores irão ter compaixão, assistiram impávidos e serenos (salvo as raras
excepções) à desastrosa governação que nos atirou para este buraco. Incluindo
alguns barões (e baronesas) sociais-democratas que, durante mais de quatro anos
se vergaram perante a governação totalitária de José Sócrates e da sua
comandita[8].
A situação do País devido ao
garrote do Memorando é inimaginável, ainda por cima quando Mario Draghi já
avisou que a ajuda do BCE a Portugal, está dependente de este cumprir com o
Memorando. Ou seja, só ajuda quando o país não precisar! Ou se cumpre ou no mês
seguinte deixa de haver vencimentos, é o que isto quer dizer.
Assim sendo, o Governo português
está encurralado. E só poderá negociar alguma coisa se cumprir o Orçamento de
2013! Se o ano correr bem. Triste sina.
O Governo tem toda a razão quando
diz que se quer ver livre da Troika o mais rapidamente possível. O problema é
que neste Orçamento (exigido pela Troika, diga-se), não está prevista uma
variável: a divida das famílias portuguesas (principalmente com a habitação). O
Orçamento tal como está, não seria grande problema se as famílias não
estivessem endividadas. E este Orçamento vai significar, como já dissemos neste
espaço, que 80% dos portugueses vão finalmente conhecer, em termos económicos,
os “Tempos de Salazar”. Os socialistas
acabaram por os tramar.
E nesta perspectiva, nem o partido
socialista tem moral alguma para não aprovar o Orçamento (porque, além de ser o
responsável do estado actual do País, está comprometido com o Memorando. Foi
ele que o assinou), nem os restantes agentes políticos e cívicos porque
assistiram impávidos à destruição do País; nunca se incomodando em
responsabilizar os causadores da desgraça[9].
Ninguém tem moral alguma para
desferir golpes feios e baixos a um Governo que herdou uma situação de
emergência nacional e procura distribuir os sacrifícios universalmente. A todos
teria ficado bem um compromisso histórico e nacional, ou um sensato
comportamento que influenciasse, juntamente com outras personalidades
europeias, a compra da divida pelo BCE[10],
proporcionando, no futuro, uma renegociação credível e equilibrada da divida.
Será ético o povo português estar
a pagar brutalmente a crise? Quando os responsáveis assistem impávidos e
serenos à “matança da populaça”?
Na Islândia sucedeu precisamente
o contrário. Mas aí as condições eram outras. Sobretudo as de cultura e as de
honestidade intelectual e politica. Coisa que aqui se desconhece.
Armando Palavras
Post-scriptum
1 – O Primeiro-ministro,
pressionado, irá fazer uma remodelação governamental. Na nossa modéstia
opinião, deveria reflectir sobre a questão. Que razões maquiavélicas estarão
por trás para pressionar a remodelação do professor Álvaro, ministro da
Economia?
2- Para que seja possível a
concretização do Orçamento de 2013, o Governo tem de arranjar uma solução com
os bancos (e no caso português, na maioria dos casos, com a Caixa Geral de
Depósitos, banco do Estado!) para as dívidas de habitação.
3 - Protestem. Mas a Europa destes tempos sombrios será a da Alemanha que com o seu poder económico vai estabelecer a sua hegemonia. E ela é que vai decidir a sorte dos países em dificuldade.
4 - Os gráficos expostos no texto aproximam-se da realidade, por isso os publicamos. Tudo seria muito mais correcto se tivesse havido uma auditoria. ssim temos que nos sujeitar a dados dispersos e conferi-los com os meios que possuimos.
[1] Descrever a forma como o conseguiu, será tema de
futuro artigo.
[2] A Ideia da Europa, de George Steiner -
2005
[3] Traduzido por Paulo Quintela, in Bertrolt Brecht, poemas e canções, Almedina, Coimbra,
1975, pp. 245-247.
[5] Que o Doutor Salazar evitou, declinando a ingerência
de credores.
[6]
Omitiram três dramáticas verdades: 1 – os 78 mil milhões negociados no pacote
de resgate (Memorando) não eram suficientes. Portugal para poder sobreviver
precisaria de um acréscimo de 30 mil milhões; 2 – os cerca de 8% de défice que
serviram de base à elaboração do Memorando eram fictícios. O défice real
rondava os 12% (sem contar com a soma astronómica das PPP, e os buracos de
divida descobertos mais tarde – daí a expressão “desvio colossal” utilizada
pelo Primeiro-ministro)! 3- Portugal precisava de, pelo menos, mais um ano para
cumprir as metas.
[7] Mais de metade daqueles (as) que pertenceram aos
governos de José Sócrates são hoje comentadores ou colunistas! Num país decente
estariam dez anos, no mínimo, sem terem direito a opinar!
[8] É bom
que observem a actual austeridade francesa de Hollande (que já se não via há 30
anos), em cujo orçamento consta a TSU.
[9] Que
impunemente auferem acumulações e mordomias inconcebíveis. E ainda opinam sobre
soluções para a desgraça que criaram!
[10] Que, apesar do anúncio do mês passado, tem uma
actuação débil, ao contrário, por exemplo, do Banco Federal Americano.
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