domingo, 11 de agosto de 2024

Há 41 anos nasceram os Congressos de Medicina Popular


Em Vilar de Perdizes:

Há 41 anos nasceram os Congressos de Medicina Popular

O livro que o autor desta crónica publicou em 1972, com prefácio do Prof. Santos Júnior e com aditamentos do Padre Fontes e de Alberto Machado, serviu de base aos famosos Congressos de Medicina Popular de Vilar de Perdizes.

Em 1983 Lourenço Fontes, o reitor dessa freguesia de Montalegre, iniciou o primeiro Congresso que, desde aí, mexeu com crentes e descrentes, guindando o padre Barrosão e essa fronteiriça freguesia ao apetitoso epicentro do protagonismo mediático do país. Fosse como fosse, a região de Barroso virou capital da “bruxaria” nestas últimas quatro décadas.


Este ano o Congresso de Medicina Popular estará de volta a Vilar de Perdizes com a sua 38ª edição (não se realizou durante 3 anos), a ter lugar entre 30 de Agosto e 1 de Setembro próximos, organizado pela Associação de Defesa do Património Vilar de Perdizes, em parceria com o Município de Montalegre, Ecomuseu de Barroso e a União de Freguesias de Vilar de Perdizes e Meixide.

O etnógrafo Santos Júnior previu essa miscelânea no profético Prefácio dos Usos e Costumes de Barroso. Pela sua profecia e oportuna temática cultural, deixamos aqui, integralmente, esse precioso testemunho:

«As terras de Barroso constituem notável região da província de Trás-os-Montes. Por muitos dos seus usos e costumes, alguns deles curiosíssimos, tal região é um valioso relicário etnográfico. Pelas serras barrosãs do Larouco e das Alturas espalham-se grande número de aldeias, onde a vida se faz, ainda em alguns aspectos, dentro de moldes tradicionais de rara beleza.

A minha primeira visita a Barroso data de há mais de 30 anos. Por meados de Outubro de 1934 ali fui com o querido Mestre e Prof. Mendes Correia e mais o Rui de Serpa Pinto e o Alfredo Ataíde, companheiros no Instituto de Antropologia, onde trabalha vamos sob a direcção e amparo amigo do referido Mestre. Fomos pela estrada de Braga a Chaves. Quando qualquer coisa obrigava a exame mais atento, parávamos. E assim é que fomos visitar o castelo de Sanfins, empoleirado num cabeço que o rio abraçava, castro defendido por um fosso largo e profundo. Vimos e fotografei o «forno do povo» de S. Vicente da Chã, com sua cobertura de lajes de granito. Uma das paragens, com certa demora, foi na Vila da Ponte, curiosa aldeia barrosã, onde o senhor Abade, um pedaço dum homem, alto, espadaúdo e robusto, nos recebeu tão galhardamente que isso se pode exprimir desta maneira simples: “recebeu-nos à transmontana”. Ali mesmo se planeou uma campanha de estudo da região de Barroso. O Ataíde tomaria a seu cargo o estudo antropológico, somático, do barrosão; o Rui estudaria, antas e mamoas, castros e citânias, gravuras rupestres, estradas e pontes romanas, numa palavra, a Arqueologia da região; a meu cargo, desde sempre apaixonado pelo estudo dos usos e costumes do povo da nossa terra, ficava a Etnografia. O Prof. Mendes Correia comandaria o grupo, e deitaria a sua mão de Mestre a qualquer um de nós quando fosse preciso ajuda. Poucas semanas depois, uma amaldiçoada febre tifóide vitimou o Rui de Serpa Pinto. O falecimento desse activo, inteligente e lealíssimo companheiro de trabalho, fez com que nunca se levasse por diante o plano que, em linhas gerais, se elaborara em casa do atlético e simpático abade da Vila da Ponte. Pode pois dizer-se que o plano morreu ao nascer. O certo porém é que as impressões fortes que colhi nessa primeira visita, fizeram nascer no meu espírito admiração pelas terras de Barroso, admiração que se tem acrescido e se mantém bem viva.

Nos últimos 15 ou 20 anos muitas vezes tenho ido às terras de Barroso. Quanto mais as conheço mais cresce o meu entusiasmo pelo seu estudo. Por isso foi grande o contentamento ao saber que três barrosões, cultos e apaixonados pelas terras que lhes foram berço, se decidiram a publicar um livro onde ficariam registados usos e costumes do seu povo, tais como diversões, lendas, canções e velhas usanças que o direito consuetudinário firmou em alguns belos quadros de comunitarismo agrário, tão interessantes sob o aspecto económico-social. A tarefa a que se propuseram os coautores deste livro é altamente meritória, pelo que bem merecem louvores. O seu livro igualmente merece ser, largamente, difundido. Praza a Deus que assim seja», escreveu J. R. dos Santos Júnior em 1972.

À hora em que escrevo esta nota, ainda não se conhece o programa do Congresso. Mas entre 30 de Agosto e 1 de Setembro a romaria pagã deverá voltar a andar, de braço dado, com o mais mediático paganismo Transmontano.

Barroso da Fonte

2 comentários:

  1. ... "Mas, e que fique bem claro, a medicina popular é natural para a região e para o meio. Aqui, em Vilar de Perdizes, há médico duas vezes por semana. Dizem as pessoas que não é para todas as doenças. Há males que não são de médico. Sei que o problema é criado pelos médicos, pois não ouvem as pessoas, não têm tempo. Talvez seja de tempo e atenção, algum carinho, que os pacientes necessitam.
    Para o povo de Vilar os congressos servem para divulgar a região e a terra, e para os maldizentes e desinformados, como nódoa que cai sobre a aldeia: a povoação dos bruxos. Não gostam do nome. Os que vêm de fora olham este meio de maneiras muito diferentes, depende do que se procura. Há várias opiniões. Para os curandeiros, os congressos trouxeram-lhes certa promoção. Têm aqui um lugar que nunca tiveram para se poderem afirmar como pessoas, como profissionais de uma arte. Têm liberdade para demonstrarem o seu saber. Eu procuro que este encontro seja uma feira de artes medicinais. Depois, para complicar um pouco a situação e criar a fama ou a má fama da reunião calendarizada, há os jornalistas. Uns, dependendo da formação, têm tendência para o lado cómico. Vão por esse caminho porque não têm mais por onde ir. Outros, a grande parte, fazem sensacionalismo, o que é normal para se fazerem ler. Há mesmo os que inventam um bocadinho, põem nomes falsos, acreditam ou fazem acreditar em situações que não são credíveis. Na verdade , não sou eu que falo, actualmente há essa falta de bom senso e a respeitabilidade é coberta a inutilidade na grande maioria dos trabalhos jornalísticos. Controlados os meios de comunicação social por grandes grupos económicos, mais do que a necessidade de criar valores, formas de informar e formar, há essa obrigação de uma mostragem pobre e desvirtuada da realidade.
    Não é mentir. É a transformação massiva numa consciência reduzida ao mínimo, ao inútil. O que devia ser uma intervenção de arte criativa afasta-se no vento. Há uma massificação própria do meio jornalístico. Destroem o cerne dos mundos nessa mesquinhez ridícula que os matêm pobres, podres, quase malvados, impotentes de olhares críticos tidos como verdadeiros. Aos poucos, o congresso tornou-se essa feira que quis que fosse criada, que provoquei, que nasceu intencionalmente ". ... (...)

    IN PADRE FONTES -Romance de Uma Vida

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  2. ... Esta gentinha que vai de "fora" e goza com os de lá de cima, à partida pensam que têm uma candeia de luz especial nas cidades, vão armados em bons para terem matéria para preencher jornais com balelas vazias que lhe dão dinheiro e audiências! Quando depois acordam e se apercebem que o original vem "de cima", colam-se aos da província como lapas e não "deslargam", pois os de "cima" é que fornecem a luz própria, pura, como as estrelas ... -gentinha limitada e banal... -que seja um êxito em Vilar de Perdizes pois o sr. Pe Fontes bem merece!

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