sábado, 5 de novembro de 2016

Ajudem esta mulher!

 

 Miguel Esteves Cardoso - jornal Público

Como é que conseguem viver com o olhar dela, três vezes traído?
Sharbat Gula foi deportada depois de 11 dias de prisão. Os paquistaneses tiveram pena dela e, depois do consulado afegão ter pago a multa de 1500 euros, libertaram-na. Voltará para o Afeganistão de onde fugiu com os quatro filhos.
Em 1984, tinha ela 11 ou 12 anos, Steve McCurry fotografou-a para a National Geographic. A fotografia, Afghan girl, tornou-se a mais famosa de toda a história da revista. Toda a gente viu a fotografia – excepto ela.
McCurry, que ficou famoso e rico à custa daquela fotografia, fez várias tentativas para reencontrá-la. Só conseguiu em 2002, quando ela tinha 30 anos. Foi a primeira vez que ela viu a fotografia dela quando era criança.
A nova fotografia de Sharbat Gula – só com 30 anos mas envelhecida por uma vida duríssima – voltou a correr o mundo, para toda a gente ter o prazer de ver como a menina bonita dos olhos verdes tinha desaparecido para o rosto de uma mulher banal.
A National Geographic ainda retribuiu parte do lucro pagando-lhe uma peregrinação a Meca e algumas despesas médicas. Fez também um fundo para educar crianças afegãs. Mas a sádica exploração de Sharbat Gula – indesculpável e abusiva desde o início – continua.
Então e agora? Como é que é, ó abutre McCurry? Como é que ninguém, à excepção de afegãos e paquistaneses, mexeu uma palha para ajudá-la? Ela é viúva e está doente. Porque não lhe compram uma casa e lhe dão dinheiro para viver bem durante o resto da vida? Como é que conseguem viver com o olhar dela, três vezes traído? 

Sem comentários:

Enviar um comentário

Uma ideia peregrina