Refeição de Páscoa entre os judeus portugueses - Bernard Picart (1725) |
Barroso da Fonte |
Sempre curioso em conhecer o passado de
Trás-os-Montes e Alto Douro, Província pobre e sempre maltratada pelos poderes
públicos, como ainda hoje acontece, voltei as minhas últimas leituras para os
povos que nos antecederam e que por aqui deixaram práticas e vestígios que
seguimos sem sabermos como.
Maria José Ferro Tavares, doutorou-se na
Universidade Nova de Lisboa e foi vice-reitora da Universidade Aberta.
Publicou, em 1970, um livro sobre os Judeus em Portugal no Século XIV. Em 2010 o Clube do Coleccionador dos Correios
publicou dela «as Judiarias de Portugal», com uma edição numerada e
autenticada, pelo editor, com uma tiragem de 6 mil exemplares, contendo os
selos das emissões filatélicas das obras
A Herança Judaica em Portugal (2004) e as Judiarias de Portugal (2010).
Coube-me adquirir o exemplar 4886 que me tem distraídos nas últimas noites.
Nesta autora que conheci pessoalmente
quando, nos anos noventa do século passado, vinha gravar alguns temas ao Paço
dos Duques de Bragança, a Guimarães, que eu dirigia, leio, agora, o seguinte: «as
heranças judaicas ocupam um lugar tal que, muito mais e melhor do que os
historiadores, os nossos amigos antropólogos saberão explicar». Com toda a
pertinência pergunta Maria José Ferro: “Quem se lembrará, hoje, de que lavar as
mãos antes das refeições era tido como uma prática judaizante? Ou quem comer um
prato de açorda ou de almôndegas, ou as célebres alheiras de Mirandela, ou as
amêndoas da Torre de Moncorvo, que está a repetir gestos alimentares ou
medicinais que lhe vieram das presenças do Islão e do Judaísmo, em Portugal? O
processo de inserção cultural alguns comportamentos perderam o significado
religioso e acabaram por se transformar em usos tipificados». Marques de Almeida,
docente da Universidade de Lisboa, em artigo sobre as «Comunidades Judaicas na
época Moderna em Trás-os-Montes, cita, a este propósito José Leite de
Vasconcelos e Maria José Ferro, para concluírem que «a sociedade portuguesa na
passagem da medievalidade para as formações sociais da proto-modernidade pode
rever-se na metáfora da nova idade» de que já falara Fernão Lopes. E todos
estes autores concordam que «a bipolarização que a caracterizava devia-se ao
facto de ter sido uma sociedade formada em região de fronteira. De múltiplas
fronteiras, aliás: geográfica, religiosa, dos imaginários também. Não obstante,
o processo de assimilação dos judeus pela comunidade cristã evoluía lentamente.
Mas os baptismos forçados, as expulsões que nunca foram, o afinar dos
mecanismos repressivos do Santo Ofício alteraram o estado das coisas». É do conhecimento geral que a conquista da
Lusitânia pelo Império Romano e a consequente destruição de Jerusalém, em cerca do ano 70 depois de Cristo forçou os
judeus a espalhar-se pelo mundo. Muitos dessa «Diáspora judaica» se fixaram
pela Península Ibérica. Pelo século VI
já existiam no território beirão, nomeadamente na freguesia de Lagos da
Beira, inscrições funerárias. Por essa altura (409) os bárbaros (Visigodos) invadiram a Península.
E uma consequência se deu: foram proibidos os casamentos mistos entre judeus e
cristãos. E chegou a haver «uma conversão forçada ao cristianismo». Em 711 militares mouros invadiram a Península
Ibérica e derrotaram os visigodos permitindo que os judeus, temessem, por um
lado o seu destino, por outro lado, constatou-se que os judeus gozaram de
relativa liberdade até ao século XV, chegando a ter grande destaque na
sociedade portuguesa. Essa influência fez com que fossem decretadas normas que
levaram à perseguição e à violência. Em
1492 foi decretada, em Espanha, a expulsão dos judeus. Uns refugiaram-se em
Portugal, outros emigraram para onde
puderam. O rei viu nisso uma forma de gerar receita, cobrando dois escudos (da
época) por cada emigrante que por cá ficasse. Também ordem régia ordenou a venda dos judeus como
escravos. As crianças entre os 2 e os 10 anos eram tiradas aos pais, baptizadas
e transferidas para as ilhas de S. Tomé e Príncipe. D. Manuel I (1495) abrandou
essa dureza contra os judeus. Mas com as duas guerras mundiais ainda o povo
judeu sofreu bastante, a ponto de Salazar ainda ver esse povo com olhos mau
humor.
Maria José Ferro dedica o V capítulo
deste seu livro à ocupação do Além-Douro entre a densidade populacional e o
despovoamento. E aí afirma que«as mais antigas comunidade s de judeus viviam na
região transmontana como: Bragança, Mogadouro, Monforte do Rio Livre e Chaves.
Barroso da Fonte
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