domingo, 6 de dezembro de 2015

Confundir terrorismo jihadista com a sua sombra - Barroso da Fonte


Barroso da Fonte
Escrevo esta crónica ao fim da tarde de sexta-feira, 4 de Dezembro. Poderia ser protagonista desta novela. Mas fui apenas repórter por vontade própria. O jornalista tem o dever de narrar aquilo que se passa à sua volta. E não mostrar só aquilo que está bem. Deve, sobretudo denunciar aquilo que está mal e que mexe com a dignidade das pessoas. Não vou usar os nomes de pessoas que serviram de palco a mais esta odisseia de um cidadão que conheci em circunstâncias rocambolescas, em meados deste ano. Mas vou apelar aos políticos para que não usem apenas as estatísticas para dizer que vivemos num mar de rosas e que temos um país atrativo, onde apetece viver. Lamentavelmente aquilo que hoje vi e ouvi faz-me arrepiar os cabelos. Como sempre fui frontal, inconformado e moralizador, não resisto em dar prioridade a este relato que me envergonhou e me impele a transformá-lo numa sátira ao modo como se exerce a cidadania.                                                                                                               Em meados 2015, conheci um cidadão que nasceu num país de Leste e tem residência em França. E alternadamente em Portugal. É filho de uma emigrante Transmontana que casou com um argelino. Os pais já faleceram. O filho casou com uma senhora, também de Leste. Esse cidadão com idade a rondar os 30 anos, fez o serviço militar em vários palcos de guerra e foi graduado em capitão, acabando por por sair, como deficiente, ao fim de meia dúzia de anos. Tentou refazer a sua vida civil num périplo que abrange alguns dos países  soviéticos, França e Portugal. O seu avô materno nasceu e viveu em Guimarães e, na década de sessenta, foi jogador do Vitória Sport Clube. Em homenagem a esse seu avô – João Costa – e a sua Mãe, acabou por adquirir residência de férias na cidade de Guimarães. Mas também estaciona em Esposende e em Portimão, paradeiros que usa para vendas ocasionais de imobiliário.                                                                                     Numa das suas passagens pela rua onde vivo, em Guimarães, vendo muitos livros, parou e, no seu português de emigrante de leste, misturado com o inglês, francês e outros idiomas que nascem por simpatia semântica, perguntou-me se eu tinha algum livro do Dr.  Adérito de Freitas, um arqueólogo vivo, natural de Carrazedo de Montenegro, do concelho de Valpaços, terra da  sua mãe. Esta informação, foi o bastante para não mais esquecer este jovem emigrante. Entretanto soube que ele perdera a carteira, onde guardava cartões de crédito, bilhete de identidade e outros pertences que tinham a ver com a entrada e saída nas fronteiras. Procurou-me a dar-me conta.  Aconselhei-o a ir à PSP apresentar a participação, o que fez. Dias depois soube que alguns dos documentos foram apanhados na Vila das Taipas. Os larápios fizeram compras às mãos cheias. E a rede provocou um engarrafamento tal que os bancos cancelaram o acesso às contas do próprio, a ponto de se transformar essa situação num bloqueio que ainda perdura e perdurará...                                                                                                               Há dias, vindo de Espanha pelo Gerês, quando se dirigia a um café para comprar tabaco, foi compelido por uma brigada da GNR a bufar ao balão. Acusando positivo foi-lhe apreendida a viatura, retirada a carta de condução e mandado apresentar ao Tribunal de Vila Verde, que o notificou para ser julgado no dia seguinte, o que aconteceu. Nada a destoar nesse julgamento a que assisti. Por não ter antecedentes, ficou inibido de conduzir por cinco meses. E uma multa de 500 euros. No final soube-se que na véspera o Tribunal de Vila Verde, fora palco de desusadas movimentações periciais. Logo chegaram ecos de que o cidadão, que tem casa em Esposende e que «suspeitam ser o tal terrorista, fora apanhado e se encontrava a contas com a justiça. Alguns se preparavam para engaiolar o cidadão que desprotegido e indefeso correu riscos que nada têm a ver com o cenário que circulou. Foi uma tarde de «terror». O «dito»  terrorista teve de ligar para a embaixada  do seu país que de imediato destacou uma jurista e uma tradutora que acalmaram o ambiente.  Nessa noite as televisões não difundiram uma reportagem urbi et orbi porque o bom senso imperou. No dia seguinte a Juíza julgou o «terrorista» da véspera, com toda  a eficiência e simpatia. Do que se passou nessa tarde para recuperar a viatura e «alguns» pertences que desapareceram, enigmaticamente, do  interior da viatura desse temível «terrorista», não adiantamos comentários. Mas algo se passou de muito grave. O que temos é o dever de afirmar  que o «simplex» que foi criado com tanta gala e mediatismo, a ponto de promover a sua autora, a ministra do atual governo, redundou em «complex» em relação aos cidadãos, nomeadamente, como este que em vez de os  tratar com humanismo, dignidade e compreensão, correm o risco de serem confundidos como  verdadeiros terroristas, só porque o pai é argelino e ele próprio usa barba e tem  tez de oriental. Se todos os vigilantes do Estado português fossem tão zelosos, tão sérios e tão corretos como este que alarmou a pacata vila de Vila Verde, estaria o país mais sossegado e mais enriquecido...

                                                                           Barroso da Fonte

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