JORGE LAGE
Quinto
Centenário do Nascimento de Luís Vaz de Camões – Foi no Outono da vida que fiz amizade
com o Prof., Historiador e Filólogo, José Manuel Carvalho Martins (JMCM). É com
grande dor que choro a sua morte “estúpida” (infecção hospitalar), aos 98 anos.
Via-o como quase eterno e a vender saúde, para a idade avançada. Autor duma
basta monográfica, sobre Chaves (a gratidão de Chaves e dos flavienses obrigam
a inscrever o seu nome na toponímia da cidade). Faço esta introdução porque sem
a sua amizade e estímulo as linhas que se seguem não seriam, por mim, lavradas.
A Revista Aquae Flaviae, presta um serviço cultural inestimável a Chaves. À
região do Alto Tâmega e à Cultura Portuguesa.
Contudo, não nos coibimos de fazer uma reflexão interrogativa sobre dois
aspectos recentes e que me deixaram a pensar. Uma primeira questão tem a ver
com um grande trabalho toponímico sobre o concelho de Chaves, que saúdo, mas,
onde não vi referido o nome do Investigador monográfico e filólogo, Professor
José Manuel Carvalho Martins. Na minha pequena visão deste assunto parece-me um
nome incontornável, nem que seja para se criticar. Embora tenha a sensação de que
nesta matéria se me deparam muito mais dúvidas do que as certezas. Ainda mais
recentemente, um professor da UTAD, na mesma Revista Aquae Flaviae, também não
refere JMCM, nem que fosse para o refutar. Assim, num texto sobre as diferenças
de edição da obra-prima de Camões dizia que havia quem defendesse que o nosso
épico podia ter nascido em Chaves. Aquilo que me parece, conforme manda a
Ciência Histórica, quando não há nota de assento de nascimento, ou dados
testemunhais, manda a tradição e esta associa-o a Chaves. Curioso é os
habitantes de Nantes e Vilar de Nantes o associarem a estas localidades. Ora,
sabemos que Simão Vaz de Camões e Ana de Sá, pais de Luís Vaz de Camões eram de
Nantes (freg. de Vilar de Nantes), Chaves, e que o pai estudou para clérigo, em
Braga, no Seminário da Arquidiocese, entre 1514 e 1524. Estas datas apontam-nos
como possibilidade de Camões ter sido gerado nas férias do Verão de 1523 e vir
a nascer em 24 (?) de Fevereiro de 1524. Também, quanto a mim, se Luís de
Camões tivesse nascido em Lisboa haveria, com certeza, o nome de uma rua ou a casa
onde, segundo a tradição, se apontava o seu nascimento. Aliás, como na rua,
Portas de Santo Antão (Lisboa), à entrada do Pátio do Tronco, em cuja cadeia
esteve preso Luís Vaz de Camões, lá está a placa a atestar o dia em que
aconteceu (15 de Julho de 1552), antes de embarcar para a Índia (1553). É,
amplamente, aceite que a família da linha paterna de Camões era originária da
Galiza, possivelmente de Camos (Província de Pontevedra) e que viveu em Chaves
desde o último quartel do século XV ao 1.º quartel do século XVIII. É ponto
assente que os seus pais não eram abastados, referindo ele, «nascimento escuro
e triste» (MARTINS, p.125) e que o seu avô, Antão Vaz, seria um proprietário
rural de Vilar de Nantes, tendo uma grande prole e parte dela foi estudar para
o Seminário de Braga. A família do lado materno, Ana de (determinativo geográfico)
Sá, seria originária da aldeia de Sá (freg. de Ervões, conc. de Valpaços).
Justino Mendes de Almeida nos «Estudos Camonianos» diz que Faria e Sousa, na
segunda edição da obra sobre a vida do poeta, corrige o nome da mãe, de «Ana de
Macedo» para «Ana de Sá», como consta na atribuição da tença real que recebia,
após o falecimento de Camões. Ana é um nome de origem hebraica e significa
«misericórdia» e «graça». Sendo o pai de origem da baixa nobreza e a mãe, de
origem plebeia. Teria sido a sua formosura e viço que terão gerado a paixão do
jovem Simão. Camões lamentou imenso a sua condição de parcos recursos: «o
dia em que nasci moura e pereça» (Torga refere: «triste pássaro que tem
ruim ninho). Penso que a sua propensão para a boémia, leva-o a sentir que teria
uma vida mais digna se fosse abastado. Dificilmente seria preso, como foi
(Lisboa e Goa), se fosse nobre e desterrado para o Oriente. A hipótese mais
provável, é a de que Simão e Ana tenham ido viver para Lisboa após o nascimento
do filho, Luís. E para ser educado e ter uma vida melhor, na adolescência e
início da juventude, foi viver para Coimbra, junto às «serenas águas do
Mondego». Aqui é desperto para o amor, com a protecção do tio clérigo, Bento,
que era Prior do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra. A ida para Coimbra seria para
estudar e ser educado, servindo na «Casa dos Noronhas» e se terá apaixonado por
Violante Andrade (esta casou aos 13 anos), com D. Francisco de Noronha (tinha 30
anos).
Na ausência frequente do marido do país, Violante Andrade tenha ido
passar uma temporada a Monte Rei (Monterrey e a norte o Vale de Laça - Verín),
onde tinha propriedades, e Camões tenha estado, em simultâneo, algum tempo em
Nantes, e compôs um soneto em Galego: «A la en Monte Rei, en Bal de Laça// a
Biolante bi, beira de um rio/» (rio Tâmega atravessa o Vale de Laça).
Os desacatos e rixas, em Lisboa, levam-no à cadeia do Tronco e de lá só saiu para
embarcar como soldado para a Índia. Com seis meses de viagem, em Setembro de
1553, a nau São Bento atraca em Goa e é protegido pelo Vice-Rei, Conde Redondo,
e pelo amigo médico e botânico, Garcia da Horta (de Castelo de Vide). Este
recebia-o, com muita frequência, em sua casa. Mas, com o novo Vice-Rei,
Francisco Barreto, tudo se complica por pressão dos seus inimigos, que
«obrigam» F. Barreto a nomeá-lo «provedor dos defuntos de Lampacau» em Macau. Aqui
aufere bons proventos, mas sendo mãos largas tudo se vai. Não cumprindo
cabalmente as suas funções, os inimigos em Goa, pressionam Barreto para que ele
regresse a Goa. Ao embarcar leva consigo
a muito formosa jovem chinesa, Di Na Mem (Sá, n.º 28). Porém, na foz do rio
Mekong, o navio naufragou. O épico manuscrito foi arrastado pelas correntes e
recuperado por Camões em acto intrépido, mas a sua Di Na Mem, afogou-se e o
poeta cantou a sua dor: - alma minha gentil que partiste. Em 1568, Pero
Barreto, irmão do Vice-Rei, faz com que ele viaje para Moçambique, levando de
seu a sua obra-prima. (continua na
próxima edição)
(Bibliografia
consultada: Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, de José
Pedro Machado, Lisboa: 3.ª ed. Livros Horizonte, 1977, Vol. III, p 45; Enciclopédia
Luso-Brasileira da Cultura, IV Vol., Verbo, 1966, p. 658-666; Machado,
José B., Diferenças Tipográficas na edição de 1572 de os Lusíadas de Camões, in
Revista Aquae Flaviae – V Centenário do Nascimento de Luís de Camões, Chaves, ed.
Grupo Cultural Aquae Flaviae, 2024, p. 93-107; Martins, José M. C.,
Camões e Chaves in Privilégios de Chaves – Colunas – Camões – Castelo, Chaves: ed.
Grupo Cultural Aquae Flaviae, 2019,p. 77-165; Pequeno Dicionário de
Autores de Língua Portuguesa, de Fernanda Frazão e M.ª Filomena Boavida, Lisboa: ed. Amigos do Livro Editores, 1983, p. 70-71; Sá,
Renato, «Camões, o Poeta do “Renascimento” e a Ilha de Goa onde viveu – Parte
1» in Revista da Casa de Goa, II Série, n. 27, Março/Abril de 2024, p. 31-36; Sá,
Renato, «Camões, o Poeta do “Renascimento” e a Ilha de Goa onde viveu – Parte 2»
in Revista da Casa de Goa, II Série, n. 28, Maio/Junho de 2024, p. 26-31) Foto
(de Jorge Lage) mais acima, casa onde terá nascido Camões, em Nantes/Vilar de
Nantes/Chaves. Foto a seguir, retrato de Camões pintado em Goa, em 1581 –
cortesia da Ver. Casa de Goa.
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