José António Saraiva - in Jornal sol |
Sousa Tavares acredita em Salgado
porque é seu familiar, acredita em Pinto da Costa porque é presidente do seu
clube e acredita em Sócrates porque sim.
Não vou naturalmente comentar isto:
cada um acredita no que quer.
Interessa-me, sim, registar que o
país esteve durante vários anos entregue a estas três pessoas.
José Sócrates dominou a política
portuguesa entre 2005 e 2011.
Ricardo Salgado dominou largamente
a banca entre 1991 e 2014, a ponto de ser chamado o 'senhor DDT'.
E Pinto da Costa dominou amplamente
o futebol português entre 1982 e 2008, ou seja, durante quase três décadas.
Ora, sobre estas três figuras a
quem o país esteve entregue, recaem hoje (ou recaíram) gravíssimas suspeitas.
Sócrates está preso, Salgado está
em liberdade sob fiança e Pinto da Costa foi arguido no processo Apito Dourado,
acabando por escapar entre os pingos da chuva.
E digo isto com convicção, pois
ouvi escutas envolvendo o presidente do FC Porto que não podiam ser mais
comprometedoras.
Através dessas conversas, ficou a
saber-se que todos o temiam no mundo do futebol, que não se coibia de dar
ordens a toda a gente, que fazia ameaças que roçavam a chantagem.
Podia não fornecer 'fruta' aos
árbitros, mas também não era preciso.
Pinto da Costa construiu um tal
poder no futebol que qualquer árbitro que quisesse subir na carreira não podia
ser 'inimigo' do FC Porto.
Era preciso coragem para marcar um
penálti contra o FC Porto - ou para deixar de marcar um penálti a favor do FC
Porto.
No universo futebolístico, era ele
o 'senhor DDT'.
Não sei se Pinto da Costa se dava
com Ricardo Salgado, mas relacionava-se com José Sócrates, pois foi visitá-lo à
prisão.
E quanto a Sócrates e Salgado, davam-se
como Deus com os anjos.
Sócrates foi o único
primeiro-ministro que Salgado elogiou em público, vá lá saber-se porquê.
E salta à vista que ambos têm uma
coisa em comum: são constantemente desmentidos.
Na comissão de inquérito do BES,
Salgado ainda estava a responder e já era desmentido pelo governador do Banco
de Portugal, Carlos Costa.
E nas horas seguintes seria
desmentido pelo primo José Maria Ricciardi.
E no dia seguinte por Pedro Queirós
Pereira.
Claro que Ricardo Salgado pode ter
falado verdade e serem os outros a mentir: Costa, Ricciardi e Queirós Pereira.
Mas algumas das suas afirmações
roçaram o ridículo, como garantir que bastaria um sinal de Carlos Costa para
deixar o cargo, quando é público que houve repetidos sinais nesse sentido.
Ou dizer que não sabia que as reuniões
do Conselho Geral eram gravadas, quando havia um gravador em cima da mesa.
Se Salgado foi tão pouco rigoroso
relativamente a factos conhecidos, por que devemos acreditar que em tudo o
resto foi verdadeiro?
Quanto a Sócrates, a sua falta de
respeito pela verdade é já histórica.
Desde questões importantes (como a negação reiterada da tentativa de
compra da TVI pela PT) a coisas comezinhas (como desmentir a propriedade de um
Mercedes que tinha escondido na garagem), o percurso de José Sócrates tem-se revelado
repleto de inverdades.
Existe a sensação - como tenho
escrito - de que ele deixou de distinguir entre a verdade e a mentira, dizendo
ambas com a mesmíssima convicção.
E é essa convicção, essa capacidade
de se fazer vítima e lançar o odioso sobre os outros, que leva ainda hoje muita
gente a acreditar nele.
Quando as pessoas atingem um
determinado estatuto, partimos do princípio de que são minimamente confiáveis.
Achamos que indivíduos cuja palavra
pode mudar o destino de milhões de euros, ou comprometer um país inteiro, são
merecedores de crédito - até pela responsabilidade que pesa sobre os seus
ombros.
Ora, nos últimos tempos, aprendemos
que não é assim.
Percebemos que a palavra de pessoas
com grande poder pode valer muito pouco ou nada.
Ficámos a saber que indivíduos
altamente colocados não se importam de enganar os que neles confiam nem de
conspurcar as instituições que representam.
E estes casos levantam ainda uma
questão inquietante: será que, para chegar a determinados cargos na política,
na banca ou no futebol, é preciso não ter princípios nem escrúpulos?
Ricardo Salgado terá recebido uma
'comissão' de 14 milhões de um empreiteiro, Sócrates é suspeito de ter recebido
'comissões' de 20 milhões pagas por empreiteiros e outros agentes.
Estas são as más notícias.
A boa notícia é que Sócrates é o
primeiro chefe do Governo em toda a história de Portugal a ser preso por
suspeitas de corrupção.
A política não está, pois, tão
enlameada como se diz.
Já do futebol e da banca não se
pode dizer o mesmo: o primeiro continua a beneficiar de um estatuto de
impunidade e a segunda tem registado casos sobre casos nos últimos anos.
Aqui ainda há muita justiça a
fazer.
Só se espera que uma eventual
viragem política não volte a deitar o lixo para debaixo do tapete.
P.S. - Em entrevista ao SOL, Elisa
Ferreira perguntava: aumentámos a competitividade? Controlámos o défice e a
dívida? Relançámos o emprego? A tudo, a entrevistada respondia que não.
Estranhamente. De facto, quanto à competitividade, o aumento das exportações
diz o contrário. Quanto ao défice e à dívida, o défice deve ficar este ano
abaixo do previsto e a dívida está controlada, como o provam os juros baixos no
mercado. Quanto ao desemprego, tem vindo a descer continuamente. Será que, por
ser deputada europeia, Elisa está desfasada em relação aos números do país?
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