Igreja paroquial de São Martinho de
Vale de Bouro (Celorico de Basto)
Por: Costa Pereira
De forma romanceada, o autor descreve-nos a história de um
lavrador de Vale de Bouro que em meados do século XVIII engendrou uma
cosmovisão e uma escatologia que conquistou simpatizantes seduzidos pela
promessa de penetrarem nos mistérios insondáveis do após a morte, mas ainda
mais, no descobrir os lendários tesouros que a serra dos montes Farinha
escondem.
Aldeia de Vilarinho – Vilar de
Ferreiros (Mondim de Basto)
Para rampa de
lançamento das suas teológicas convicções messiânicas, o feiticeiro João Pinto,
escolheu um lugar afastado da sua terra e dos olhares de quem pusesse em causa
o seu poder sobrenatural. Vilarinho, uma aldeia encravada nas abas da “montanha
sagrada de Basto” foi o sítio azado para se afirmar. Aqui inça as raízes do que
prometeu ser uma nova doutrina de que se dizia encarregado de propagar; e a
verdade é que conseguiu cativar aderentes na comunidade local. Planou durante
algum tempo com a magia das suas promessas e fantasias sobre a cabeça crendeira
dos seus iludidos aderentes que teve, entre outros, num Diogo Francisco, num
António Gaspar, num Manuel da Silva Carvalho, e numa Maria José Alves e sua
irmã Francisca.
Apenas deixou de
planar, e aterrou, quando se começou a perceber que o buraco de inferno…., em
vez do Monte Farinha, era no quintal da mulher de um alfaiate da localidade. As
cosmovisões atraiçoaram-no e a descrença abre as portas à denuncia
inquisitória, encabeçada por Francisco Penteado e Matias Pires, irmãos da Maria
José. Do logro saiu ensobrada uma parcela da freguesia de São Pedro de Vilar de
Ferreiros, quando era pároco o abade Manuel Paulo da Silva, e em São Cristóvão
de Mondim de Basto, o cura era o padre Manuel João dos Reis. Ambos eram
conhecedores das atividades do heresiarca João Pinto, mas não foram os
denunciantes. Uma história que assustou a pacata aldeia de Vilarinho e que teve
o seu epilogo a 21 de Maio de 1759, com 08 dos “congregados” a decidir
apresentarem-se à Mesa do Santo Oficio.
A 05 de Novembro
o processo estava aprontado e o Tribunal do Santo Oficio com a sua tarefa
praticamente cumprida, com dois dos condenados à pena de tortura, João Pinto e
Maria José. Deste episódio de que se perdeu memória veio agora o licenciado em
história António Ribeiro faze-lo ressuscitar, e assim pôr-nos ao corrente dum
acontecimento que naquela altura ensombrou os meus conterrâneos daquela aldeia
e nós hoje podemos citar aqui. Não me consta que reminiscências orais desse
episódio paire tão pouco no subconsciente de algum conterrâneo meu, mas o uso
temerário em conversas de lareira do vocábulo “degradado” e na microtoponímia da povoação aparecer um enjeitado
lugar denominado Cabo do Mundo, podem muito bem ser vestígios derivados ou
alusivos ao que se passou nesta aldeia em meados do século XVIII. Os nossos
antepassados tinham o bom costume de silenciar a voz acerca do que não era
merecedor de ser louvado. E deve ter sido o que aconteceu com a história do
heresiarca de Vale de Bouro.
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