Jorge Lage |
Sernancelhe faz parte das Terras de Aquilino Ribeiro, sendo lugar de romeiros e cumpridores de promessas o Santuário de Nossa Senhora da Lapa. Mais a Norte Penedono ilustre Terra de Magriços. Trancoso a Terra da Mofina Mendes imortalizada por Gil Vicente ou de Bandarra com as suas trovas proféticas, Este é um triângulo mítico na Beira Alta.
Mas, não posso pensar na Beira Alta sem salivar por um requeijão de ovelha, de Celorico (da Beira) Gare, fabricado artesanalmente pelos pastores e que conserva o sabor e os odores de há 60 manos a trás e que eram feitos pela minha Mãe na minha aldeia - Chelas (Mirandela).
Meu caro e ilustre amigo, não posso abusar da sua paciência e da sua amizade, que muito me honra, «e fiquemo-nos por aqui».
Com um abraço de Feliz Páscoa, extensivo aos leitores do blogue.,
Jorge Lage
jorgelage@portugalmail.com
(Minhas memórias da Sarzeda –
Sernancelhe)
Longas são já minhas memórias e de uma Páscoa antiga agora se
desprendem, poéticas, aureoladas pela patine do tempo que tudo adoça, se diz, quase
tudo, menos aquilo que é de mal-querer.
De uma Páscoa antiga trago a cor das mimosas que floriam
tarde na minha terra onde a Primavera tarde rompia e trago a cor das camélias
que era costume oferecerem como prenda, de um solar da vila, a minha mãe e o
açafate com laranjas e a luminosa cor desses meus raros frutos de criança. E
trago ainda o cheiro bom da casa lavada, a cor linda dos armários com desenhos
novos de papéis recortados. E a mesa posta do “afolar”, na sala, toalha de
renda e linho antigo, louça de “cavalinho”, biscoitos caseiros que ainda hoje
sabem bem, pão-de-ló enfeitado com o açúcar em ponto fingindo flores, vinho
fino, moedas de prata num pratinho. E o tinir de uma campainha rua fora, a
sobrepeliz do senhor padre esvoaçando, aleluias, o meu pai postado ao pé da
porta, a cruz que um homem dava a todos a beijar, tal e qual como aquela que Aquilino
descreveu, aquela onde Glòrinhas colocava uma camélia vermelha a coroar, um
padre-nosso rezado por alma dos avós.
Páscoa das flores e logo de manhã a bênção da madrinha e o
“afolar”, a prenda dela, uma camisa nova e uma vez que tive libra de oiro e o
beijo dela em minhas mãos e a voz dela requerendo todo o bem do mundo para o
seu menino.
E aquela “bôla” grande de trigo moído em mó alveira, ovos
caseiros, carne de porco entremeada, bôla que a mãe tendia na padela negra de Molelos (ainda guardo a
padela), o cheiro dela ao vir do forno comunal, água na boca ao lembrar o sabor
dela. E os “bolos de Páscoa” feitos com a farinha do trigo tremês amassada com
os ovos que começavam a guardar-se no Natal, e o jeito e a cor e o cheiro ainda
da fornada armada, como andor, em tabuleiro. E o rescendor que, por muitos
dias, vinha da masseira.
Páscoa de saudade que, ano a ano, gosto de ir passar à minha
terra.
Alberto Correia
Sem comentários:
Enviar um comentário