A igualdade entre os
homens é uma “premissa” da maior relevância para que a justiça se imponha. Não
por acaso, ela é um conceito da maior importância para os clássicos, entre eles
Aristóteles. Mas não sejamos patetas. O conceito defendido pelos clássicos era
no sentido positivo, não no sentido negativo proclamado actualmente por alguns.
É que os clássicos sabiam que o homem, em termos individuais, tem atributos que
o diferencia dos outros homens. Seja em termos de talento ou aptidão, ou,
socialmente, em termos de qualificação (ou acrescento). Por essa razão, ao
contrário do que é comum pensar-se, embora defendessem a igualdade para impor a
justiça, não deixavam de apelar ao mérito para estabelecerem a diferença dos
indivíduos.
Grande parte das
ideologias fundamentam (e fundamentaram) a questão igualitária ou da diferença,
nas semelhanças ou diferenças biológicas. O que trouxe à Humanidade condições
de catástrofe como nos ensina a História.
Se é certo que a
diferença entre indivíduos de etnias diferentes (omitimos propositadamente o
termo raça, para evitar
interpretações óbvias) é mínima (cerca de 7%), justificando deste modo o
conceito de igualdade tão redimido por alguns, também o é para justificar as
diferenças, a diversidade. Essa mínima percentagem diferencia o escocês do
italiano, e o louro de olhos azuis do moreno de cabelo encaracolado.
Os factos relativos à
variação genética nos seres humanos são conhecidos desde a década de 60 do
século XX. E uma das questões actuais continua a ser a da dimensão do crânio
que Armand Marie Leroi bem explica em Mutantes.
No século XVIII Petrus
Camper, o inventor do “ângulo facial”, no seu diagrama mais famoso, mostra uma
série de crânios cada vez menores (de macaco, orangotango, homem africano,
homem europeu e de uma estátua grega). Não sendo racista, nos seus escritos
realça o relacionamento íntimo existente entre todos os seres humanos,
quaisquer que fossem as suas origens.
Em 1912, o antropólogo
americano Franz Boas, humanista e tolerante, procurou demonstrar que não existe
genes diferenciadores. E foi implacável na oposição a todos os que procuravam
essa diferenciação entre os seres humanos com base nas formas dos respectivos
crânios. Não o foi por acaso. Á época a eugenia proposta por Francis Galton, assimilada por Gobineau ou Röse,
advinda do social-darwinismo, era matéria de estudo.
O estudo de Boas
desferiu um golpe quase fatal na craniometria e ao longo destes últimos cem
anos foi citado inúmeras vezes, inclusive por Stephen Jay Gould. A forma
craniana seria “plástica”. Não era causada por diferenças de natureza genética.
Mas Boas, dizem-nos as investigações recentes, enganara-se. De facto, as
diferenças genéticas existem em todos os tipos de povos. Contudo, grande parte
dos cientistas entendem que estas não devem ser investigadas. O seu estudo,
dizem eles, não se justifica porque ao fazê-lo gera injustiça social. Receiam o
renascimento de uma ciência racista – a eugenia.
François Jacob, n’O Jogo dos Possíveis, advertia para a
riqueza da diversidade. E dizia que “O processo de selecção natural não se
parece com nenhum aspecto do comportamento humano” (71), acrescentando que
“querer fundir a ética nas ciências da natureza é confundir o que Kant
considerava duas categorias bem distintas”(52). Mas dizia mais: “Esta
“biologização”, se assim se pode dizer, depende ideologicamente do cientismo,
da crença em que os métodos e conceitos desta ciência poderão um dia explicar
as actividades humanas nos seus mais pequenos aspectos”.
Qualquer individuo
sensato sabe que as diferenças humanas são ligeiras, não podendo, por essa
razão, pôr em causa qualquer compromisso com a justiça social. A igualdade
humana, slogan de Stephen Jay Gould,
manterá na obscuridade os 7% de variação genética que distinguem as pessoas das
diferentes partes do mundo. E haverá sempre quem à custa disso não hesitará em
promover teorias de consequências socialmente injustas. Porque a injustiça é
frequentemente causada pela ignorância, não pelo conhecimento.
O que, de facto, tem
sido demonstrável é que a dita “igualdade” tem promovido a extinção da
diversidade. Os negritos do Sudeste
Asiático, esse enigmático povo semelhante aos pigmeus, está em declínio, os Jarawas
da Grande Andaman, também. E os Selk’nam, esse povo belo e fisicamente poderoso
da Terra do Fogo, descrito como uma raça de gigantes por Fernão de Magalhães em
1520, desapareceu por completo. Os donos dos ranchos de ovelhas argentinos
chacinaram-nos numa matança com dimensões de genocídio. O último representante
desse grupo étnico morreu algures por volta de 1920.
Armando Palavras
Sem comentários:
Enviar um comentário