sexta-feira, 4 de abril de 2014

Jorge Lage - O Cristo das Trincheiras (da Flandres)

Imagem do "Cristo das Trincheiras" (da Flandres)

Jorge Lage
Chega-me pela Internet imensa informação muita duvidosa e outra nefasta e até de amigos. Não é mais que lixo que nos incomoda. Mas, há amigos que pensam em quem vai receber e só enviam informação certa e credível. O ilustre mirandelense, Jorge Golias, entendeu, e bem, partilhar comigo um texto e imagens do «Cristo das Trincheiras».
O meu pai tinha 11 anos quando (Janeiro de 1917) os soldados do RI 30 de Bragança partiram para a Primeira Grande Guerra. Vinha o comboio repleto de soldados e não o deixaram parar em Mirandela, num dia de feira, com receio de que alguns desertassem.
Na Flandres, foi uma mastragada dos aliados da qual se vingou o «Herói Milhões» (Aníbal Augusto Milhais), com outra «mastragada» dos alamões.
-Querem saber como o povo romanceava a lenda do «Herói de La Lys»? Pois bem! Ele ficou só com um municiador da metralhadora e se fugisse ele abatia-o. Os alamões avançavam juntos em passeio num campo de batalha de mortos e foram surpreendidos pelas rajadas constantes do Soldado Milhões, escondido a trás de uma mula esbandulhada. E os alamões ficavam mortos de pé encostados uns aos outros, tantos eram eles!
Está é a lenda popular, porque, na realidade, o Milhões teve sorte, além da coragem, e o «Cristo das Trincheiras» protegeu-o ao longo de três errantes dias até que se agrupasse com os nossos.
O CEP (Corpo Expedicionário Português) não se tinha preparado para a guerra, nem sequer na logística, quanto mais para combate! O CEP ocupou na Flandres ocupava o terreno entre Lacouture e Neuve-Chapelle e uma cruz de madeira dominava a planície.

A grande ofensiva alemã de 9 de Abril de 1918 foi um inferno ou um cemitério juncado de cadáveres entre eles 7.500 da 2.ª Divisão de Infantaria portuguesa. No final apenas o Cristo se mantinha de pé e mutilado, sendo levado pelos portugueses que se foram reagrupar nas linhas aliadas. Com que coragem e Fé, os portugueses destroçados e estropiados, levavam consigo o Cristo mutilado!


MOSTEIRO de Santa Maria da Vitória -  BATALHA

Passados 40 anos, em 1958, o Governo Português pediu a França para ficar com esta imagem. E voou para Portugal, a 4 de Abril de 1958, e passados 4 dias estava no Mosteiro da Batalha para as Comemorações de 9 de Abril, sendo recebido com pompa e dignidade, este símbolo da Fé e do Patriotismo luso e colocado à cabeceira do túmulo dos dois «Soldados Desconhecidos». A guarda de honra coube a um batalhão do RI 7 (Leiria), a fanfarra do RI 19 (Chaves – sempre teve bons corneteiros) e uma Bateria do RAL 4 (Leiria) salvou com 19 tiros, perante altas patentes, adidos militares e embaixadores.
Curiosamente, vi o Cristo das Trincheiras pela primeira vez, há meio século, na mítica, «Sala do Capítulo» no Mosteiro de Santa M.ª da Vitória ou da Batalha. Não deixa de ser muito favorável a este ambiente que nos toca na alma que, sob a abóbada da Sala do Capítulo, tenha ali padecido «um cristão», o «Arquitecto Afonso Domingues».
"Cristo das Trincheiras"
no Mosteiro da Batalha
Foi um choque tremendo, eu criança, ver aquela crueldade da guerra a estraçalhar as pernas e o braço da imagem do próprio Cristo… Se nem o Cristo escapou, o que teriam passado os nossos soldados?
Naquele tempo de algum aperto económico para Portugal, as viagens do Colégio Marista eram feitas em camionetas de caixa aberta, em «confortáveis» bancos corridos de madeira, da Legião Portuguesa e até achávamos que era boa gente por serem de graça. Então, as viagens à praia e aos locais turísticos deixavam-nos entusiasmados e íamo-nos cultivando. As camionetas da Legião eram um luxo para quem só viajava nas carruagens de bancos de madeira, em 3.ª classe, dos caminhos-de-ferro. Eram dias diferentes! E a visita à Batalha e Alcobaça foram dos mais marcantes.
O «Cristo das Trincheiras» simboliza a Fé e a capacidade de resistência ao sofrimento dos portugueses, mesmo abandonados pelo poder político. Por isso o povo diz, e com razão: - quando o pau da barca falha a Fé é que nos salva.

Nota: Este texto pertence a um conjunto de notas de rodapé. Pela sua importância optámos por o publicar autonomamente.


1 comentário:

  1. Das várias visitas que já tive ocasião de fazer ao Mosteiro da Batalha, eu me concentrei mais na parte histórica de Nuno Alvares Pereira.
    Algumas das minhas fotos e vídeos remontam a 1990 quando lá passei uma manhã inteira antes de seguir para Fátima e Leiria. Por isso, na minha próxima visita e já está programada para o Verão deste ano, vou tentar trazer imagem minha para o meu Video Album sobre as minhas viagens a Portugal, como Emigrante, Claro!
    Os meus agradecimentos aos Conterrâneos Eméritos Escritores Jorge Lage e Jorge Golias pela partilha.
    Um Forte Abraço ao Dr Armando Palavras.
    Fiquem com Deus
    Silvino Dos Santos Potêncio
    Emigrante Transmontano em Natal/Brasil

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