Intelectual
e místico, viveu retirado do mundo, mas escreveu nada menos que cerca de 250
obras.
A Catalunha de hoje tem
sido notícia por motivos políticos. Deveria sê-lo também pelo 7º centenário de
um dos seus homens mais ilustres, Raimundo Lulo, de seu nome: é esta, de facto,
a forma do nome com melhor integração na nossa língua, que assenta na forma
latina, Raymundus Lullus, usada por ele; nada obsta, porém que optemos pela
forma catalã, Ramon Llull, que adopta a norma ortográfica posta em vigor em
1934, com as respectivas palatais.
Personalidade maior do século XIII, Raimundo Lulo (c. 1232-1315) é nome que merece destaque, pelo que evoca na cultura ocidental, feita de diversidades nos vários tempos da sua história e feita de aprendizagens de convívios que não são imediatos. Cultivou ele a língua das suas gentes, não esqueceu a língua de cultura que era o latim, aprendeu também o árabe, empenhou-se em atitudes novas de superação de tensões culturais e atendeu a relações de aproximação entre comunidades desavindas, por diferenças religiosas, que ele revia na leitura dos seus textos.
Foram diversos e múltiplos
os seus interesses científicos e por isso o seu nome consta de disciplinas
diversas: lógica e metafísica, gramática e retórica, geometria e aritmética,
física e química, antropologia, medicina e cirurgia, direito, política e até
tácticas militares. Dotado de espírito multímodo, serve-se de várias formas e
estilos: modos sentenciosos, formulações catequéticas, exposições e
demonstrações, textos imaginativos: na novela Blanquerna, em construção
imaginosa, lança o seu herói na superação de sucessivas situações: homem
casado, ermita, monge, bispo, arcebispo, cardeal e papa, que, depõe a tiara
pontifícia para acabar os seus dias entregue ao ideal franciscano de união
mística com Deus. Não é autobiográfica a sequência, mas reflecte ideais
lulianos e deixa entrever os passos que empreendeu.
Nasceu na Ilha de
Mallorca, por 1232, e morreu na Ilha de Cabrera (também nas Baleares) a 30 de
Junho de 1315; mereceu ser beatificado e figurar no calendário litúrgico local,
no dia 27 de Novembro. O seu percurso foi movimentado: da ilha de origem passa
a Montpellier e à região do Rossilhão, vai a Roma várias vezes, passa por
diversos pontos do Mediterrâneo, procura a África e acaba por ser espancado em
Bugia (Tunísia), sendo expulso, quase sem vida, depois de, pela terceira vez
ter procurado discutir amigavelmente as razões da fé que propunha. Singular, da
sua parte (contrariamente à prática da apologética consagrada), era servir-se
das fontes árabes e procurar nelas a verdade acessível à razão humana por
métodos de racionalidade compreensiva.
Singular foi também a
sua acção, pois trabalhou sempre por conta própria, sem o apoio de grupo
organizado. Entregou-se apaixonadamente a trabalhar na conversão dos
ismaelitas, dedicando-se por esse motivo ao estudo do árabe a fim conhecer os
seus textos na língua de origem: tendo comprado um escravo muçulmano que lhe
servia de mestre de língua, correu risco de morte, pois ele atentou contra a
sua vida.
Com o mesmo objectivo
apostólico, interessou-se pela Escola que os dominicanos mantinham em Paris e
pretendeu entrar nela como aluno, mas foi dissuadido de o fazer por Raimundo de
Penaforte, dominicano, que já tinha sido responsável por aqueles Estudos e
servira de penitenciário papal. Por conta própria, abriu, em Miramar, Mallorca,
uma Escola, em que acolhia discípulos para aprenderem línguas com o intuito de
se prepararem para a pregação dedicada aos islamitas.
Preocupação sua era
ultrapassar os métodos apologéticos tradicionais e seguir novos rumos com
aprofundamento dos textos religiosos em busca da verdade. Foi essa atitude
sempre entendida como prática intercultural de abertura a tradições diferentes
(judeus e islamitas). Sincero no culto cristão e respeitador dos outros, sem
apelo à conversão, animava-o a busca a verdade, disposto a aceitá-la onde a
encontrasse. Sem modos apologéticos, firmados em autoridades, intentou caminhos
de diálogo, ultrapassando as contradições encontradas na leitura de fontes.
Determinado em assegurar firmeza nos seus argumentos, congeminou uma Ars Magna de
argumentação que permitisse chegar a uma verdade incontestada. Não esqueceu que
não basta saber para crer, pois postulava a “iluminação”.
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