quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

Tribunal decidiu que violação do confinamento não foi crime de desobediência


BARROSO da FONTE
Um homem foi condenado, no Tribunal de Chaves, a 120 dias de multa, à taxa diária de 15 euros, por um crime de desobediência, por ter violado o isolamento profilático que havia sido implementado pela autoridade local de saúde. O cidadão recorreu e foi absolvido.

 

No decreto de 20 de março, o Governo determina que ficam em confinamento obriga-tório, em estabelecimento de saúde ou no respetivo domicílio, os doentes com Covid-19, e os cidadãos relativamente a quem a autoridade de saúde ou outros profissionais de saúde tenham determinado a vigilância ativa. Este mesmo decreto diz ainda que "a violação da obrigação de confinamento, nos casos previstos no número anterior, constitui crime de desobediência".

O arguido, que havia sido condenado pelo Tribunal de Chaves, recorreu para a Relação de Guimarães que agora o absolveu, considerando que aquele decreto, na sua génese e no que respeita ao crime de desobediência, "não respeita a Constituição, por violar a reserva relativa de competência da Assembleia da República".

O Tribunal dá Relação de Guimarães sentenciou que a violação do confinamento obrigatório não constitui crime de desobediência, porque o decreto governamental que criou aquele novo ilícito criminal "está ferido de inconstitucionalidade orgânica".

Em acórdão datado de 9 de novembro, a que a Lusa teve acesso, este tribunal sublinha que, de acordo com a Constituição, "a criação de tipos de ilícitos criminais é matéria da reserva relativa da Assembleia da República (AR)".

"Não há dúvida de que a criação de novos crimes compete à AR em primeira linha, podendo também competir ao Governo, mas apenas com autorização da AR", acrescenta.


Conclui, assim, que "o Governo não se mostrava habilitado a definir matéria criminal", pelo que a norma do decreto que define como crime a violação do confinamento obrigatório "está ferida de inconstitucionalidade orgânica" e "é inválida".

A Relação sublinha que a preocupação em conter a propagação do vírus não pode fazer esquecer "o respeito devido pelos fundamentos democráticos da sociedade", porque "a democracia não poderá ser suspensa".

Diz ainda que a criação de um novo tipo de crime "vai, obviamente, muito para além da competência administrativa invocada para a regulamentação do estado de emergência".

O tribunal vinca que, olhando o teor da resolução da Assembleia da República de 18 de março que autorizou o Presidente da República a declarar o estado de emergência, "não se retira dela que contenha uma autorização para que o Governo pudesse criar um novo tipo de crime".

"Não basta estatuir que ficam parcialmente suspensos alguns direitos, nomeadamente o direito de deslocação, para daí retirar sem mais a aceitação de que a suspensão de direitos implica automaticamente a criminalização das condutas", lê-se no mesmo documento.

Nota:

Esta notícia saída na Voz de Chaves, de 25 último, deu uma lição ao governo, através do Tribunal da Relação de Guimarães. O de Chaves puniu e o da Relação absolveu. Esta sentença chega em boa hora e alivia muitos transgressores. BF


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