quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Mia Couto na trama de um texto apócrifo?

Mia Couto
Há meses que alguns amigos nos mandam um texto cuja autoria vem sempre atribuída a Mia Couto, intitulado Um Dia Isto Tinha Que Acontecer, mas sem nunca indicarem a fonte. Ou seja, o periódico, revista ou livro onde o autor luso terá “esgalhado” essas reflexões!
Fizemos uma busca e … nada. Porém, encontra-se disseminado pela internet. Uma enormidade de blogues e sites o publicaram, sem, contudo, referirem a fonte. Por essa razão e por suspeitarmos (até prova em contrário) que se trata de um texto apócrifo, o não publicamos neste espaço. Mas não deixamos de lhe proporcionar um comentário.
Se concordamos com algumas reflexões do escrito, com outras discordamos inteiramente.

Não vemos que venha mal nenhum ao mundo os pais quererem “dar aos seus filhos o melhor”, “proporcionarem-lhes os estudos que fazem deles a geração mais qualificada de sempre”. Da mesma forma, é óbvio que procurem dar-lhes “uma vida desafogada”, patrocinando-lhes a carta de condução e o primeiro automóvel. E não vem mal nenhum ao mundo se, goradas as perspectivas do primeiro emprego, a família continue “presente, a garantir aos filhos cama, mesa e roupa lavada”. Acharíamos estranho se fizessem o contrário, abandonando-os. Nem os animais o fazem. Bem pelo contrário. São vários os exemplos que se podem observar em programas como a National Geografihc, ou do mesmo género. Neste aspecto, Bertrand Russell há-de ser sempre actual.
Já estamos com o texto quando aborda a questão dos princípios, da educação, ou a do trabalho.
Em relação ao trabalho, julgamos que o Homem não pode viver para o trabalho, mas sim do trabalho. É próprio da condição humana. O Homem precisa de trabalhar, mas também precisa de descanso. Se trabalhar mais do que descansa, vai parar ao manicómio. Se descansar mais do que trabalha, também. Mas neste caso com menos probabilidades. É, pois, no equilíbrio que está o busílis da questão. Poderíamos citar dezenas de livros da especialidade para o confirmar. Mas basta a experiência de cada um. Ainda há bem pouco tempo, um banqueiro português a administrar, em Londres, um dos maiores bancos do mundo, teve de meter baixa, por trabalho excessivo.
Contudo, o cerne do texto centra-se na busca dos responsáveis acerca dos princípios e da educação.
Ao contrário da reflexão produzida, a culpa não deve, nem pode ser centrada na sociedade. E se for, é irreflectido afirmar que “a culpa de tudo isto é nossa, que não soubemos formar e educar, nem fazer melhor, mas é uma culpa que morre solteira, porque é de todos”. Não é de todos, não senhor. Ainda aceitamos que seja de alguns, mas de todos é que não é. Quantas vezes, aqueles inconformados com o sistema ouviam: “É que és burro, não remes contra a maré”. Será que estes “burros” têm culpa? Não! Estes continuaram a insistir nos princípios, na educação que lhes advinha do berço. E os outros, se alguma culpa tiveram, foi porque não conseguiam, ou não podiam “remar contra a maré”. Assim sendo, tenham paciência, mas a culpa não é de todos.
A grande culpa desta crise deve centrar-se no sistema político, porque os cidadãos regem-se pelo sistema legislativo “fabricado” pela classe politica nos parlamentos. Os próprios magistrados a ele pedem meças.
O que acontece é que quando as “leis” são más a sociedade entra em decadência. Assim no-lo diz Edmund Burke por outras palavras: “As más leis são a pior espécie de tirania”. Sobre ela, a Lei, adianta: “ A lei tem dois e apenas dois fundamentos: a equidade e a utilidade”. Ora a experiência governativa (de quase sete anos, levando o país ao limiar da bancarrota), que antecedeu a actual, espelhou em muito aquilo que se pode denominar de má governação, precisamente por pôr em prática o que Burke nos diz das “más leis” (mudando regras “a meio do jogo”, prejudicando investimentos cujo retorno impensável, causou perdas e mazelas irreparáveis - legislando favorecendo alguns e prejudicando outros). Chega como exemplo!
E os bons, na sua maioria, calaram-se, ajoelhando-se perante “as más leis”, hipotecando alguma da sua dignidade. Pois, retomando Burke, “para o triunfo do mal só é preciso que os bons homens não façam nada”. Não fazendo nada, as “más leis” originam a corrupção, e, como nos diz Burke, “no meio de um povo geralmente corrupto a liberdade não pode durar muito” porque mesmo com leis boas, tendo em conta a equidade e a utilidade, Sólon, o antigo legislador grego, não deixa de ter alguma razão: “Leis são como teias de aranha: boas para capturar mosquitos, mas insectos maiores rompem a sua trama e escapam”.
Que culpa têm os cidadãos disto? Incluindo aqueles que não têm voz, como os dois milhões que vivem no limiar da pobreza?
Na Alemanha, o presidente Wulff, depois de anunciada uma investigação a alegações de corrupção, demitiu-se no passado dia 24 de Fevereiro; na Islândia, a primeira coisa que fizeram foi prender os bandidos.
                                                                                                Armando Palavras

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