Jorge Lage |
Em
Beja, conheci o ilustre Leonel Borrela (LB), amigo do barrosão Hélder do Alvar
e uma referência da cultura bejense, embora nascido em Loulé. De LB recebemos
«Cartas (de) Soror Mariana Alcoforado».
Ao
recebê-lo pensei que era mais um livro sobre a desafortunada freira bejense com
um oficial do exército francês. Porém, esta obra fez com que mudasse a data que
tinha na minha cabeça. A Soror Mariana (freira por obrigação familiar e não por
vocação), no séc. XVII, apaixonou-se por um oficial francês que veio ajudar
Portugal na Guerra da Restauração, sob o comando do marquês Schomberg, e não
das Invasões Francesas, como eu supunha.
Outra
constatação, à medida que ia avançando na leitura, foi que LB é um dos maiores
coleccionadores, se não o maior, com cerca de 500 obras sobre Mariana Alcoforado.
Assim,
esta obra, base da sua tese de mestrado, dá-nos a garantia de ser escrita por
um especialista alcoforadino. LB é, ainda, museologista (Museu Regional de
Beja) e um especialista em edições de livros antigos.
O
seu livro, «Cartas (de) Soror Mariana Alcoforado», está dividido em duas
partes: «Das Lettres Portuguaises e Mariana Alcoforado» e as «Cartas de
Mariana».
Comecemos
pelas Cartas que Soror Mariana escreveu ao seu amado, Noel Bouton, oficial do
exército francês, conde de Chamilly-Saint-Lèger, foram editadas pelo livreiro
parisiense Claude Barbin, em 1969, sob o título de «Lettres Portugaises
traduite en François (sic)».
Estas cartas por serem escritas por uma freira (obrigada a ir para o convento), em pleno séc. XVII, despertaram um interesse enorme na França e um pouco por todo mundo e geraram edições sobre edições, com arranjos, acrescentos e ilustrações. Passado algum tempo, surgiu a polémica se teriam sido mesmo escritas pela desditosa freira.
Ao
que parece, as cartas ter-se-ão perdido numa missão de guerra do conde de
Chamilly na actual Turquia e quando não aparecem os originais entra a fantasia
em acção.
Quanto
a nós, depois de lermos esta obra achamos que foram escritas pela Soror
Mariana. Por exemplo, no título original da publicação vem, «Lettres
Portugaises traduites…». Se diz «Cartas Portuguesas traduzidas…» é porque
existiam as originais portuguesas. As duas personagens desta trama também
existiram. Os locais de Beja, entre eles o «Real Mosteiro de Nossa Senhora da
Conceição de Beja», onde se deram os amores proibidos, ainda hoje existem. A
Soror Mariana Alcoforado, não era uma pessoa analfabeta como querem alguns
detractores da autoria fazer crer, foi escrivã e vigária do convento das
Freiras Clarissas. Uma pessoa de distinta família e instruída.
Depois
de ler e meditar, penso que a esta polémica não será alheia alguma arrogância
gaulesa relativamente ao nosso país, seguida por «meninos de coro» desta tese,
em que se contam portugueses e brasileiros.
A
primeira parte do livro de LB é uma tese desapaixonada e bem documentada, com
cópias de originais, gravuras e fotos sobre a imensa obra das «Cartas».
Curioso
é saber que os Alcoforado de Beja são originários de Trás-os-Montes e há alguns
em Santa Maria de Émeres (Valpaços), ligados à confeccão do «bolo podre».
A
primeira grande edição lusa (1888), com muito trabalho de investigação, é do
grande mirandelense, Luciano Cordeiro. Fez, em 1894, uma boa sintetizada edição
popular e que contribui para a divulgação das «Cartas» num país de analfabetos,
seguida de outra de 1891 com álbum fotográfico resultado duma sua deslocação a
Beja, em 1890, com o fotógrafo Francisco Camacho.
Também,
em 1824, o Morgado de Mateus (Vila Real), fez uma edição bilingue –
luso-francesa. O melhor estudo do século XX pertence a António Belard.
Esta
obra de rigor pode ser solicitada à editora «100LUZ» ou a Leonel Borrela
(963937532). Parabéns ao autor.
O nosso amigo, Dr. Jorge Lage, avisou-nos por email que no blog "tempo caminhado", do dr. Armando Palavras,vinha reproduzida a sua notícia crítica sobre o meu modesto estudo, publicado em livro, em 2007, pela editora 100LUZ de Castro Verde. Agradeço-vos o interesse comum pela minha obra, dando-vos um abraço fraterno, com um sorriso melancólico da Mariana, mais de saudade por estarmos longe de quem gosta de nós e menos de tristeza, embora os dias que vivemos no solo pátrio sejam difíceis e já não sejam para todos. LBorrela
ResponderEliminarNota: por vezes aparece nos meus comentários o nome de Calandrónio, cujo objectivo, como digo nos meus blogues, não é o de ocultar o meu nome, mas, sim, homenagear o tio cristão, visigodo, que, em Beja, no século VII, dedicou à sua sobrinha Maura (provavelmente sua noiva) um dos mais belos e sentido poemas funebres de que há memória. A lápide epigrafada com 22 linhas de capitais latinas miúdinhas e muito correcta, encontra-se exposta no núcleo visigótico, o melhor do país, do Museu Regional de Beja.
Só mais um reparo. O meu blog sobre as cartas, embora não seja actualizado sistematicamente, tem alguma documentação diferente que, julgo, vale a pena conhecer. Remete também para outros que têm a ver com a defesa do património cultural da área de Beja e não só, por vezes "sobe" um bocadinho. Abraço, LBorrela. http://lettres-portugaises.blogspot.com
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